sábado, maio 27, 2006

O HOMEM DE BRASÍLIA


Havia um prefeito na zona da mata mineira, lá pelos idos dos anos 70 de características inusitadas.
Político à antiga, tinha entre suas características mais comuns, certa ingenuidade e uma absoluta matreirice associadas com uma singular singeleza.
Contam que, no auge do Opala, como um dos carros mais bonitos e de maior status nesse país, principalmente no Diplomata, símbolo de ostentação nos meios quase rurais desse país, nosso herói comprou um desses carros.
Era o orgulho do Prefeito, todo azul, com listras brancas laterais, era lindo de se ver.
Por dentro, colocara um ar condicionado, que o fazia mais e mais se sobressair sobre as dezenas de fuscas, Variants, Dkws e Corcéis que circulavam pelas ruas esburacadas ou sem calçamento do lugarejo.
Nosso prefeito a quem vou chamar de Francisco, tinha um amor muito grande pelo automóvel, quase tanto quanto pelas “meninas” da Clarice, velha cafetina de histórias generosas e muitas vezes cômicas.
Dona de vasto repertório de intrigas e confissões, sua agenda era quase que tão temida quanto à de uma coleguinha sua famosa, lá de Brasília.
Falando em Brasília, voltemos ao fato antes que os devaneios me façam perder o fio do novelo, ou da novela...
Um dia, Francisco foi chamado para uma reunião com o Governador de Minas, Francelino Pereira, se não me engano.
Esse fato deixou nosso amigo em polvorosa. Um Governador de Estado convocá-lo para uma reunião! Era um fato de maior importância, talvez o de maior relevância naquele recém nato município.
Se arrumou, mandou comprar um Terno na Ducal, loja famosa do Rio de Janeiro, se aprontou todo, mandou a patroa comprar um vidro de Vitess, se perfumou todo, recendendo ao perfume até os cabelos.
Muito bem vestido para os padrões da municipalidade, pegou o seu Opala e mandou o motorista da ambulância, velho correligionário que, na ausência de um motorista oficial da prefeitura, se colocou à disposição de Francisco para levá-lo à Belo Horizonte.
Viagem longa, cansativa, mais de 400 quilômetros, muitos deles em estrada de terra.
“Vou pedir ao Francelino para asfaltar essas estradas” pensava nosso amigo, já se sentindo dono de uma amizade mais estreita com o Governador Mineiro.
O correligionário da Arena não ia lhe negar o pedido.
Mas, voltando ao caso, eis que chegam a Belo Horizonte, cidade grande que assustava o simplório político.
No Palácio da Alvorada, ao dar entrada, teve que deixar seus documentos, o que irritou-o sobremaneira. Mas, cada roca com seu fuso, cada povo com seu uso, pensou e obedeceu mesmo a contragosto.
Ao se sentar, defronte a uma moça bonita que o pediu para esperar um pouco, começou a sentir que sua presença era aguardada, mas não tão ansiosamente como pensara de início.
Depois de quase duas horas esperando, vê chegar um homem, todo engravatado, com uma aparência muito elegante e ares de superioridade.
Esse novo personagem, ao entrar, cumprimenta informalmente a secretária, como se já a conhecesse há tempos.
Nisso, percebe quando a mesma, pelo telefone conversa com o Governador:
-Sr. Governador, o homem de Brasília chegou.
Ah, isso fora demais. Ao que, prontamente, sem titubear, Francisco se ergue revoltado e desfere essa:
- Se ele veio de Brasília, fala pro Francelino que o Francisco que veio de Opala está aqui, num vou deixar que um camarada, só por que veio com um carrinho desses possa achar que é melhor que eu. EU VIM DE OPALA MOÇA!