segunda-feira, agosto 28, 2006

Trovas Nas ondas do rio mar

Nas ondas do rio mar,
Na cachoeira do santo;
Maria, quero casar;
Saudade traz o seu manto.

Vi nascendo meu amor,
Nos braços do bem querer;
Não me deixe, por favor,
Sem você posso morrer...

Quero o gosto da Maria,
Na boca que Deus me deu;
Meia noite meio dia,
Quem gosta dela sou eu!

Vi carranca no Nordeste,
Em Minas eu vi também;
Eta amor cabra da peste,
Chorando por outro alguém...

Minha vida fez enganos,
Enganei, ela, também.
A vida trouxe seus planos,
Coração tamanho trem...

Beija flor que cria ninho,
Nas asas do seu amor;
Beijando amor vou sozinho,
No fundo nem beijo a flor...

Quis fazer uma trovinha,
Com a cara da Maria;
Difícil fazer covinha,
Meu amor eu não sabia...

Ritinha tem um buquê
De rosas e margaridas,
Meu amor, eu sem você,
Só conheço as despedidas...

Na beira daquele lago,
Tem um canto diferente
Cigarro quando não trago,
Estraga a vida da gente...

Bola que bateu na trave,
Depois entrou gritei gol,
Do coração não sei chave,
Passarinho que voou...

Eu recebi a resposta
Pra carta que lhe mandei,
Eu já perdi essa aposta,
Não tem rainha nem rei...

Trovas são como recados,
Em quatro versos sentidos,
Olhando bem para os lados,
Meu amor, não dê ouvidos...

Vim de terra diferente,
As moças não têm segredo;
Quando o povo tá doente,
O doutor foge de medo...

Nas dentes dessa engrenagem,
Os meus dentes eu perdi,
Vivo fazendo bobagem,
Só por isso, estou aqui...

Vento traz a tempestade,
Raio, relampo e trovão,
Meu amor, que crueldade,
Maltrata meu coração...

Deu coceira no meu pé,
Achei que estava doente,
Não foi nada, foi chulé,
De seu amor, era crente...

Na reza que tanto reza,
Não fala mais em Senhor,
Coração quando se preza,
Dispara forte n’amor...

Fiz um verso bem moderno,
O molde esqueci depois,
Parecendo com meu terno,
Tira cem coloca dois...

Encerrando essa sessão,
De versos bem mal rimados.
Atravesso meu perdão,
Com suor dos desgraçados...

Cantas nos bastidores dessa vida

Cantas nos bastidores dessa vida,
A voz cansada estraga toda a festa.
Muito do que já fomos, pela fresta;
Da janela se perde mais vencida...

Não quebro meu pendão nem vem parida,
A morte que queimava essa floresta;
Tentei fazer sertões, mas nada resta,
Procuro por senões, cadê guarida?

Nas folhas do caderno teu sinal,
As horas que sangramos no jornal;
Serviram de estocada dessa faca.

Não consigo voar, tudo me estaca,
Caminhando serei, sangue e cloaca.
Não quero ser rei, lúbrico sal...

Pernas estão cansadas dessa lida

Pernas estão cansadas dessa lida;
Estrada que percorro não dá mais,
Quisera estar vazio, mas demais,
Não temo nem chegada nem partida...

Vasculho nas gavetas Margarida,
Encontro simplesmente esses boçais
Escritos que fizeste nos jornais,
Dizendo que querias despedida...

No meu cabelo sinto tuas presas,
E no pescoço, tento ser mordaz,
Passando pelos olhos, sinto, tesas.

Servindo coca cola se és capaz,
Mexendo nas entranhas correnteza,
Aperta suavemente essa tenaz...

Quero momento, sentimento e esmo

Quero momento, sentimento e esmo;
Na mesma forma, fornalha e fogo;
No jogo em riste, lanças e dardos...
Meus fardos são falsos e falidos...
Tento intento novo e revisto,
Me desvio e cio, vicio e previsto,
Visto quê, jamais poderei errei e suo...
Sou o que soa, absurdo e vôo, tenaz...
Audaz atroz atriz atrás de tantas quantas
Fossem as possíveis peças...
Me peças nada adia adora, a hora agora...
Me deixo ser seixo, a gueixa se esvai...
Vãos da porta, morta a solidão, dão créditos...
Méritos e atritos, detritos sou mito, minto...
Tinto meu sangue, mangue, zona e ozônio,
Axônio e Estônia, estranho como um trino,
Lá trino e latino, um átimo um último, hino...
Meus olhos, teus óleos, girassol, giramundo...
Vagabundo, sou seu sal, seu céu, véu e ventania...
Visto meus tafetás meus confetes e tapetes...
Visto que fosse um começo de brisa,
A vida me avisa, vista a lua;
Deixe-a nua,
A rua
Lá...

Salmo 8

Puseste Tua glória nos Teus céus,
Tua força, ordenaste nos infantes,
Para calar inimigos, bem antes,
Lua e estrelas preparas, lindo véu.

Homem, simples mortal, mas o visitas;
E sempre se recorda do rebento.
Quase tal qual um anjo, solto ao vento,
Nos fizeste, dando-nos as pepitas,

Ovelhas, bois, campestres animais;
Aves do céu, os peixes desse mar,
Sobre todas as coisas, dominar...
Por isso; meus irmãos, a Deus, louvais...

Tua beleza, caminhando livre

Tua beleza, caminhando livre
Na sala, flutuando a cada passo;
Qual fosse garça, graças no cansaço;
Que, por ser sonhador, eu tanto tive...

As minhas noites, tudo, enfim, revive,
Na delícia sutil; sem embaraço,
Vou seguindo-te manso, traço a traço;
Desenhas, mal percebes, um declive.

O murmúrio da brisa, da sacada
Pressinto teu suave, éter, respiro.
No momento seguinte, me retiro;

Procuro então, sentir-te, em vão, deliro.
O teu andar sereno, esvai-se em nada;
És fátua, visão na madrugada...

Salmo 7

Confio em ti, Senhor! Do que persegue
Me livre, não permita que minh’alma
Seja despedaçada sem que a calma
Da liberdade, seja enfim, entregue...

Mas se perversidade ,em minhas mãos,
Tomar lugar, permita que m’alcance
O inimigo e reduza, num só lance,
Toda glória e respeito dos irmãos!

Pois tenha fim malícia dos impuros,
O meu Senhor, escudo, me proteja
Daquele que, somente, me deseja
O mal, tuas espadas sobr’os duros,

Quem não se converter, já tem armado,
Espada, arco, mortais, bem afiadas...
Na cova que cavaste, verás, marcadas,
As vidas que escolheram, o lado errado...

Su’obra cairá sobr’a cabeça,
Retos de coração serão os salvos;
Entretanto dos ímpios, Farás alvos,
Louvemos Meu Senhor, que eu O mereça...

Gilberto e a Apendicite

Na sua adolescência Gilberto era um poço de saúde. Menino criado com vitaminas preparadas por Dona Rita e na base de muita fruta pega nos quintais de Santa Martha, às custas de alguns sustos e um ou outro tiro de sal na bunda, crescia à olhos vistos..
As costas largas cultivadas nos banhos de rio, demonstravam um exemplo claro de que vida livre, com exercícios físicos e boa alimentação fazem, realmente, um efeito maravilhoso...
Mas, num dia quase fatídico, amanheceu com uma dor na barriga. A dorzinha que, de início, era fraquinha, foi se intensificando.
A princípio dona Rita achou que as lombrigas estariam fazendo uma festinha no abdômen do rapaz mas, como as gotas de elixir paregórico não tiveram o efeito esperado, começou a se preocupar.
Em pouco tempo, Beto se contorcia de dores, gemendo e gritando, desesperadamente.
Como Santa Martha não tinha médico e, muito menos, hospital, a solução era levar o pobrezinho para Ibitirama, onde há um posto de atendimento, bem equipado por sinal.
O médico plantonista era um tal de Doutor Marcos Valério, um ortopedista que começara a trabalhar ali há pouco tempo.
Ao ver o rapaz se contorcendo e gemendo, ao apalpar a barriga, percebeu que o quadro merecia uma atenção especial.
A apendicite aguda era uma hipótese que não poderia ser descartada.
Como o laboratório era de difícil acesso, e não conseguia vaga para transferir o pobre rapaz, mandou verificar as temperaturas anal e axilar.
A diferença dessas temperaturas, muitas vezes, demonstra a possibilidade de apendicite ou de processo infeccioso naquela região.
O resultado tinha sido inconclusivo, então mandou pegar uma veia do paciente, colocar um soro e observar.
Passadas duas horas, com a piora do quadro, mandou reavaliar as temperaturas para constatar se tinha havido alguma mudança.
Nada, o resultado tinha sido igual ao anterior. A vaga não aparecia e Beto, entre manhoso e dolorido, parecia um bezerro desmamado, gritando e esperneando a todo momento.
Depois de um outro período, nova averiguação, também inconclusiva...
Nesse meio tempo, começou uma tempestade daquelas que só acontecem nos contos e nas histórias...
A chuva desabando, raios e trovões espocando a cada momento.
Gilberto, por sua vez, gritando e gemendo.
Temperatura vai, temperatura vem...
Tudo correndo desta maneira até que, para desespero de todos, aconteceu o pior.
A noite se aproximara e a luz, não resistindo às intempéries do tempo, acabou.
Sala do repouso lotada, a enfermeira não teve alternativa; acendeu uma vela.
Beto, no desespero da dor, ao ver aquela luz bruxuleante se aproximando e escaldado de tanto termômetro pra cá, termômetro pra lá, não titubeou:
-Tudo bem, mas apaga isso primeiro!

Castanha do castanheiro Trovas

Castanha do castanheiro,
E do pinheiro, o pinhão...
Amor, pra ser verdadeiro,
Não precisa de perdão...

Recebi tanta coragem,
Desde o dia que nasci;
Amor foi minha bobagem,
Nos teus braços me perdi...

Andréa tem, com certeza,
Um olhar amendoado;
Quando mira, traz beleza,
É a flor do meu cerrado...

Menina pensa direito,
Não me faça covardia.
Amor que bate no peito,
Via batendo todo dia...

Recebi o teu recado,
Te respondo nos meus versos;
Amor é jogo marcado,
Então procuro os ingressos...

Bate sino da matriz,
Anuncia o casamento.
Noivo seguindo feliz,
Noiva n’arrependimento...

Me restam poucas lembranças,
Memória é coisa que trai;
Brincavam duas crianças,
Saudade, no vento, vai...

Um dia, simplesmente, foi embora

Um dia, simplesmente, foi embora,
Deixando tão somente teu retrato;
Lágrima denuncia: faltou tato,
Até minha viola, tudo chora...

Quem me dera poder estar agora,
Ao lado de quem fora meu regato,
De quem me foi servida, fino prato;
Apenas solidão, triste, vigora...

Como és bela, Lili, minha sonata;
Abrindo a madrugada, a serenata,
Traduz o que senti, restou sequer

Um retrato, maltrato de mulher,
Esquecido, jogado; um bem me quer,
Guardado na moldura, toda em prata...

Meu barco, navegante sem destino

Meu barco, navegante sem destino,
Errando pelos vários oceanos...
Piratas dos amores meus enganos,
Vagando nos meus sonhos de menino.

Recebo teus chamados, bato o sino,
Desmancho minha vida sem ter planos,
Meus dias são resgates dos meus anos,
Nas mãos de minha morte, desatino...

Revendo toda sorte de naufrágios,
Eu tenho me cobrado, tantos ágios.
Venero tuas rédeas, sou corcel;

Procuro meu futuro no teu céu,
A boca azeda medra sem ter mel,
Meu caminho vai pleno d’apanágios...

Meu barco, navegante sem destino

Meu barco, navegante sem destino,
Errando pelos vários oceanos...
Piratas dos amores meus enganos,
Vagando nos meus sonhos de menino.

Recebo teus chamados, bato o sino,
Desmancho minha vida sem ter planos,
Meus dias são resgates dos meus anos,
Nas mãos de minha morte, desatino...

Revendo toda sorte de naufrágios,
Eu tenho me cobrado, tantos ágios.
Venero tuas rédeas, sou corcel;

Procuro meu futuro no teu céu,
A boca azeda medra sem ter mel,
Meu caminho vai pleno d’apanágios...

Trazendo a mão cansada do plantio

Trazendo a mão cansada do plantio,
Buscando na cachaça, seu consolo,
Muitas vezes achando que foi tolo,
Como é difícil; terra tem seu cio...

O chão pesado, pernas no vazio,
Compressora essa vida, traz seu rolo,
No final sobrará, velório e bolo.
De tudo que restou, nem mais um pio...

Lavrando a terra, chuvas trazem festa;
Semente brota, cobrem toda fresta
Do solo mais gentil, por vezes, fera...

Nas mãos cansadas, tanta vida gera,
Dos seus olhos distantes, a cratera
Dessa desesperança é o que, enfim, resta...

No que fui, valentia foi piada

No que fui, valentia foi piada,
Tive sorrisos, faço minhas contas.
Foram precisos, minhas iras tontas;
Nada passou de nada, simples nada...

Agora invento minha madrugada,
Estrelas adormecem, suas pontas
Nunca mais chegariam; nem apontas
Mais seus olhos;certeiras tais flechadas...

Mandarim sem mistérios, por sinal,
Minha fúria contida, carnaval...
Eu masco minha vida, faço planos...

Mas bem mais sutilmente, passam anos.
Tramas e desenredos são enganos.
Nada mais levarei, resta o final...

Tenho tantas vertigens; dói joelho

Tenho tantas vertigens; dói joelho,
Pernas andam cansadas e pesadas.
Meus olhos estão bem vermelhos,
A vida vai passando, temporadas...

Minhas mãos doloridas, cada artelho
Trazendo seus sinais, cartas marcadas;
As rugas companheiras deste espelho,
Demonstram intempéries das jornadas...

Tudo envelhece, sinto, o tempo corta;
A cada dia, sigo devagar.
Essa distância, tanta vida morta,

Procuro convencer-me, procurar
O diabo que está atrás da porta;
Mas nada encontrarei, serei meu par...

Cordel - A minha sina - capítulo 4 - No dia em que o Diabo criou chifre

Depois de ter conhecido,
O neto de Lampião,
Lenda viva do sertão,
E tendo me convencido
Que nada mais é perdido;
Fiz pro moço, uma proposta,
Coisa de gente que gosta,
Ir pelo sertão afora,
Sem ter dia mês e hora;
Mas partiu, nem deu resposta...

Sozinho pelas estradas,
No meio de tanta areia,
Procurando pela teia,
Seguindo novas pegadas,
Esperando outras jornadas.
Homem valente de fato,
Encontrei uns três ou quatro,
Mas não queria de sócio
A vida precisa d’ócio,
Pescando nesse regato.

Acontece que sujeito
Que vive dessa maneira,
Pulando da barranceira,
Não pode ver um mal feito,
Acha que tá no direito,
De se meter em rabuda,
Não pode ver da miúda
Que entra em nova enrascada,
Saindo de madrugada,
Atrás de moça taluda...

Joaquim me deu pousada,
Pros lado do Patrocínio,
Falou num tal vaticínio,
Coisa das muito enrolada,
Botei meu pé, nova estrada,
E parti bem de mansinho,
Levando meus bagulhinho,
Guardados no meu bornal,
Quarta feira, carnaval,
Ia de novo sozinho...

Nessa mesma quarta feira,
Que é de cinzas pode crer
Montado num zabelê
Filho duma égua estradeira,
Pru móde ser mais ligeira,
Que eu precisava chegar,
Determinado lugar,
Na curva do Zebedeu,
E lá mesmo é que se deu
Isso que eu vou lhe contar...

Chegando nessa serrinha,
Que é lugar bem diferente,
Um monte de gente crente,
Disse que toda tardinha,
Avoa umas avezinha
Fazendo gesto indecente,
Mas é coisa de veneta,
Imagina, coça as teta,
Dando banana pro povo,
Os cabra mexe nos ovo,
Que isso é coisa do capeta!

Fui pagando para ver,
No que essa história daria,
Subindo na ventania,
Sem ter medo nem por que,
Esse trem vou resolver.
Num tem nem mais precisão,
De fazer sua oração,
Sou um cabra penitente,
Num tenho medo de gente,
Que dirá d’assombração!

O lugar era bonito,
Tinha cor do meu tiê
No meu velho metiê
Nunca tive tanto grito,
De mulher vaca e cabrito,
Zoando feito vespeiro,
Até fiquei mei besteiro,
Mas não arredei meu pé,
Chegando com pontapé,
Entrei nesse pardieiro.

No meio da confusão,
Reparei numa bobagem,
Reparei na sacanagem
Que não tinha nem perdão,
Um tremendo mocetão,
Tava toda machucada,
A bunda toda lanhada,
Riscada com um chicote,
Mesma hora dei o bote,
Levando a destemperada...

Moça bonita e dengosa,
Tinha os olhos rabichados,
Os lábios grossos, inchados,
Um perfume igual a rosa,
Eta bichinha gostosa!
Eu, na hora pensei nela,
Arretada matusquela,
Banquete prum homem só,
Nem pensei em ter mais dó,
Esqueci dessa esparela...

A moça num conseguia,
Falar na minha linguagem,
Mas pra quem quer sacanagem,
Era de pouca valia,
Entender o que dizia,
Não preciso nem falar,
Comecei a cutucar,
A moça de pouco a pouco
O troço deixando louco
Vontade de não parar...

Que boca boa, eu beijava,
A minha mão bem safada,
Fazia sua jornada,
Enquanto ela delirava,
Sua blusa eu abaixava,
As tetas todas macias,
Minhas mãos eram vadias,
Chegavam nas suas coxas,
As florizinhas mais roxas,
Não tinham tais serventias...

A perna da moça aberta,
Esperando pela clava,
Tanto gozo que se lava,
A danadinha era esperta,
Coisa boa que se flerta
Nunca se esquece mais não,
Deitei gostosa no chão.
Cavalguei essa danada,
Minha vida desgraçada,
Parecia ter perdão...

Tanto gosto, tanta festa,
Depressa a noite chegou
Quem gozou não reparou
Uma porrada na testa,
Uma pancada indigesta,
Acabei desacordado,
Quando vi, tava danado,
No meio desse barraco
Que recendia a sovaco,
Misturado com meleca
Reparei nessa boneca,
Mas sentindo do meu saco...

Num canto, tava amarrado,
Pelo saco sim senhor,
Por isso senti a dor,
Um calor desesperado
Tô frito, talvez assado,
Eu pensei por um segundo,
Nessa merda eu me afundo,
Não vai sobrar nem pentelho,
Vi um cabra de vermelho,
Mais feio que o tal Raimundo...

A morte não tinha pressa,
Fiz promessa de jurar,
Que nunca mais vou matar,
A minha mão Deus engessa,
Atadura nem compressa,
Precisa mais ter valor,
Nunca mais um matador,
Nunca mais um sanguinário,
Se meu Deus me der contrário,
Prometo agir com amor...

Apois bem, nem compensava
A morte via de perto,
Nem podia ser esperto,
O troço se complicava,
O moço os olhos injetava,
Com brabeza sem igual,
Meu último carnaval,
Era fava mais contada,
Toda tristeza instalada
Morto naquele arraial...

Uma voz de touro bravo,
Foi berrada neste instante,
Com três metro o tal gigante,
Me disse: em teu sangue lavo
Tu não serves nem pra escravo,
Depois dessa que aprontou,
Essa mulher que pegou,
Fez safadeza de fato,
Fez dela gato e sapato,
Pro chão, você arrastou...

Essa dona é melindrosa,
Com ela não bole não,
Ela é minha tentação,
Do jardim é minha rosa,
Eu sei que ela é bem fogosa,
Já lhe dei muita pancada,
Mas bem sei que a desgraçada,
É chegada em aprontar,
Qualquer um que for chegar,
A vadia é bem chegada...

Mas nunca tinha me dado,
Tanto trabalho afinal
Nesse fim de carnaval,
Parece ter despertado,
O que tem de mais tarado,
As pernas não sossegou
Depressa ela se entregou
A um vagabundo sem eira,
Depois de tanta besteira,
Um par de chifre botou...

A minha cabeça lisa,
Tá ficando encaroçada,
Por causa da disgramada,
Que tanta lição precisa,
Em teus bagos se batiza,
Não vai sobrar mais nada,
Nem sombra dessa safada,
Nem de você seu matuto,
Agora cansei, fiquei puto
Essa conversa fiada!

O trem estava fedendo,
Eu não vi mais solução,
Amarrado no culhão,
O calor já tava ardendo,
Eu pensei: já ‘to morrendo,
Num tem outro jeito não,
Pedi a Deus seu perdão,
E rezei com muita fé,
Mas, de repente, num pé
De vento uma solução...

Quando senti ventania,
Olhei de beira pro lado,
O troço tava arretado,
Meu Bom Deus me protegia,
Apesar das covardia
Que tanto fiz por aí,
Nesse momento eu senti,
Que meu Pai não me deixara,
Nesse vento que ventara,
Surgiu, do nada, o Saci...

Junto com o Pererê
Tava amigo Virgulino,
Que em todo esse desatino,
Nunca iria se esquecer
Dum amigo pra valer,
Companheiro do perneta,
Um tocador de trombeta,
Um arcanjo lá do céu,
Que no meio desse escarcéu,
Deu porrada no capeta!

Trazia de tira colo,
Aquela santa menina,
Ela mesmo, a tal Marina,
Por pouco que eu não me enrolo,
Vendo nesse mesmo solo,
O trio que me salvara,
Tomar vergonha na cara
E parar de safadeza,
Me perdendo nas beleza,
Vou parar com essa tara...

Planeta Azul

A primeira vez nua, em nosso espaço;
Que tão distante, longe sem embaço,
Te desnudaste inteira, Terra amiga,
Cantávamos felizes, u’a cantiga...

Eras muito mais bela; nenhum traço
Desenhara-te linda assim; Picasso,
Nem Da Vinci, nenhum deles; me diga
Quem pudera pensar que a Terra antiga,

De beleza gentil e inesperada,
Fosse roubar teus olhos, minha amada;
Pois tão sedenta andava só de luz;

Assim, mal percebendo o triste blues,
Num momento de glória, apaixonada,
A Terra, qual teus olhos, tão azuis...

A paz

Meu caminho seguindo pela vida,
Transcorrendo gentil e tão risonho;
E mal contendo, luzes em meu sonho...
Recebendo o calor na despedida.

Em todos teus respiros, ó querida;
Muitas vezes deparo, tão medonho
Quanto cruel, deixando-me tristonho...
Por tantas vezes, foste já vencida...

Morrer por ti, me sinto até capaz;
Quanta delícia, amiga, o vento traz...
Nas tuas mãos, tão alvas quanto belas,

Quisera Deus, poder tê-las singelas,
Na ternura do cais, saveiros, velas...
Companheira possível, és a PAZ...