sábado, janeiro 30, 2010

23900

A Via Láctea deita imensa claridade
Derrama este caminho em maga e bela luz
E enquanto se apresenta intensa nos seduz
Trazendo para o céu, um ar de liberdade,

Envolto em tal beleza, o brilho que me invade
Durante a noite inteira, imagem me conduz
Num êxtase supremo uma alma em paz reluz
Deixando-se levar, total tranqüilidade...

Poeta deslumbrado ao ver a Natureza
Entrega-se ao delírio e em plena correnteza
Esvai-se o vão terror que há tanto o consumia,

Enquanto a senda clara, em láctea maravilha
Etérea realeza, em mansidão rebrilha
E um verso se elabora imerso em fantasia...

23899

Imensa ansiedade envolve o sonhador
Que tanto se entregara e nada vendo em troca
Aos poucos se desvia e em vão já se desloca
Vagando sem destino e nada a se propor.

Teimando com estrela o velho trovador,
O sonho mais audaz, um barco em mansa doca,
O seresteiro faz da lua a quem invoca
A deusa preferida, argênteo, claro amor.

Percebe-se no olhar de quem enamorado
Ainda se mostrando em luzes encantado,
Vagando sem destino em rua, beco ou vila

Soltando a sua voz em alto som, num brado,
Vivendo sem temor, do amor que vislumbrado
Emana a maravilha e em luzes já desfila...

23898

Apenas esperando o dia em redenção
Eu sei que tanto medo espalha-se entre nós
A vida se é da vida amargo e duro algoz
Impede que se veja as luzes que virão,

E tendo neste olhar, o brilho e a sensação
De um mundo aonde possa em paz seguir a voz
De quem quando nos guia expressa estreitos nós
Aonde encontraria o amor em louvação.

Mas quando a voz se torna estúpida e venal
Rebanho se desvia e bebe deste fel
Amargando o terror, em dose tão cruel,

Serpente que desvia em rito sensual,
Demônio se apresenta e toma toda cena,
Enquanto mais distante, a paz ainda acena...

23897

Onde perpetuamente a luz já se escondera
Deixando a fria treva erguer-se soberana
Uma alma sem destino, aos poucos já se engana
Derrama-se depressa e como fosse cera

Aonde o fogaréu que amor louco acendera
Expressando a vontade uma alma que é cigana
Da plena liberdade, a todos já se ufana
E em meio a tal loucura inda sobrevivera.

Assaz rebelde sonho aonde me entregara,
Vivendo esta certeza, a vida sendo cara
Aporto em cais seguro ouvindo a voz do vento,

Que tanto me trazia a doce melodia
E agora tão somente a realidade cria
Moldando um mundo calmo aonde em paz, me alento...

23896

Pudesse ter nas mãos as linhas do futuro
Cigano coração, vagando mesa em mesa,
Adentra a solidão, prepara uma surpresa
E deixa o meu viver amargo e sempre escuro;

A solução; não sei. E quando em vão procuro
A vida se defende e mostra com destreza
A luz tão farta e rara expondo-se em beleza
E neste lusco-fusco; indômito, eu perduro.

Decerto quanta vez num brilho raro e nobre
A sorte sem desdém, aos poucos me recobre,
Mas quando vejo enfim, do corte a santa cura,

As mãos sonegam luz, e o medo continua
Aonde houvera amor, neblina cobre a lua
Deixando como rastro apenas a loucura.

23895

A luta prosseguindo em termos mais insanos
Não deixa sequer que se possa crer na sorte
E pesando este fardo aonde vejo a morte
Em passos sem descanso, andares soberanos,

E os dias transcorrendo em meio aos desenganos
Deveras poderia ainda ver no aporte
Da luz imensa e clara, amor que me conforte
Porém ao perceber, desvias estes planos.

E mudas novamente, audaz e soberana,
Uma alma que procura a paz em ti se engana
E morre a cada instante, um pouco e sempre mais,

As mãos pedem clemência e negas com sorrisos
Irônica serpente; invades paraísos
Preparas com sarcasmo amargos funerais...

23894

Indubitavelmente entregue aos teus desmandos
Não tento prosseguir sabendo dos anseios
Que entornas quando vês abertos mansos veios
Transbordando na guerra os dias que eram brandos.

Assim ao perceber deveras teus comandos,
Procuro algum refúgio em outros tantos meios
O pensamente invade espaços vãos e alheios
Ao vê-la qual abutre em incansáveis bandos.

Pudera ter decerto a doce sensação
Que possa permitir os dias de verão
Deixando para trás invernoso caminho,

Adentro a mansidão e bebo a calmaria
Enquanto percebendo a luz que se irradia,
Nas tramas deste encanto – AMOR – eu já me aninho...

23893

Minha alma se projeta além da eternidade
E busca a mansidão aonde eu poderia
Viver com plenitude um sonho, a fantasia
Expõe dentro do peito o canto que me invade.

Sem nada mais temer, e nada que degrade
O mundo que componho; a solidão desvia
Na braça de outro rio, e envolto em alegria
Deixando esta agonia apenas na saudade.

Seria muito bom se tudo fosse assim,
Florada garantida, a paz tocando em mim
E a vida renovada em meio às esperanças,

Mas quando tu me vês em sórdida tormenta,
O quanto eu poderia, apenas se lamenta
Não quero a piedade à qual; olhares lanças...

23892

Tragicamente eu vi depois da calmaria
Ainda imaginando um dia mais feliz
A dura tempestade, aonde a paz desfiz
E tão somente a dor em pântanos se cria.

Vencida pela fúria o mundo se esvazia
Somente vislumbrando imensa cicatriz
A sorte com desdém imenso contradiz
O que pensara ser além da fantasia.

Mas nada me restando apenas minha voz
Num brado que incessante audaz e até feroz
Não contenho o silêncio e dele faço o brado

Num êxtase profundo escrevo este soneto
E a luta que não pára; incessante, eu prometo
Deixando qualquer medo apenas no passado..

23891

Não vejo mais a luz aonde tanta vez
Pensara ter nas mãos destino, sorte e vida,
Agora que em verdade a história me convida
Mostrando aonde eu quis o amor que não se fez

E enquanto se perdera o rumo e a sensatez
A sorte se esvaindo e a glória em despedida
Não posso mais conter e a voz já vai perdida
Cansado de lutar, aonde há lucidez?

Não tendo esta resposta eu vejo que afinal
O mundo que eu buscara expressa-se venal
E em turbulento sonho eu tento inda revê-lo,

Mas nada me acompanha e exposto à fantasia
O quanto imaginara aos poucos se esvazia
Deixando tão somente o medo e o pesadelo...

23890

Herético demônio invade a Terra inteira
Espectro sanguinário entorpece os sentidos
Enquanto os homens vão, assim tão divididos
A solidão se mostra a eterna companheira,

E quando a noite chega e mostra a traiçoeira
Vontade soberana, adentrando libidos
Num êxtase supremo, os dias esquecidos
E a morte em riso farto expõe-se lisonjeira.

Impetuosamente ao fim de certo tempo
Aonde houvera luz, apenas contratempo
E o medo se espalhando invade cada casa

Nefasta madrugada anunciando o fim,
Trombetas vão tocando o amargo querubim
E o fogaréu se espalha aonde houvera brasa...

23889

Insólita figura andando sobre a Terra
Aonde se imagina a imensidão profana
A sorte tanta vez a quem sonega engana
E o coração vazio aos poucos se desterra.

Enquanto a poesia é morta e já se enterra
O gozo sem limite, imagem soberana
Destrói a eternidade; a geração se dana
E morta desde então, a peça enfim se encerra.

Aonde poderia existir a semente
A pétrea insensatez soberba e poderosa
Matando em nascedouro, enquanto a sorte glosa

Não deixa que respire um ar bem mais tranqüilo,
Invés do pleno amor, peçonha já destilo
Moldando em turbulência um sol vão e inclemente...

23888

A fé que nos movendo espalha a luz intensa
E trama no futuro um dia feito em glória
Ao ser humano então, o Pai trouxe a vitória
Eternidade sendo a maga recompensa,

A paz que existe em Cristo exala a força imensa,
Mas quando existe em nós, apenas a vanglória
Aquele em semelhança, agora sendo escória
No hedônico prazer, somente a fera pensa.

E quando o fim chegar e a luz celestial
Mostrada sem temor, à toda humanidade
Virão anjos do Céu e finda a impunidade

Rolando em fogaréu, tomando todo astral
A Mão que nos redime ao Fado se entregando,
Trazendo a plenitude apenas ao que é brando...

23887

Putrefação de uma alma expressa agora o fim,
Convulsa tempestade adota a humanidade
Satânico prazer cruel, enquanto invade
Espalha farto abrolho em árido jardim.

Distante da esperança, a voz de um querubim
Clamando pela paz, chamando à realidade
Enquanto em vã tolice, um ser que se degrade
Ditando solitário o que não sabe enfim.

Perdoe-me Senhor, se tanto magoei
E tanto descumpri a Tua santa lei
Pensando na alegria, apenas nada mais,

E agora quando a morte exala seus odores
Aonde imaginara ainda colher flores
Encontro em meu retrato imagens tão venais...

23886

Encontro no Senhor, amor de irmão e Pai
E louvo em oração agradecendo a luz
Que em meio a tanta treva a Ti, já me conduz,
Embora a realidade amarga e tanto trai

A luxúria e o prazer profano, nos seduz
E neles toda a glória, aos poucos já se esvai
E quando a noite chega e a escuridão distrai
A queda se prepara e o medo dita a cruz.

Nas urzes o Jardim se fez improdutivo
Também assim sou eu, porém em Ti eu vivo
E trago uma esperança, além do imaginário

Não posso me calar e sigo-Te Senhor,
Vivendo a plenitude eterna deste Amor
E o coração mais manso expressa este cenário...

23885

Caminha sempre surda a turva humanidade
Bebendo a solidão em taças de cristal,
Aonde se pudera amor fenomenal
Apenas encontrando a dor que nos invade

E teima simplesmente erguendo cada grade
Sem ter sequer notícia aonde este final
Nos levará contudo, a cada vão degrau
Escada nos conduz ao cume que degrade

Resíduo tão profano aonde houvera um sonho
Eu mesmo não escapo e em trevas decomponho
O tanto que foi dado em pleno e farto amor

Deveras deveria haver bem mais cuidado,
Porém no olhar ateu apenas o pecado
Merece tanto aplauso e até, glória e louvor.
Parágrafo que em brado evoca a salvação
Aonde se fez Deus presente em sacrifício
A multidão faminta ainda espera o ofício
E nele com certeza, os ditas da Paixão,

Mas sei que depois disso, o mundo segue em vão,
A cada novo dia, imenso precipício
Cavado pelos pés que desde o mero início
Trouxeram para a Terra o medo e a podridão,

Demônio disfarçado em anjo ou num pastor,
Esconde-se num antro, e mostra em suas garras
Libidinoso riso, em orgias e farras

Aonde se pregara o perdão feito amor
Descubro esta senzala e nela cada escravo
Nas ânsias do poder, o amor se torna agravo...

23884

Eu vejo o renascer de um tempo mais amigo
Na voz de um cantador, promessas se cumprindo
E o tempo se moldando em dia e claro e lindo
Trazendo ao sofredor, amparo feito abrigo,

Assim um trovador; deveras, já consigo
Pensar com lucidez no sonho que deslindo,
Um mundo bem mais justo amor se torna infindo,
E depois disto tudo; encontro o que persigo.

Quem dera fosse assim, mas não é a verdade
A podre realidade expressa a humanidade
Que aos poucos já destrói a casa aonde mora,

Bebendo deste sangue incrível virulência
Aonde houvera luz agora em inclemência
O mundo pouco a pouco a si mesmo devora...

23883

Apenas sobrará a ossada e nada mais
Por isso para que soberba em teu olhar
Depois de certo tempo, o nada há de encontrar
Aquela que sonhara em dias magistrais

Ser mais do que pensara, além de todo cais
A deusa soberana, esposa do luar
Ao ver-se transformada em pó irá brilhar?
Enquanto a voz do bardo em tons fenomenais

Eternizada em glória, um dia a bela diva
Agora já desfeita, em rugas e terrores
Ouvindo a melodia encarnará tais cores

Que a poesia trama e mantém sempre viva
A força que se impele e molda tais matizes
Diversos das que tens, imensas cicatrizes...

23882

Atônito encontrara escombros do que fui,
Aonde se imagina um tempo mais amável
Decerto em luz intensa, a noite memorável
Porém na solidão, castelo queda e rui,

E enquanto a luz se afasta o medo tanto flui
E tudo o que pensara, outrora em solo arável
Destrói-se num segundo além do imaginável
E no conjunto inteiro, a parte sempre influi.

Eviscerado sonho aonde te perdi?
Só sei que em pouco tempo eu me afastei de ti
E quando percebi o nada se instalara

E o medo me tomando, invade e não descanso
Minha alma busca em vão, a paz de algum remanso
Aonde quis o amor, apenas funda escara...

23881

Aonde imaginara um mundo feito em paz
Num tumular anseio a morte se deslinda
E quando na verdade é cedo, mesmo ainda
Assim a realidade o tempo diz e traz.

Percebo que afinal, o medo satisfaz
E o templo onde julgara a vida bem mais linda
Aos poucos com o tempo, enfim também se finda,
Mostrando a dor que sinto e esconde-se detrás

Enquanto a poesia outrora feita em luz
Agora em medo e treva, apenas reconduz
Ao pó de onde surgi ao pó que já me espera

Extremos que percebo aos poucos já se tocam,
As ilusões esqueço, as glórias não se estocam,
E aonde houvera amor, agora a vida é fera...

23880

Delírios sensuais em noite convulsiva
Expressam violência aonde quis a paz,
A sorte desvirtua o quanto sou capaz
Mantendo a velha chama ainda sempre viva,

Por mais que na verdade a vida já me priva
Do quanto desejara e nada satisfaz
Poeta se perdendo, a glória não se faz
Enquanto a fantasia, em tantas dores criva

O peito que se encanta e morre sem remédios,
Aguardo a solução; e imerso em frios tédios
Ingratidão se mostra amiga e companheira,

O medo se desnuda e chego ao fim de tudo,
Mesquinha sedução, na qual inda me iludo,
A morte mansamente assim de mim se inteira...

23879

Excêntrico cantor um dia quis poeta,
Quem sabe do silêncio escuta a voz maldita
De quem se fez em mágoa e dela esta desdita
Esvaziando o encanto e assim já se completa.

Amena madrugada? A sorte mais dileta
Morrendo sem o brilho, a luz não se credita
Em quem se fez sombrio aonde houve pepita
E tem a fantasia ainda como meta.

Mal pude perceber o quanto sou assim,
A paz não me domina, e morto chego ao fim
Deveras, temporais; espalho quando canto

Trazendo pra quem sonha uma verdade em pranto
Medonhas ilusões; já não cultivaria
Apenas tão somente espalho esta agonia...

23878

Haurindo um ar profano a vida em dores tantas
Exausto caminheiro aguarda pelo fim
E quando se percebe aonde e quando vim
Eu sei que na verdade ao ver-me desencantas.

Pudesse ter a glória, embalde quando cantas
Demonstras o vazio e mesmo sendo assim,
Ainda me pergunto o quanto sei de mim
Nas ondas do oceano; infaustos tu levantas.

E sabes discernir o que pudesse ser
Além do nada imenso, a glória de um prazer
Que jamais poderia encontrar em quem trama

A vida em voz nefasta, assim do quanto queres,
Não posso te servir sequer pratos, talheres,
Tampouco manteria acesa em nós a chama...

23877

Acreditar na vida, embora complicada
Às vezes com paixão em outras; desespero
Mergulho no vazio e nele me tempero
Sabendo que afinal o tudo trama o nada,

Mas quero me encontrar e sei que abandonada
Uma alma transpirando um desejo mais fero
Permite que se creia ainda no que eu quero,
Aguardo a lua cheia e vejo da calçada

O brilho que se espalha e toma toda a Terra
E quanta maravilha eu sinto que se encerra
Fazendo acreditar num dia claro e bom.

Mas quando na verdade, a lua surge imensa,
Não pode ter; sequer pensar na recompensa,
Segue ofuscada então, por luzes de neon...

23876

Fruindo mansamente em mim doce ternura
Aonde imaginara a dor e a virulência
Apenas só te peço, enfim tenhas clemência
Que a sorte a cada tempo em quadros emoldura

Diversa maravilha, às vezes amargura
E tendo disto tudo eterna consciência
Tu saberás viver e tendo esta ciência
Verás que na verdade, o amor já te procura

Amarga desventura, a terra mal plantada
E tudo o que eu vivera; eu sei não fora nada
Senão inútil noite aonde em vão granizo

O frio acometendo e a geada espalha
Por sobre a plantação a turva cordoalha
Deveras hibernando o sonho que preciso...

23875

Sombria madrugada envolta na neblina
A morte se aproxima invadindo o meu quarto,
Encontra-me cansado e de tudo já farto
Imagem que te assusta, a mim doma e fascina.

Pudesse ter agora a fria e dura sina
E quanto mais da vida afasto-me descarto
O sofrimento imenso e sei; feliz, eu parto
Deixando para trás a treva que assassina.

Outrora tive o brilho em plena mocidade
Agora tão somente o medo chega e invade
Tomando todo espaço insânia me acomete

Por isso no velório, um pedido eu te faço,
E peço que isto siga, em cada ponto e traço,
Invés do carpir falso, apenas luz, confete...

23874

Percebo que acabou a festa em que talvez
Pudéssemos saber da nossa plenitude,
Sem ter sequer alguém que ainda nos ajude
A vida se perdendo, em loucura se fez

E o renovar do sonho, a cada dia ou mês
Mudando na verdade omite esta atitude
Aonde se fez seca, ausência de um açude
Aonde se fez treva, procuro a lucidez.

Diógenes moderno; acendo esta lanterna
E nada encontrarei, carrego tal certeza,
A sorte está lançada, os dados sobre a mesa,

Felicidade morre, e enquanto o sonho hiberna
Aguardo melhor dia e sei que não terei,
Nem mesmo tendo a glória e sendo escravo ou rei...

23873

Cruel assassinato a cada novo dia,
Assim se espalha a dor e o mundo se perdendo,
Aonde houvera luz, agora se escondendo
Apenas ilusão, amor não se recria,

Viver este momento, estática agonia
Pudesse imaginar o medo como adendo,
Mas hoje numa esquina, o terror eu desvendo
E a noite se tornando eternamente fria.

Pudesse ainda crer na tal humanidade
Que se matando assim, em águas turvas nade
Deixando como herança a Terra inabitável,

Aos poucos que me lêem; perdoem desabafo,
Alexandrino verso, invés do que fez Safo
Um mundo solidário: um tempo memorável...

23872

Cadáveres no chão, exposta em guerra
A vida não valendo o pão sequer o vinho,
Caminho em solidão; no vago já me aninho
E o coração guerreiro, agora a paz encerra.

Enquanto desfilar a morte sobre a Terra
Deveras cabe a nós em forma de carinho
Saber o quão é bom chegar bem de mansinho
Deixando para trás, a dor imensa serra.

Quem sabe esta mortalha usada sem clemência
Um dia se transforme e trague a paciência
Na convivência plena ensinamentos vários

Além da complacência a luz guiando os passos,
Aprendo a respeitar do próximo os espaços
Meus aliados são antigos adversários...

23871

Humana insensatez destrói nosso planeta
Deixando para trás a vida em louca esfera,
Aos olhos de quem ama, esmagar a pantera
É tudo o que devia à paz da baioneta

Porém com simples arma, a ponta da caneta
Um sonhador qualquer, ainda a sorte espera
E bebe da ilusão, vazia e vã quimera
Até já parecendo, às vezes tão ranheta.

Não posso e nem devia enfim silenciar
A sertaneja luz intensa do luar
Derrama sobre nós a imensidão de um céu

Aonde se permite o brilho do futuro,
E mesmo que este solo ainda árido e duro
Só nos cabe fazer em paz nosso papel.

23870

Proliferando a guerra aonde se quis paz,
Vencida este ilusão, apenas realidade
Embrutecida sorte embora não se aguarde
Ainda creio em Deus e o bem que Ele me traz.

Enquanto humanidade aos poucos já desfaz
O Amor que recebeu num ódio eis a verdade
Transforma esta venal; tanta imbecilidade
Total insensatez num mundo mais mordaz.

Escuto ainda o grito emanado em senzalas
Ao ver tal sofrimento, estúpido te calas
Terrível omissão matando assim, futuro,

Permite que se creia – apocalipse vem
E no final de tudo, a solidão, ninguém.
Apenas o Senhor, que em lágrimas procuro...

23869

A consciência nada em águas turbulentas
Medonhas ilusões, estúpidas quimeras
Aonde no passado, a paz que ainda esperas
Trouxera uma alegria em lutas violentas,

Não posso me calar, já nem mais se agüentas
As tramas da loucura, as garras destas feras
Imensos temporais, vagando em vãs esferas
Temperas a alegria em cores virulentas.

Assim nada terás senão este vazio,
Que a cada novo verso, embalde desafio
E sinto tal horror aonde busquei glória,

Porém a solitária e amarga juventude
Sem ter a luz que guie e a mão que ainda ajude
Não pode nem pensar nos louros da vitória...

23868

Num mar aonde outrora imaginara a sorte
Sereias e tritões; mergulho em águas fundas
Deveras neste instante a dor da qual me inundas
Provoca a sensação sombria de uma morte

Aonde não pudesse entrar num novo norte
Nas vagas ilusões, deveras aprofundas
A seca se espalhando em terras mais fecundas
Não posso me furtar ao ver já sem suporte

Quem tanto se entregou e quis felicidade,
Agora tão somente o frio da saudade
Matando pouco a pouco, o nada como herança,

Mas sei que quem labuta, um dia há de vencer
E ter em suas mãos, as tramas do prazer
Com tal perseverança a paz ao fim se alcança...

23867

Vivendo esta amargura à luz de cada instante
Um velho marinheiro ainda busca um cais
Embora na verdade, eu sei que não tem mais
Sequer ancoradouro, aonde radiante

Divino e fabuloso em dias magistrais
Agora nada vendo; o mundo, este mutante
Aonde se pudera encontrar diamante
Apenas o vazio em que vos transformais

Dizendo desta luta inglória e sem vencidos
Tomando já de assalto embarga meus sentidos
E sei que nada tendo, ao fim amargo fel,

Bebendo da esperança um mel que não sacia,
Encontro tão somente à luz da fantasia
O coração vadio andando sempre ao léu...

23866

Destino em desatino, a rima se produz
E tudo o que pensara ainda não se fez
O amor com sua glória; expressando altivez
Aonde imaginara os sonhos belos, nus,

Apenas o vazio, entranha-se sem luz
E deixa como herança amarga insensatez
Vivendo por viver, buscando a lucidez
Eu sei do amor imenso, ao qual já se conduz

O coração que sonha em novo amanhecer
Aonde se emoldura uma ânsia em tal prazer
Que nada mais segura o fogo que nos toma,

Porém sem ter amor, do nada ao mesmo nada,
A angústia se anuncia e invés de uma alvorada
A névoa sem final, meu mundo entrando em coma...

23865

A Terra atormentada expressa-se deveras
Envolta em tal neblina a sorte amortalhada
Apenas o vazio aonde se fez nada
Enquanto sigo exposto e enfrento tais quimeras

Aonde poderia haver mais primaveras
Minha alma já vislumbra a noite, a madrugada
Em trevas, solidão; buscando a bem amada
Bem sei que no final, mais nada ainda esperas.

E sigo como fosse um velho timoneiro
Borrasca nunca finda e o tempo se nublando
As aves lá no céu esgueiram-se num bando

E tudo o que pensara agora acontecendo,
A vida traz na morte, a sorte e o dividendo,
E apenas um pedaço o que foi feito inteiro...

23864

A imagem caricata à qual já se entregara
Quem tanto se fez guerra e agora busca a calma
Eterno desamor, destroçando tua alma
A mesma mão que amansa, agora desampara.

Não sabes distinguir; a jóia sendo rara
Lapida-se com arte enquanto ali se acalma
O coração do artista esquece qualquer trauma
E a vida neste instante, em paz, logo se aclara.

Medonha estupidez; infausto desengano,
O mundo em que viveste embalde tão profano
Traduz e tão somente o fim que se aproxima,

Aonde houvera brilho as trevas entornando
Tempestuosamente, um mundo outrora brando
Desfaz em um instante o que se fez estima...

23863

Percebo entre as gentis, suaves maravilhas
O Brilho encantador por onde deveria
Seguir em calma rota, a imensa fantasia,
Diverso da tristeza aonde agora trilhas,

As sortes e o prazer, que em vão já não palmilhas
Permitem me falar do quanto poderia
Viver em plenitude o amor, esta alegria
Que sabe verdadeiro e; tola, sempre humilhas.

Cansado de tentar buscar a claridade
Meu peito já se expõe na luz da liberdade
Deixando para trás uma amargura imensa,

A vida nos ensina através do tropeço,
Buscar numa esperança a paz que ora mereço,
Diversa direção; amor nos recompensa...

23862

Aonde poderia em paz a criatura
Encontrar o remanso aonde se fez luta,
Minha alma sem cuidado, apenas já reluta
E vive amargamente a insânia da procura.

Enquanto a noite cai e o frio então perdura,
A solidão atroz, o amor em força bruta
Hermético eremita adentra em sua gruta
Sabendo mais distante a paz feita em ternura.

Assim a cada dia enfrento os descaminhos,
Os olhos entre vãos, dos medos são vizinhos
E sinto na amplidão, brilhantes astros; sóis.

Quem dera fossem meus, eu poderia ter
A doce imensidão do mundo em que o prazer
Amantes; já transforma em loucos girassóis...

23861

Qual fora um galopante e tonto desvairado
Andando sem destino em meio às tantas trevas
Procuro pela paz distante que inda cevas
Às cegas sem domínio, envolto em tal pecado,

Aonde poderia exposto ao meu passado
Trazer de volta à vida o amor se ainda nevas
E bebes da ilusão; traiçoeiras conservas
Longevas emoções, o tempo abandonado

E em pleno sortilégio, egrégias maravilhas
Dizendo desta lua aonde em brilhos trilhas,
Moldando a sensação supérflua e tão venal

Da eternidade expressa em gozo e riso tanto,
Apenas a verdade em tristes árias canto
Sabendo sem ter cais, naufrágio desta nau...

23860

Atormentado; eu busco alguma paz possível
E sinto que talvez ainda não consiga
Vencer a tempestade, embora tão antiga
A vida sem amor, não se tornando crível,

Mudando de estação, o vento ao longe, audível
Permite se pensar na sorte que periga
Imenso temporal; em fúria desabriga
No quanto o desamor se mostra tão factível.

No desagregador e temerário adeus
As lágrimas tomando os olhos tristes, meus,
Somente uma lembrança, apenas nada mais

De um tempo em que feliz, julgara-me qual Rei,
Agora percebendo o quanto tanto errei,
A sorte que tentara, eu não terei jamais...

23859

Eu penso no teu corpo exposto sobre a cama
Deitando esta nudez divina e soberana
Minha alma se entregando embarca-se profana
Enquanto à tal delírio o anseio já me chama,

Vivendo plenamente, as loucuras da trama
Da intensa claridade, a fúria que se emana
Daquela deusa nua, à qual vida se explana
Moldando com firmeza, a paz que se reclama.

Numa expressão suprema, aos gozos magistrais
Descendo pelo rio em margens fabulosas,
Enquanto num momento, em loucura tu gozas,

Da fonte que se mostra eu peço e quero mais
Até poder, cansado enfim saber que o sonho
É feito deste amor, que em luzes eu proponho...

23858

Meu corpo se entregando ao pânico e cansaço
Buscara há tanto tempo um canto em que pudesse
Viver a eternidade imensa feita em prece
Dizendo de um amor, que em sonhos inda traço,

Quem sabe se bebendo a luz de teu abraço
A sorte num momento então visse e viesse
Minha alma sendo exposta à venda em tal quermesse
Da qual não restaria ainda um leve traço

Não fosse a fantasia embalde vaga e tola,
A cruz que inda carrego expondo a nudez. Pô-la
Aonde eu poderia com calma decifrar

O quanto nada existe em lúgubre temor,
Arcando com meu erro, exposto ao novo amor
Bebido nesta noite, em raios de luar.

23857

Aonde se pensara apenas convulsões
Encontro finalmente a luz que procurava,
Vulcânica beleza, expressa em fogo e lava
Demonstrando divina, intensas sensações.

Pudesse ter meus pés sem algemas, grilhões
E a liberdade então, de uma alma outrora escrava
Na qual a fantasia em luzes claras lava
O tempo em que julgara exposto às ilusões,

Vencendo calmamente a fúria em desalento
Deveras outro tempo, ainda gozo e tento
Expressando no verso o amor que desejara,

Vivendo esta loucura a cada novo tempo,
Sem ter sequer mais medo, embora o contratempo
Cadenciando o passo, aos poucos curo a escara.

23856

Voluptuosamente em ti eu mergulhei
Bebendo a falsa luz que tanto ainda emanas
E quando, temerária a sorte desenganas
Mudando a fantasia, encontro noutra grei

Os restos do passado, à sombra do que eu sei
Passando pela dor, por dias e semanas
Tristeza rapineira em águas tão mundanas
Fazendo do vazio a sua norma, a lei.

E tudo não passou de simples ilusão,
Aonde poderia em paz, a atracação
Se desde que me entendo, o velho ancoradouro

Deveras destruído, expondo nas ruínas
Realidade tosca, à qual já não dominas
E o sol deste verão; aonde, em vão me douro...

23855

O quanto penso em crer num dia temerário
Exposto a mais cruel, terrível esperança
Que enquanto nos sacia, embalde não avança
Pudesse ter amor ainda em vida. Prepare-o.

E a sorte talvez mostre aonde eu quis sacrário
Sem medos nem engodo, a mão da temperança
Mudando a direção do dia já me alcança
E traz em alegria o amor tão necessário.

Pudesse ser real a doce fantasia
Que transforme em perdão a dor que tanto urgia
Medonho temporal; meu barco num naufrágio.

Porém o amor cobrando imensidade em ágio
Não deixa que se creia em luzes e perdão,
Matando o que pensara ainda: salvação...

23854

A voz da morte açoda em plena tempestade
A sorte se perdeu em meio aos vãos tormentos
Aonde inda pudera em tolos pensamentos
Apenas o vazio agora inda me invade...

Sabendo da esperança, amarga e fria grade
Ouvindo mais distante; apelos e lamentos,
Pudera ter a paz, ao menos por momentos,
Talvez eu nunca visse a luz que me degrade.

Espero em ansiedade; a dor, supremo infausto
Entregue ao seu domínio, aguardo este holocausto
No qual me fiz cordeiro, insânia em plena fúria.

Do todo que vivera; encontro a solidão
E nela mergulhando ao ver esta amplidão
Minha alma apodrecida, aguardando a paz. Cure-a!

23853

Iremos neste instante; adeuses proclamar
Aonde imaginara a paz que nos redime
A mera sensação amarga feita um crime
Entoa-se a mentira, e o vento no solar

Trazendo em dura sanha o quanto quis amar
E nada do que fora ainda o bem que estime
A mão que acaricia a mesma que me oprime
Deixando à própria sorte o quanto quis lutar...

E quando ao perceber no meio da batalha
A fúria de quem busca a sede da navalha
Exposto ao mais sombrio e trágico momento
Na angústia que se assoma, a boca escancarada
Esboço de ternura, agora não diz nada
E a sorte decomposta, apático, eu lamento...

23852

A noite se aproxima e traz esta derrota
Que tanto eu evitara e agora se percebe.
Aonde percorrera; escura e turva sebe
A turba em fria insânia aos poucos se denota

O medo inda estampado; amargura se nota
E toda a fantasia em vão já se concebe
Enquanto a dor venal, minha alma em transe bebe
O gozo permitido, além de qualquer cota

Transforma-se em terror, mudando a direção
Dos ventos que pensara em pacificação
E agora só terror invés de calmaria

Macabras sensações, a morte se aproxima
Trazendo em voz intensa, o fim do ameno clima
Tremulando este espectro escuso em que eu vivia...

23851

Não quero apenas crer na imensa desventura
Que tanto me maltrata e morde feito um cão,
Imaginando então as luzes que virão
E em lágrima e sorriso, o amor já não perdura.

Sentindo a mansidão, bebendo esta loucura
Adentro sem saber, imenso e fundo chão
Teimando no vazio, ainda crer no grão
Que a mão de um lavrador embalde faz cultura.

Ascendo num momento os infinitos ares
E tento procurar, embora saiba escuso
Deixando esta armadura aonde tu notares

Perpetuando a dor que tanto está presente
Escudo que em defesa, ainda – um tolo- eu uso
Arcando com o fim que em ti vida pressente...

23850

O amor que nos tramando a sorte em firme laço
Trazendo num sorriso a paz e a redenção
Ao mesmo tempo em fogo ardendo em sedução
Tramando a fantasia aonde em ti me enlaço

Intenso fogaréu que até em mero abraço
Causando num momento imenso furacão
Da brasa mansa eu vejo as chamas que virão
Tormento tão suave, em cada verso eu traço

Usando o meu buril; invento mil palavras
Enquanto a vida ceva, o amor em que me lavras
Gerando esta loucura imersa em fantasia

Poeta, bem queria então eu te mostrava
Da fúria de um vulcão, incêndio feito em lava
Da vida, solução, que me apascentaria...

23849

Ouvindo deste amor o som que me entorpece
Deixando à flor da pele anseios mais ferozes,
É como se talvez ainda em paz pudesse
Vencer a tempestade e as mãos destes algozes.

O amor quando demais, se faz além de prece
Enquanto caminheiro, escuto em mansas vozes
O canto que procuro e tanto me enlouquece
Deixando no passado angústias tão atrozes.

Seria muito bom poder ter a certeza
Da imensidão do rio em plena correnteza
Descendo para a foz que encontra nos teus braços,

Vivendo fartamente a imensidão da luz
No sonho mais premente o amor que nos conduz
No rastro que persigo; amenos, finos traços...

23848

Ainda sinto ao longe o encanto da ternura
Que tanto procurara e não tendo notícias
Embora no passado envolto em tais delícias
Sabendo do terror que ainda em mim perdura,

Alçando a liberdade em forma de candura
Melodias; sonhara em mansa paz. Ouvisse-as
E terias noção do encanto que em primícias
Promete tão somente imensidão, fartura.

E assim ouvindo a voz de um tolo cantador
Que fez a sua vida envolta em tal amor
Terás dentro de ti certeza absoluta

Do quão se faz em vão a vida de quem ama,
Por mais que ainda exista, acesa última chama,
Quem tendo a fantasia, em crer no fim; reluta.

23847

Viajo na palavra e em versos bebo a vida
Ascendo em poesia ao mundo mais feliz
Ou mesmo demonstrando a antiga cicatriz
Que embora tão distante ainda é dolorida,

E enquanto a realidade aos poucos me convida
Viver da fantasia é tudo o que mais quis
E sei que na verdade a vida se desdiz
E trago uma ilusão; encarno esta ferida.

Escrevo pelo amor de ter em liberdade
Embora com certeza o verso não agrade
Agrido-me sem ter sequer algum motivo,

Mas sei que libertária a vida do poeta
Trazendo a plenitude, e nela se completa
Nas mãos este rastelo; e por ele inda vivo...

23846

Entrego-me ao vazio aonde ainda via
Possível ter a sorte em leves emoções
Porém a vida traz perversas sensações
Deixando para o fim a morte em agonia.

Procuro finalmente a mansa sintonia
Que possa me trazer diversas direções
Vivendo em solidão entranham-me visões
E tudo, de repente explode em fantasia.

Não posso mais negar o quanto fui feliz
Bebendo da ilusão, fantásticas loucuras
E quando a realidade; em sombras emolduras

Diverso deste todo, o verso que ora fiz
Pudesse renascer em glória e paz tão terna
A luz de um amor imenso, ainda viva, e eterna...

23845

Envelhecendo o corpo uma alma há muito morta
Expondo em podridão aquilo que foi vida
Na decomposição a sorte adormecida
O quanto que inda resta; eu sei; já não importa.

Apenas o terror, ainda me conforta
Espero pela glória há tanto em vão, perdida,
Quem crê numa esperança e disto inda duvida
Num mar em calmaria aguarda um manso porto.

Etérea fantasia, o canto em doces tons,
A sorte se mostrando envolta nos neons
Mas sei que nada disso expressa a realidade;

Procuro em negro céu, o brilho de uma estrela
Não consigo jamais, embora busque vê-la.
Descobrir soluções, pergunto em vão, quem há de?

23844

Vontade de morrer em meio aos tantos medos
Percebo que o vazio aos poucos me domina
E aonde imaginara a luz mais cristalina
Apenas encontrando o imenso dos degredos,

Pudesse ainda crer e ter mansa paz. Ledos
Descaminhos tendo e deles me alucina
A sorte em vagos tons enquanto em podre sina
Escondo o que podia imaginar segredos.

E quando num soneto aos vastos eu me entrego
Bebendo da aguardente amarga em rumo cego
Escondo-me em tocaia, aguardo a fúria e a fera

Percebo quão tolo o estúpido que tenta
Enfrentar os leões; a morte violenta
É tudo o que decerto ainda ao torpe espera.

23843

Eclética emoção se desnudando agora
Trazendo avassalado o sonho que inda busco,
Embora no teu canto a luz em que me ofusco
Permite à solidão, matiz onde decora

O sonho em podridão; que sei não se demora
E tento ainda crer aonde em lusco-fusco
Um mundo que não seja amargo e um tanto brusco
Apaixonadamente o templo se decora,

Porém num desencanto amargura se dá
E vejo o que não quero aqui ou acolá
A sorte se desfaz na turba que, enigmática

Expõe a cada tempo um féretro diverso
No qual eu me sentindo entregue e quase imerso
Na voz dura e sombria o dom de estar estático...

23842

Entregue à solidão; meu velho camarada
Depois de tanta luta o final do espetáculo
Conforme imaginara, aquém do tabernáculo
Seguindo em vago sonho entranho-me do nada

A partir do vazio eu busco uma alvorada
Dissera em poesia, um tolo e falso oráculo
A vida em desencanto; o amor sendo um obstáculo
Expressando-me em vão; a sorte abandonada.

Decifro em tal marulho as ânsias deste mar
Pudesse finalmente, o tempo decifrar
Enigmático canto, aonde em luz profana

Herético momento, em busca do prazer
Hedônico imbecil; aguarda no não ter
A noite que inda trague a paz que tanto engana...

23840

O tempo se mostrando mais amigo,
Embora progredisse em desafeto,
Causando no passado o desabrigo,
Agora noutro encanto me completo.
Se o todo novamente assim persigo,
Nas tramas da loucura me arremeto,
E tudo o que em verdade inda consigo
Além do que dissera algo concreto,
Não pude discernir razão e gozo,
O dia se mostrando caprichoso
Demonstra as variáveis da emoção.
Enquanto me disfarço noutra senda
A sanha que procuro se desvenda
Ditames mais diversos da paixão...

23841

Num beco sem saída me trumbico
E quebro a minha cara todo dia,
Quem faz dos seus remendos poesia
Não atingindo nunca mais o pico.
Não quero mais saber se vou ou fico
Apenas o que a sorte me diria
Mergulho o meu cantar na fantasia
E quanto mais cutuco me complico.
O berço outro esplêndido adormece
E o quadro que a verdade ainda tece
Demonstrando o vazio que virá.
Não sei o que deveras eu pretendo,
Mas quando sem saída; vou bebendo
A sorte que se molda desde já...

23839

O quanto Amor se faz imprevidente
Mudando a direção dos nossos dias,
Aonde a realidade; poderias
A vida na verdade já te mente.
E nada no futuro se pressente
Mordazes ou sublimes alegrias
Audazes e diversas agonias
O Amor no próprio Amor já se desmente.
Assim navega contra o mar imenso,
E mesmo quando nele, ainda penso
Alçando a majestade da ilusão.
Nefastas tempestades e procelas,
Destino que em destino, Amor, tu selas,
Dizendo destes dias que virão...

23838

Miséria não se acaba, pois sustenta
A corja mais pilantra que conheço,
O mundo é sempre assim desde o começo
Por mais que a sociedade se diz benta.

O fardo que ninguém jamais agüenta,
Pesado muitas vezes, reconheço,
Mas sei destes canalhas, o endereço
Na ação que ao próprio Cristo violenta.

Melhores dias; sei que não virão,
E tendo apocalíptica visão
Piora se fazendo mais notada

A cada novo tempo; mais imunda
Na súcia tão cruel e vagabunda
Miséria sendo sempre alimentada...

23837

Sossega que eu te mando algum dinheiro
Depois de deduzidos estes gastos,
Terás como pensar nos teus repastos
Ao menos sentirás um breve cheiro.
E quando da verdade enfim me inteiro
O gado se fartando nos seus pastos,
Os olhos pecadores, ora castos,
Num ato tão gentil e corriqueiro...

A sopa não é sopa, tem substância
Até uns tomatinhos lá boiando,
E assim o dia segue bem mais brando

A velha burguesia em elegância
Devolvem o que roubam na surdina,
E pensam numa ação, quase divina...

23836

Expondo um miserável pelas ruas
Arranjo alguns trocados, sempre assim,
Um belo cidadão, um querubim
Nas doações diversas, tu flutuas...

E quanto mais otário, continuas
Maiores os desejos do chupim,
Às vezes disfarçado de cupim,
Verdades peçonhentas? Não. São cruas.

Invés do desgoverno ser cobrado
Melhor é se pedir por caridade,
Assim apodrecendo a humanidade,

Livrando todo mundo do pecado,
A paz adormecendo o travesseiro,
O povo empobrecido? Um bom cordeiro...

23835

A fome que na fome se sacia
Derrama suas marcas pela Terra,
Verdade que a verdade não encerra,
E quanto for pior, mais alegria.
O tempo em contratempo me dizia
Ganância diz trambique nesta terra
Neste alambique bêbedo se ferra
Dinheiro sempre acerta a pontaria.
Velhacos em barracos fazem festa,
E quando a podridão tal mundo gesta
Imunda cercania diz favor,
É tanta e tão profana pedição,
Na perdição fizeste a doação,
Miséria alimentando o protetor...

23834

A chuva que chovera chuva fina
Agora chove intensa tempestade
Por mais que a chuvarada desagrade
Esta enxurrada sempre me fascina,
Chovendo o tempo todo sem parar,
Achando que esta chuva traz a sorte,
Chuvisco sei quem já nem mais suporte
Depois deste chuveiro, vem luar.
Há quanto te imagino garoando
E sabe que deveras desde quando
Garoas com cuidado tu transformas
Um aguaceiro enorme em mansidão
Já não suportaria inundação
Se até para chover existem normas...

23833

O preço deste apreço é o desapreço?
Não faço neste caso distinção
Dissesse pelo menos sim ou não
As ordens deste encanto eu obedeço.

Mas sei que a cada passo outro tropeço
Aonde se perdeu a direção?
O tempo se mostrara qual vilão
Da sorte, por favor, qual o endereço?

Engesso-me em palavras, sigo teu
E quando este horizonte escureceu
Das nuvens fiz a chuva que é bendita

Do solo mais agreste, um lavrador
Ainda crê deveras num amor,
Por mais que ele jamais nele acredita...

23832

Apego-me ao pecado sem perdão
E pego cada rabo de foguete,
Aonde se podia ser cadete
Apenas um soldado; capitão.
O beijo foi apenas armação
Ação de quem buscara algum banquete
E tudo no final desce o cacete
Afunda o barco e toma a direção.
Corpúsculos, crepúsculos e sinas
Opérculos, apáticos poetas
Se nada do que fazes, tu completas
Complexos os desejos mais normais.
Pecado sem perdão é safadeza,
Garanto, meu amor, uma beleza...

23831

Um pássaro sem asas, ases guarda
Nas ancas das morenas sensuais,
Aonde se mostrou consensuais
Palavras a verdade não resguarda.
E quando o quanto mais jamais aguarda
Em meio a tais calores vós suais
Os dias são assim e sempre iguais
Por mais que vos viseis a tal vanguarda.
Enquanto em vegetais vos vegetais
Delírios das mulatas são as tais
Mortais ou imortais ao fim; podê-las
É tudo o que eu queria e vós negais,
Se não puder, deveras mais contê-las
Que faço meu amor destas estrelas?

23830

Sem plágio, sem naufrágio, ágil sou
E sendo frágil frasco não me quebro,
O tempo quando em templo já celebro
Metáfora do quase me restou.
Debruço sobre os sóbrios e ébrios brios
E brinco com palavras, lavro a sorte
A boca desemboca tal suporte
Causando quando em vez os calafrios.
Calabares pescara, escara funda
Os velhos escafandros, antros entram.
E quando neste antanho se concentram
Abaixa-se demais, mostrando bunda.
O povo não reprova cada prova
Comprova que soneto não é trova...

23829

Nos arvoredos; idas entre as vindas
Bem vindas ilusões dizem do pouco
Aonde em fantasia fico rouco
Enquanto tu desfilas e deslindas
As ondas nas marés por mais infindas
Formando a maravilha em que treslouco
Pudesse ser ao menos quase mouco,
Belezas com as quais ainda brindas.
Metódicos sonetos, atos ouço
E teimo num etéreo calabouço
Algemas me transmitem versos frios.
E o tema que em problema não desfaço
Bebendo do meu verso cada espaço
Mexendo assim deveras com meus brios...

23828

A forma pela forma sendo norma
Metade diz que sim outra diz não
E aonde se centrara a decisão
Apenas pena vária te deforma.
E nada do que teimo já me informa
Se peso mais um pouco a minha mão
O beijo transformado no formão
Perfomance diversa mundo forma.

Dormindo sobre penas, pobres gansos,
Os dias entre chuvas sem remansos
Alcanço o que não cansa, e já me diz.
O palco se ilumina a mina esgota
Abrindo das represas a compota
Inundo do que outrora quis feliz...

23827

Se aprumo ou se não prumo o rumo busco
Aonde não podia ser disperso,
E quando noutros termos desconverso
O quanto de mim mesmo sei mais brusco,
No peso do passado ainda ofusco
O que não poderia crer imerso,
Serpente se mostrando onde disperso
O pensamento eterno lusco-fusco.

Pereço quando faço o que não quero,
Mereço pelo menos bem mais fero
O férreo desafio ser ao menos.
O quanto desfiara dos teus dias,
Bem sei que tantas vezes desafias
Os tempos mais felizes e serenos...

23826

Semânticas diversas, sendo assim,
Românticos os versos que fizeste
Aonde se pensara mais agreste
A chuva vem molhando o teu jardim.
Jazigos entre pedras e florais,
Ascendo aos teus encantos, meus tormentos
E deixo-me levar pelos momentos
Aonde desejara ter jamais
O ser e o nunca ser; dúvida traz
Questões muito comuns; não mais adentro
Queria na verdade ser o centro
E o cetro depois disso diz a paz.
Apaziguada fera que carrego,
O amor mesmo sincero segue cego...

23826

Ouviram vozes tantas, medos fartos
E nada do que outrora se fez paz
Agora se mostrando mais capaz
Invade sem saber, salas e quartos,
Os dias em que foram feitos partos
No tempo a fantasia já desfaz
O que pensara ser inda mordaz,
Já não mais os queria então, reparto-os.
Sigo assim mergulhando no vazio
E o vendaval, quimera que desfio,
Desfiro como um golpe à flor da pele.
No peito esta medalha feita em tiro,
Se tudo o que não quero inda prefiro,
Ao longo descaminho me compele...

23825

Atento aos mais profundos sentimentos
Adentro os meus engodos e disfarço,
Se tudo o que me prende é um cadarço,
Alcanço desafetos, desalentos.
E enquanto ainda tenho brisas, ventos
Os dias entre os dias; sigo esparso
E tudo o que pudera, fera esgarço
Galgando mais velozes pensamentos.
Atestam-se momentos que não pude,
E mentalizo a sorte feito um grude
Que ancora barcos vários, tempestades.
Não peço-te perdão e nem defino
O que se fosse audaz ou cristalino
Importa-me bem pouco que te agrades...

23824

Estímulos diversos me afetando
O tanto verso quanto não me vejo
E sendo sempre à custa de um desejo
O quanto se fizera o mesmo quando.

E beijo tuas mãos, amanso o brando
E sendo mais profético prevejo
O quadro que diverge do lampejo
Aonde quis a vida despejando.

Oprime-me o primor do quase ser
Encontro o tanto ainda me gradua
Mineiramente bebo a luz da lua

E sei reconhecer o seu poder.
No palco aonde quis iluminado
O tempo se mostrara ultrapassado.

23823

Expondo esta ossatura imagem de um demônio
Estende-se no leito, envolto em ar sombrio,
A morte se aproxima, e enquanto a desafio
O riso em ironia; último patrimônio.

A pele se esgarçando, a vida de um campônio
Entregue à sua lavra, em larvas já desfio
O quanto desejara e o tempo tão vazio
Atônito e voraz aonde eu quis idôneo

Mas quando a vida traz ainda algum suspiro,
Minha alma em forma bruta expõe a sua face
Procura a salvação enquanto a vista embace

Um náufrago somente, e enquanto inda respiro
Bebendo do sarcasmo, exponho-me deveras
Que tanto se fez lobo agora entregue às feras...

23822

Não posso me calar enquanto a fúria volta
E tomando de assalto o coração insone
Por mais que a fantasia ainda reste e abone
A vida se transforma e envolto em tal revolta

Minha alma apodrecida, as mãos dos sonhos solta
Enquanto a solidão impede que abandone
A senda em que talvez uma alegria clone
E muda cada fase, o amor sendo esta escolta.

Mas vejo que afinal o corpo se desfaz
Deixando esta carcaça aos rapineiros lobos,
Em torno deste verme, os sentimentos probos

Ainda que distante, avista-se na paz
O que talvez pudesse enfim me redimir,
Porém cedo se amarga o que fora porvir...

23821

Enfrento dentro da alma angústia e sofrimento
Vou reduzido ao pó do qual não deveria
Jamais ser transformado em vida; onde se cria
A sorte se perdendo. O quanto já lamento

O dia que se foi redoma o pensamento
E a noite se transforma e torna-se sombria
Recebo em desalento o mundo em que queria
Invés da solidão, liberto sentimento.

Sentindo envilecida a sorte em turvas águas,
Restando deste encanto apenas frias mágoas
Deságuo nesta foz aonde se fez trágico

O caminho em que buscara ao menos claridade
Agora o desafeto e o medo que me invade
Mudando o meu destino, anteriormente mágico...

23820

Impotência tomando o coração senil
Além desta esperança aonde eu poderia
Viver a plenitude envolta em fantasia,
Diverso do que outrora o sonhador previu

Estúpida memória aguarda o final vil
De quem há tanto tempo enfrenta a noite fria
Esboço a reação; porém tal vilania
Não deixa que prossiga embora vá gentil

O término da vida, angústia sem limites
No desamor completo, aquém do que credites
Auspiciosamente o mundo ainda traz

Num riso semi-roto, aurora em tal neblina
Enquanto uma alma tenta a luz mais cristalina
Buscando em desespero, ao menos certa paz...

23819

Quando imortalidade enfim puder tocar
De amores, a saudade expressa em tal beleza
Incontestavelmente o encanto e a grandeza
De um sonho que permita aos raios do luar

Perceber a delícia envolta neste amar
Além da própria vida entendo tal leveza
Indubitavelmente o mundo que se preza
Transcende a realidade invade o imaginar.

E assim perceberei que tudo se fez raro,
No gozo mais sublime o verso em que declaro
As magas sensações esmagam cada medo

E sei que tanta luz há de brilhar eterna,
Minha alma se entregando ao canto que se externa
Defronte a tanta luz, não luto e manso cedo...

23818

Se deste sentimento ardentes ilusões
Moldando o que seria um tempo mais tranqüilo
Vivendo a nossa história em vastas dimensões
O quando se deseja em novo e claro estilo

Trazendo no seu bojo o bem das emoções.
Não posso me calar defronte o amor. Senti-lo
É ter esta certeza envolta em seduções
De um mundo mais feliz no qual me desopilo.

E sigo em verso manso a direção de um rio
Chegando então à foz, o mar eu desafio
Desfio na palavra o tempo em que pretendo

Ter nas mãos a verdade e a paz que me transforme
Um ser outrora frio, um coração disforme
Encontra na alegria, imenso dividendo...

23817

No imenso frenesi procuro a calmaria
Aonde talvez fosse um pouco mais suave
A vida que tentei sem ter maior entrave
Num terno desejar; que me renovaria.

Porém em vasta senda, amarga fantasia
Na qual realidade a estaca fria crave
Trazendo então a dor; a liberdade, uma ave
Sem grades nem temor em doce sintonia.

Distante do que posso; ausente de esperança
Vislumbro a claridade e nela o sonho lança
Num último lamento um brado que redima

Abrindo este caminho aonde eu possa ter
Além de um sonho tolo, as tramas de um prazer
Moldado em alegria, em vida e farta estima.