segunda-feira, fevereiro 22, 2010

25308 a 25318

Vivera o grande amor e não pensara
Que tudo tendo fim, também as acaba
O sonho que deveras já desaba
Turvando uma água outrora mansa e clara,

Assim a realidade se apresenta
E o tempo consumindo a fantasia
Devasta e nada após se mostraria
Mudança radical, por vezes lenta

E o passo que se dá rumo ao futuro
Encontra os pedregulhos naturais,
Depois vem o sabor do nunca mais,
E quando em voz sombria eu me amarguro

Pensando ter deserta esta esperança,
Um novo amanhecer, o amor nos lança.


2


Viver desta emoção as variáveis
Que possam nos trazer dor e alegria
E quando nela mesma se recria
Momentos de prazer ora alcançáveis

Vislumbro novos tempos adoráveis
E sei que o quanto a vida impediria
Um passo mais audaz; melancolia
Traçando descaminhos intragáveis.

Herege companheiro do não ser,
Astuciosamente; o desprazer
Engana enquanto beija e nos encanta.

Audácias se perdendo no vazio,
Sem nada em minhas mãos, aguardo o estio,
E um pássaro agoniza enquanto canta.


3


Os sonhos mais gostosos de sonhar
Perdidos numa noite de verão
Somente vãs tristezas mostrarão
A quem não aprendera a navegar

Distantes oceanos, perco o mar
E vivo na completa solidão
Angustiadamente sinto então
O mundo neste instante desabar.

Houvera uma esperança que, ilusória
Trouxera um falso gosto de vitória,
E agora sem ter nada em minhas mãos

Percebo quão difícil ter certezas
E ao enfrentar diversas correntezas,
Os sonhos que eu tivera, todos vãos.


4


Buscando, no luar, ser o que sou,
Apenas um fantasma perambula,
E traz no seu olhar a imensa gula
De quem por tanto tempo imaginou

O mundo bem diverso do que agora
Desnuda-se defronte ao seu olhar,
Cansado de tentar e de lutar,
A morte salvadora não demora,

Bebendo da ilusão em farta dose
Um tétrico fantoche, um vil bufão
Percebe quanto a vida foi em vão,
Por mais que a fantasia ainda goze

Espalha pelas ruas seus retalhos,
Já sabe do sofrer vários atalhos.



5



Reflito tanto amor, mas vou sozinho
Nas ânsias tão comuns de um sonhador,
O peso tão diverso deste andor
Às vezes em tempestas ou carinho

E quando deste rumo, descaminho,
Não tendo nem sequer por onde for,
Do quanto imaginara bela flor,
Apenas vislumbrando cada espinho,

Acrescentando o nada à minha vida,
A sorte há tanto tempo vã, perdida,
O que resta de mim, puro abandono.

E quando da esperança algum reflexo
Encontro; sem certezas, perco o nexo
Somente do vazio enfim me adono.


6


O quanto eu desejara se resume
No quase acontecer que me persegue,
Enquanto a fantasia sempre negue
Não tenho da esperança o seu perfume,

Aonde imaginara raro lume,
A luz em tom sombrio já renegue
Caminho que talvez inda sossegue
O coração de um tolo, que se esfume

Em vária caricata face escusa,
Ousando ser além que a paz conduza
E possa ter nos olhos florescência

Diversa desta opaca estupidez
Que agora se mostrando de uma vez,
Levando pouco a pouco à vil demência.



7


Amante sem ter cama, sem ter ninho
Voluptuosamente em sonhos, vago,
Mas quando me percebo sem afago
Seguindo para a morte; assim sozinho

Encontro alguns resquícios do que fora
E vejo que vivi, mesmo que pouco,
Andara em descaminhos feito um louco
Uma alma muitas vezes sonhadora,

A juventude ao longe, o fim por perto,
Não quero o sofrimento, sigo só,
Da imensidão da estrada, ledo pó,
De tanta turbulência, ora o deserto,

Mas fui feliz e basta; no último ato
Da peça feita em vida o que retrato.


8



Servindo de repasto para a dor
Um velho coração se desatina
E sabe que afinal em triste sina
Imagem retratando o sonhador

Seguindo sem destino aonde for,
Passado dia a dia determina
A seca que deveras mata a mina,
Negando o nascimento desta flor

Que outrora fora apenas esperança
E quanto mais a vida segue e avança
Percebe-se a aridez do chão inglório,

Não tendo mais por que ainda explore-o
O solo que deveras quis fecundo
Somente em vãos abrolhos, ora inundo.


9


Vivendo sem ter cálice nem vinho
Não posso mais brindar à sorte insana
Que tanto me acarinha quanto dana
Deixando-me deveras tão sozinho,

E quanto mais audaz o passo eu tento
Maior a queda, eu sei que não valera
Sequer saber da rara primavera
Moldada nesta teia, sofrimento.

Astuciosamente a vida trama
Momentos que decerto não saciam,
E os olhos num instante se desviam,
Deixando para trás a intensa chama

Que um dia norteara uma existência,
Agora só restando esta inclemência.



10


São tantos que naufrago nesse mar
Perigos entre as ondas e tempestas
O quanto de carinho ainda emprestas
Permitem este sonho navegar,

Procelas e borrascas a enfrentar
Não deixam claridades, meras frestas
E nelas ilusões que enquanto gestas
Tramitam entre céus; louco vagar.

Às vezes acredito que algum porto
Exista, mas sabendo o quão absorto
Meu passo em meio aos vários temporais

Escusas madrugadas, noites frias,
E enquanto mais distante; fantasias,
Restando inacessível qualquer cais.



11


Amores mal vividos, qual mortalha
Vestida pelo tolo caminheiro,
Aonde se pensara verdadeiro
Apenas ilusão fria navalha,

E quando em cada espaço a dor retalha,
Não deixa nem sequer ainda inteiro
O sonho muitas vezes mensageiro
No qual a realidade ainda atalha

Mudando a direção dos ventos, vejo
A sombra inusitada de um desejo
Inconseqüente rumo que ora tento,

E numa ansiedade sem limite
No tanto quanto quero que acredite
Esqueço por momentos, sofrimento.