terça-feira, fevereiro 16, 2010

24952

Monástica ilusão por vezes sonda,
O coração audaz de um cavaleiro
Que tanto se entregou e segue inteiro
Enquanto a fantasia ao longe ronda

Mergulho esta emoção aonde estronda
Uma explosão num tempo corriqueiro
E quando o verso mostra o derradeiro
Caminho se procura em mares a onda

Que possa permitir outra viagem
Enfrento estas serpentes e dragões
E quando a realidade enfim expões

Por mais que as fantasias nos ultrajem
Permanecendo em paz, nada a fazer
Senão beber o sol no amanhecer.

24951

Quantas vezes sofremos sem saber
Que a solução existe em cada caso
Aonde se trouxesse algum ocaso
Percebo no final o amanhecer,

E a cada novo anseio perceber
Que tudo nesta vida tem seu prazo
E mesmo quando iludo-me ou atraso
Encontro uma razão para viver.

Espero que talvez já não me deixes
E mesmo que sozinha ainda queixes
Conceba com sorrisos outra senda,

E quando a poesia te tocar
Entranhe-se nas tramas do luar
Permita que a emoção, sonhos atenda.

24950

Trazendo no seu bojo um abandono
Caminhando entre trevas e procelas
Enquanto novo mundo me revelas
Ainda me perdendo em medo e sono,

Por quanto muitas vezes eu me abono
Nas ondas e delírios, rumos, selas
E deixo para trás carrascos, celas
E deles outro tempo crio ou clono.

Vagando pelas noites; indefeso
Ainda quero crer no que não vejo,
E quando me sentira por ti preso

Talvez a liberdade mais distante
Permita que se tenha algum lampejo
Tornando o nosso dia radiante.

24949

A noite traz anseios e delírios
Envolta em brumas fartas e neblinas
Aonde se pensaram cristalinas
Imagens traduzindo-se em martírios.

Esqueço os meus anseios e mergulho
Nos braços desta lua enamorada
Depois ao perceber da madrugada
Apenas a ansiedade diz entulho

Invés de girassóis; coruja encampo
E cada rastro leva aos vãos mistérios
E quando me entranhando em seus critérios
Vislumbro constelar o pirilampo

E dele à noite inteira se irradia
Trazendo ensandecida esta magia.

24948

Bebera tanto pranto por quem dera
Soubesse desvendar cada querer
E desta cena engloba-se o poder
Que agora se traduz por medo e fera

E tudo se transforma após tal era
Aonde a poesia pode ver
Além do que deveras posso crer
Gerando e renascendo em primavera.

Astúcias entre botes, serpes, fúrias
E quando se mostrara em tais incúrias
As ânsias não cabiam mais em mim,

Versando sobre temas tão diversos
Encontro a solução em vãos imersos
Adentro este vazio de onde vim.

24947

“Das glórias decaído”um anjo atroz
Derrama sobre a Terra o seu fascínio
E dele com certeza grã domínio
E a cada vez mais alto sua voz

As trevas inundando todos nós
Promessa de um terrível extermínio
Extinta uma esperança, vaticínio
No qual não escapamos deste algoz,

E assim na fúria imensa a Natureza
Embalde encara a turva correnteza
Torrentes que ao final destruição

Explodem pelas mãos da humanidade
E quanto mais audaz, o monstro brade,
No humano ser maior satisfação.

CITAÇÃO DE ÁLVARES DE AZEVEDO.

24946

Numa ácida tormenta vida afora
As trevas e os temores guiam passos
E quando me percebo sem espaços
A fúria inevitável já se aflora
E toda a fantasia vai embora
Deixando os meus momentos bem mais lassos
E quando ao prosseguir não deixa traços
Vazio pouco a pouco já se ancora
E torna a nossa vida mais doída
E sendo sem porteira esta saída
As asas que libertam nãos as tenho;
E deixo-me levar por falsos mitos,
E quando se imaginam infinitos
Não deixam nem a sombra como empenho.

24945

Horripilantes noites solitárias
Acendo as lamparinas vejo o nada
E dele cada parte decifrada
Esconde as ilusões velhas corsárias,
E os andarilhos sonhos, forças várias
E nelas a promessa da alvorada
Ao dar neste sentido uma guinada
Descrevo sem sentir a velha senda
E quando a poesia isto desvenda
Estorvos do passado são comigo
E bebo da emoção quando me entrego,
Vagando pelas ruas quase cego,
Não vejo a cada curva outro perigo.

24944

Por tantas ilusões, cólera trago
E dela me sacio com pavor,
Andejo coração se fez amor
E dele nem sequer algum afago,
O tempo sendo atroz, verdugo e mago
Na alquímica loucura o meu louvor
Embalde tantas vezes bebo a dor,
E cada vez maior o velho trago,
Inebriante luz já não conforta
Quem tanto se escondeu atrás da porta
E sabe das porteiras mais atrozes,
Por mais que se pudesse crer no fato
Do qual e pelo qual já me maltrato
O dia se faria em novas vozes.

24943

Aonde se pudesse em Majestade
Vencer os meus anseios e vergonhas
Ao mesmo tempo em que decerto sonhas
O frio desta noite ainda invade
Tomando o coração esquece a grade
E beija esperanças mais bisonhas,
E quando noutras sendas tu te enfronhas
Inútil por mais forte que inda brade,
Vestígios do que fomos se espalhando
E tudo se demonstra desde quando
Audaz eu percebi o fim da linha.
Não posso mais seguir em dura estrada
Que sei vai terminar no mesmo nada
Enquanto a morte chega e se avizinha.

24942

Um hediondo espectro vaga à toa
E tresloucado ator se mostra assim
Num mote costumeiro e até chinfrim
A vida que pensara outrora boa

Ainda mais distante não ressoa
E molda cada abrolho em meu jardim,
Chegando mansamente vejo o fim
E dele me aproximo enquanto voa

Uma alma que jamais soube descanso
E quando no não ser ainda lanço
A minha expectativa mais completa,

A sorte se entorpece e me maltrata
Vencer a solidão da imensa mata,
Na fúria que devasta, a predileta.

24941

Sarcástica gargalha a fera insana
Que tanto poderia\estar em paz,
Mascaro com meu passo mais audaz
O quanto a poesia ainda engana

O velho caminheiro ora se ufana
Do tempo que vivera mais capaz
E quando quase nada satisfaz
A morte se aproxima e nos profana.

Arestas apontada, vida segue
E quando a realidade tudo negue
Herege aventureiro busca o cais,

E tudo que não tenho ainda busco
E quando me percebo em lusco fusco
Os dias que vagara são iguais.

24940

Se lúcido pudesse estar emerso
Ascendo ao nada ser e tudo bem,
Enquanto as tempestades inda vêm
Não deixo meu caminho mais disperso
E vivo etereamente este universo
Na busca insuperável por ninguém
E quando este estopim ainda tem
Poder de destruir, fogo diverso
Eu queimo-me nas ânsias mais ferozes
Ouvindo do passado estranhas vozes
Angustiosamente a vida traz
Ferrenhas ilusões nas quais me embrenho
E tendo em solidão maior empenho
Aonde poderia crer na paz?

24939

Um Sátiro encontra uma resposta
Nas ancas e nas ânsias da morena
Enquanto com sorrisos ela acena
A boca sobre os seios, sendo posta
Encontro novamente em cada aposta
O jogo que deveras trama a pena
E aonde a sorte engana e mesmo plena
Esconde desde sempre o que se gosta.
E quando me percebo sem saída
Adentro as ilusões da torpe vida
À qual ao me entregar já me perdi,
Vivendo este dilema, ser/não ser
Um desencontro feito em desprazer
Trazendo imenso inferno para aqui.

24938

Desertos que cultivo dentro em mim
Vagando sem destino, um beduíno
Ao mesmo tempo tento e não domino
Viver a fantasia até o fim,
E quando me disfarço sigo assim
Vencido pelos ermos, desatino
E tudo o que pudera determino,
Meu canto sem Oásis e Aladim,
Das tramas entre tendas e camelos
Ainda sobre a areia posso vê-los
E dessedento a sorte em cada sonho,
Haréns entre sultões e ventos fortes,
Só quero o teu amor, e me confortes
Nesta miragem rara que componho.

24937

Apenas quero a morte como abono
Depois das bancarrotas desta vida
E quando me percebo sem saída
Apenas no vazio me abandono,

E tanto quanto pude, inda ressono
Vagando pelas trevas, tal ermida
Por mais que se transforme, distraída
Ao mesmo tempo é luz, terror e sono.

Um andrajoso ser em plena rua
A história do passado continua
E nela e mesmo dela, meu prefácio.

Sem ter sequer quem possa me trazer
O amor que sempre quis e não vou ter,
Nem mesmo se deveras, inda enlace-o.

24936

No florescer sutil destas verbenas
Percebo a maravilha multicor
Do quanto é necessário se propor
Um tempo feito em belas, doces cenas,

E quando em novo tempo concatenas
Momentos de alegria e de louvor,
Fazendo desta história em pleno amor
Deveras enfrentando medos, penas.

Assisto enquanto a vida dá seu bote
E vendo o desfilar de camarote
Almejo o foguetório ao fim da festa,

E tudo o que pensei se completando
No dia mavioso amável brando
Bebendo cada gota que inda resta.

24935

Irônicas permitem luz que trace-as
As hordas de fantoches, tantos párias
E quando acendo em mim as luminárias
Já posso permiti-me às vãs falácias.

Descrevem ilusões, cruéis audácias
E nelas as palavras temerárias
Enquanto se moldando em cores várias
Diversos os matizes das acácias

Florindo no jardim de uma esperança
Aonde a sorte imensa já se lança
Fazendo da fortuna sua meta,

E quanto mais feroz o dia vem
Preciso neste instante de outro alguém
Porém a vida algoz, verdugo veta.

24934

Num quadro tão sarcástico de outono
Às vésperas do inverno terminal
Aonde poderia ter a nau
Momento de ternura e de abandono,

Se toda a poesia diz do sono
Incrível que se mostre no outonal
Caminho para o término fatal
Da vida que talvez tivesse o dono

Ainda neste encanto perecível
Eu teimo contra a luz e sendo crível
O gosto do passado inda atormenta,

Nas mãos trazendo a adaga, a faca e a foice,
O amor que tanto quis há muito foi-se
Na fúria desta dor tão violenta.

24933

Sentindo o frio intenso não consigo
Sequer já perceber algum alento,
E sinto bem mais perto o sofrimento
Que tanto desencanta em desabrigo,

Vencer a cada tempo o seu perigo,
E ter no olhar exposto ao forte vento
Fazendo da esperança meu intento
Se eu tento, muitas vezes mal persigo

A sombra dos meus passos pela casa,
E quando a solidão, tomando abrasa
Defaso-me dos dias e dos sonhos,

Anseio a liberdade que não veio,
E o tempo se transforma em vil receio
Promessa de outros tempos mais medonhos.

24932

A dor que se faz plena não se acalma
E tido como um tolo muitas vezes
Percorro a mesma estrada há tantos meses
E a vida ainda pede alguma calma,

E sendo que a verdade dita o trauma,
Vergastas pacificam estas reses
Espreito os meus momentos descorteses
Livrando deste inverno duro uma alma

À qual já se fez tanto ou nada e cismo
A cada novo dia um cataclismo
Abismos que enfrentara desde o início

E sendo assim deveras sonhador,
Somente tenho agora a me propor
As teias deste enorme precipício.

24931

E mostra, tão solene o duro inferno
A voz que não permite ser ouvida
Por todo o meu viver e após a vida
Espero ter momento alegre e terno

Deixando esmorecer o frio inverno
Aonde se permita que decida
A senda muitas vezes extraída
Da fúria deste encanto em que me interno,

E sendo assim um pródigo caminho
Vestindo de ilusão, tanto sozinho
Não posso me entregar completamente.

E quando surpreendido em treva e fogo,
Descarto a minha sorte neste jogo
E a vida novamente não desmente.

24930

Adentro nos bueiros vou ao nada,
Retorno ao habitat de onde surgira
Expondo em tal nudez, incêndio e pira
A porta há tanto tempo destravada
Espero novamente uma guinada,
Por mais que noutro canto a voz atira
A sorte desmembrando ainda fira
O velho caminheiro, na alvorada.
Assisto ao funeral de uma esperança
E quando à morte a sanha já se lança
Arquétipos de sonhos são inúteis,
Assim meus versos morrem junto a mim,
Nesta aridez imensa, o meu jardim
Entranha-se de luzes foscas, fúteis.

24929

Escarro palavrões e em derrocada
Escondo a minha adaga e o canivete
Por mais que ainda fosse algum grumete
Decifro esta borrasca inusitada
E sei que do final não tendo nada
O gosto se mistura e alma repete
A mesma ladainha que arremete
Ao tosco caminhar sem alvorada.
Nefastas e hediondas caricatas
Enquanto sem pudor tu me maltratas
Exalas o perfume putrefeito
E sendo assim talvez já não consiga
Sequer uma esperança torpe e antiga
Vivendo simplesmente deste jeito.

24927 e 24928

O rei que nunca veio foi deposto
Durante as tempestades golpe insano
E quando se fizesse sem engano
O quadro consumado assim exposto
E tudo que talvez houvesse posto
Não deixa qualquer dúvida e, profano
Aquele que já fora soberano
Agora perambula, vento em rosto.
Atravessando ruas e favelas,
Assim nosso destino também selas
Entranhas em meu corpo qual Mefisto,
E tudo o que talvez ainda queira
Não deixa nova senda, a derradeira
E após a tempestade enfim, desisto.




Contraio cada músculo do rosto
E tento preservar a minha história
Entrego ao Meu Senhor cada vitória
E sei que depois dela algum desgosto,
Vivendo sem temores sigo exposto
À sorte que produz relento e escória
Apenas não suporto mais vanglória
A vida se permite ao vão encosto.

Residualmente colho o dissabor
Aonde se fizesse algum louvor
Esboço no final a reação
Sabendo que antagônicos caminhos
Farão dos caminheiros, que sozinhos
Já sabem que jamais retornarão.

24926

Pelo terrível nada, agora eterno
Durante tantos anos naufraguei
Os sonhos em distante e fria grei
Mantendo para sempre o duro inverno,
O barco da ilusão que agora aderno
Permite se falar do que não sei,
E quando novo rumo eu entranhei
Espero a cada curva em rumo externo

Saída para as tantas desventuras
E nela com certeza novas curas
Deixando tais torturas para trás,
Assino a minha carta de alforria
E quando a realidade se desvia,
O gozo se mostrara mais mordaz.

24925

O bem de uma esperança que eu hiberno
Escreve os dissabores linha a linha,
E todo o coração se desalinha
Criando a cada dia novo inferno
E ainda que já fora outrora terno
O mundo pouco a pouco se definha
E toda esta vontade se avizinha
Do quanto outrora quis sincero eterno.
Espúrias as estradas onde sigo
O tendo tão somente o desabrigo
Não vejo uma estalagem que inda possa
Acolher os meus terríveis pesadelos,
E quando tento embalde removê-los
A vida sem perdão, inda faz troça.

24924

Aos poucos se perdeu mais indisposto
Acaso se entregando em lua cheia
A sorte muitas vezes me incendeia,
Mas logo me percebo assim exposto
Aos tantos temporais, frio e desgosto
Minha alma sem sentido assim vadeia
E teima contra a sorte, mesmo alheia
Aos medos que transbordam no meu rosto.
Descrevo os meus momentos, vida e tédio,
Não tendo mais sequer luz ou remédio,
Agouros encarando a cada tempo,
Não posso permitir outra viagem,
Apenas rememoro esta paisagem
E nela vislumbrando contratempo.

24923

No frio tão intenso deste agosto
Um invernal caminho se prepara
E tudo na verdade desampara
Causando ao caminheiro tal desgosto
E quando muitas vezes interposto
Percebo a fantasia néscia e rara
Da qual se percebendo quão amara
A vida pela qual se paga imposto
Escravo da ilusão, velho agiota
A morte se tornando o rumo e a rota
A cada dia mostra o seu final,
Ainda perecendo pouco a pouco,
Estúpido fantasma frágil, louco,
Aonde levará cada degrau?

24922

Aonde se pensara em harpa e lira
Apenas as montanhas dos descartes
Encontro meus pedaços, tantas partes
Enquanto este cantor teima e delira
Por onde se percebe cada tira
Os dentes entranhados; sonego artes
E beijo dos anseios, dos enfartes
E esgoto minha força em luz e pira.
Excluo dos meus sonhos adereços
E deixo para trás os endereços
Apesar do futuro ser inglório.
O tempo se mostrara um inimigo,
Mas mesmo contra a sorte em vão prossigo,
Sabendo do final, tão merencório.

24921

Nos parques, bosques sendas e veredas
Astuciosamente se percebe
O quão em fantasia se fez sebe
Por mais que noutras tantas enveredas,

Decrépito fantasma; não concedas
Aos sonhos desta ingênua e torpe plebe
Além do que alegria onde se embebe
Das rotas chitas pensa em finas sedas.

E assim caminha ao léu a velha corja
Enquanto a realidade já se forja
Com unhas, dentes, saltos, botes, fera.

E tendo esta impressão de ter no olhar
Além do que pudera imaginar,
Ainda a redenção, caterva espera.

24920

Em paradoxo vejo todo o inferno
Na boca que ora beijo e me despreza
A sorte se trazendo em fogo e fresa
Espanta desde sempre um vento terno
E quando se quisesse quase eterno
O sonho na verdade diz fraqueza
E tudo o que deveras mais se preza
Compraz com a tortura, e nisso interno

Os sentimentos vários em conflitos
E todos os caminhos são aflitos
A quem não se permite sonho e trama

Aquém da maravilha de uma vida
O tempo destroçado, esta saída
Já não existe mais, restando o drama.

24919

Naufrágios que carrego no meu peito,
Dizendo do talvez que jamais pude,
Aonde se pensara em juventude
O sonho se destrói e está desfeito,

O quanto não pudera satisfeito
Trazer ao meu viver outra atitude
Por mais que embalde tente ou mesmo mude
O resto do caminho em outro leito

Prepara a foz diversa deste rio
E sei que quando outrora quis e vi-o
Deitando sob o sol de um bom verão,

Naufrago o meu olhar na imensidão
E quanto mais estrelas me trarão
Somente e sem certeza um desafio.

24918

Sem ilhas, sem suporte ou direção
Vasculho este oceano e nele vejo
Aquém do que deveras foi desejo
O medo de naufrágio e solidão.
Assisto da verdade o velho não
E nele o que talvez já não prevejo
O fim de um sonho audaz que num lampejo
Causou dentro de nós a podridão.
Ascende-se à loucura enquanto teimo
Nas ânsias desta frágua já me queimo
E deixo para trás qualquer sinal
Que possa te trazer ao meu encalço
Andando pela vida, em fundo falso
Vendendo a fantasia colossal.

24917

Aguardo em minha morte, a redenção
Descrevo este vazio feito em vida
Que a própria ingratidão adormecida
Expõe vicissitudes que virão
Trazer ao fim do dia este porão
Que trama a sorte há tanto apodrecida
Uma alma sem porquês e desvalida
Encontra no seu fim a solução.
Fumando outro cigarro, tomo um trago,
E quando a solidão, amiga, afago,
A minha companheira mais fiel,
Eu sei que talvez seja meu problema,
Mas não suporto mais qualquer algema
E rasgo da esperança, último véu.

24916

E sigo dia-a-dia desse jeito
Sem nexo, sexo, paz ou mesmo glória
Não creio ser possível nova história
Porquanto em solo escuso ora me deito.
E todo o amanhecer sendo desfeito
Restando ao sonhador, escombro e escória
Não posso renovar-me na vanglória
Tampouco da alegria fazer pleito,
Uma asquerosa imagem refletida
No espelho traduzindo o que foi vida
E agora perambula pelas ruas
Enquanto ao longe passas e nem notas
Figura que venturas más, derrotas
Expõe faces medonhas, ora nuas.

24915

Escombro morto-vivo sem destino,
Adentro as madrugadas e me insiro
Bebendo da ilusão gatilho e tiro,
Do pouco que me resta, eu alucino.

Às forças mais audazes eu me inclino
E mesmo quando a luz; em paz, desfiro
A cada amanhecer bem mais me expiro
Até que no final extingue o tino.

E desça ao mais profano dos infernos,
Aonde se quisesse bens eternos
Mesquinhas emoções de um traste, um pária.

Nas súcias e catervas, minhas hordas,
E quando em mansidão ainda abordas
Irônica pantera temerária...

24914

E sangro em cada poro, me esvaindo
Devoro os meus fantasmas e me exponho
Desnudo como fosse mais bisonho
O que pensara outrora ser infindo,

Indefinível cena progredindo
Tornando o que era estúpido em medonho,
E sendo o mesmo vão quero e reponho
O tempo indescritível destruindo

Altares que criara pela vida
E a morte se aproxima e não duvida
Avança sobre os restos desta cena.

Exposto feito pálida figura
Aonde se tentasse luz e cura
Apenas o não ser inda serena.

24913

Definho enquanto o dia se aproxima
E traz manás e néctares. Falsário
Apenas um diverso e vão corsário
Que pela intensidade já se prima,

Pudesse noutro senso em alta estima
Tramar outro momento ou estuário
O gosto se mostrando às vezes vário
A cruz eu não suporto. Um paradigma.

E creio ser possível liberdade
Aonde o medo às vezes toma e invade
Deixando estes escombros mais falazes.

Serenas quando encantas com a voz
De quem se preparou mesmo que atroz
Por tanto que fizeste ou inda fazes.

24912

Até que chegue o sol, feroz, a pino.
Não posso descansar, a madrugada
Aonde a nossa sorte foi selada
Transporta vagamente e me fascino

Douraste com ternura, e alucino
A fonte há tanto tempo desprezada
Enquanto não seduz outra alvorada
A morte nos penhascos, já refino.

E quando se percebe tal domínio
Harmônico caminho diz fascínio
E dele na verdade me afastando

Esquivo-me da sorte mais audaz
E quando o rastro apenas vejo, traz
O fogo pertinaz embora brando.

24911

Não tenho nem mais força ou desatino,
Que possa permitir a caminhada
Cansado deste eterno e vago nada
Aonde se pudesse diamantino
Momento agora traça o seu destino
Vagando pela estrela destroçada
Esmero com denodo outra lufada
E o vento desde sempre descortino,
Ousando com palavras insensatas
Aonde na tortura me arrebatas
Chibatas e vergastas, lenitivos
Dos quais já não consigo me livrar
Bebendo esta emoção, ganhando o mar,
Os dias são deveras frios crivos.

24910

Nem mesmo da ilusão ora prescindo
Tampouco quero a luz em falso brilho
Se tudo o que encontrasse, empecilho
Não quero o que deveras se fez lindo

E quanto ao mar dos sonhos, tosco e infindo
Um velho navegante ou andarilho
Que sabe muito bem quando palmilho
Estrela tão esparsa reluzindo

Aonde se fizera qualquer trama
Por mais que a realidade em vão reclama
O sonho se tornou ancoradouro

Do arcaico e desdentado sonetista
E tudo o que viver já não assista
Sequer o que pensara ser tesouro.

24909

Não quero mais grilhões tampouco algemas
A voz sem ter limites solto agora
E toda esta emoção que sei se aflora
Diversa do que trazes e inda temas,
Mudando com a luz trazendo em temas
Palavras onde a fúria nos devora
Por mais que a fantasia aqui se ancora
Não vejo mais sequer velhos problemas
Extraio do vazio a luz sombria
E dela refazendo a poesia
Escondo as ambrosias e os manás,
Assisto á derrocada da emoção
E nela os meus segredos mostrarão
O quanto mesmo pouco satisfaz.

24908

Das lendas do Amazonas, a do boto
Parece que inebria quem deseja
Além de uma aventura mais sobeja
O tempo se demonstra e assim remoto

Percebo que deveras novo broto
Se faz de forma audaz e a sertaneja
Desnuda bebe a luz que ainda almeja
E todo este prazer ora denoto

Vibrando com loucuras, seus anseios,
Passeiam doces mãos pelos seus seios
E adentram maravilhas, belas grutas,

Ascende ao paraíso neste instante
E toma deste encanto inebriante,
Explodem ilusões belas e astutas.

24902 qté 24907

24902

Perdão por te amar tanto, aqui te peço
E faço deste verso luz e chama
Aonde uma esperança chega e clama,
Por mais que à própria sorte eu siga avesso.

Por te amar tanto do perdão eu necessito
E dele com certeza novo dia
Nesta alegria intensa que nos guia
O brado mais feliz, intenso grito

Gerando o que talvez pudesse ser
Um porto aonde a nau ancora e sabe
De toda a maravilha que lhe cabe
Vivendo com ternura ao bel prazer.

Por não poder conter mais o meu pranto
Vou repetir: perdão por te amar tanto.

24903


Virtudes entre cores tão diversas
A força da ilusão transfere a cor
E tudo num vazio a recompor
Vontades que deveras tu dispersas.

E quando sobre a vida ainda versas
No quase vejo o todo a se compor
Sem ter outro caminho aonde opor
Por vezes imagino vãs conversas

E delas absorvendo o inacessível
Encontro o que pensara ser incrível
A rota aonde possa ter o fim,

Vacâncias entre louros e derrotas
E quando ao fim da vida já rebrotas
As esperanças toscas vêm a mim.



24904


Não vejo uma inimiga assim tão fera
Enquanto percebera luz e vaga,
A sorte muitas vezes não afaga
Avinagrado dia nos tempera.

E quando se mostra tosca espera
A espreita do vazio mera draga
Permite o mesmo tom que ora embriaga
Palácio me transporta à tal tapera.

Eclodem vários pontos de partida
E deles não percebo se há saída
Audaz o passo segue em noite atroz.

Escusas se perdendo em pleno vento,
E mesmo que me mostre mais atento
Ninguém escutaria a minha voz.



24905


Horrendas caricatas faces toscas
Entregues ao jamais poderá ser
Não deixo de pensar e de viver
Por mais que o coração entregue às moscas.

E quando em noite fria tu me emboscas
Esgueiro-me deveras, passo a ver
Além de simplesmente o desprazer
As luzes emanadas sempre foscas,

Caminhos perfilados, quixotescos,
Os dias entre fogos gigantescos
Escondem sob as horas as virtudes

E delas mal percebes quão medonha
A treva pela qual inda componha
Por mais que ainda teimes ou ajudes.

24906


A liberdade emana estas delícias
Às quais ao me entregar em poesia
A sorte caprichosa desafia
E entrego-me ao sabor de tais sevícias
Por mais que talvez trames em carícias
O quadro se alterando dia a dia
Permite o velho ardor da fantasia
E traz das esperanças as notícias.
Pudesse ter ao menos libertário
Caminho que não fosse temerário
Seguindo sem pudores falsos, luz.
Arcando com enganos e pecados,
Os dias com certeza iluminados
Enquanto a realidade não seduz.


34907

A mãe dos dissabores e delírios
Trazendo nos seus braços, mansidão
Ao mesmo tempo os medos que virão
Tramando desde sempre estes martírios

Nos olhos o brilhar de toscos círios
E toda adversidade, imensidão
Esconde as armadilhas que farão
Canteiros embotados, cravos, lírios.

Descreve esta espiral, o tempo insano
E nele a cada passo mais me engano
Fazendo da ilusão, um mote a mais,

Pergunto se pudesse ter a sina
Deveras feita em benção cristalina
Que em vós, por muitas vezes derramais.

24901

“Muito além do jardim” existe o sonho
E nele a realidade se confunde
A luz que em plena treva assim se funde
Mudando a paisagem que componho,
Podendo ser bem vindo ou ser medonho
Caminho pelo qual quimera infunde
O gosto do prazer ou dor que inunde
Uma alma num cenário mais bisonho.

Atrevo-me a pensar em soluções
E nelas fantasias que me expões
Enquanto navegando a luz e o breu,
São tantas as vertentes, vida e morte,
Apavorante, às vezes nos conforte,
O abraço entorpecido de Morfeu.

24900

À chuva que despenca em noite vã
Eu faço uma oração e peço a paz
Que tantas vezes traz ou já desfaz
E vive a tempestade neste afã.
Promessa de algum sol noutra manhã
O vento muitas vezes pertinaz
Permite ao sonhador firme e tenaz
O mundo com nobreza em raro élan.
Pudesse ter noção do amanhecer
Anelado ao brilhante e claro sol
Tomando em farta luz todo o arrebol,
A vida não teria o escurecer
Que agora me invadindo não permite
O olhar que tem nas nuvens seu limite.

24899

Procuro em meu caminho, o velho amor
Que tanto se entregou e sonegara
A noite em luz intensa, fora clara
Agora em treva trama este pavor,

E não consigo mais reter a flor
Que a própria juventude em vão cevara
E quando mais preciso, desampara,
Negando por princípio o seu valor.

Arcaicas emoções de um velho triste,
A vida se afastando e ainda insiste
Bebendo a fonte amarga da emoção.

Vetustas fantasias entranhadas,
E as horas adentrando madrugadas,
E os raios, os meus olhos não verão.

24898

Aonde se pensara em ar gentil
Ocasos se espalhando negam sóis
E como fossem leves girassóis
As cores do passado em pleno abril,

Além do que a ilusão antes previu
As luzes invadindo os arrebóis
Percorro os arquipélagos, atóis
Mudança se vier, sinto sutil.

Acendo os meus pavios, estopins,
E tudo se transforma em duros fins
Alheio aos sofrimentos; vejo agora

Uma explosão satânica e medonha
Por onde a mesma história se reponha
No vasto que tampouco nos decora.

24890 até 24897

24890

Um deus que é tantas vezes tão medonho,
Arcaica fantasia em ar sombrio
Que ao mesmo tempo mato e até recrio
Enquanto em voz altiva recomponho
O rumo pelo qual ando tristonho
E bebo em temporal etéreo frio
No torvo amanhecer, um ar esguio
E o bêbado luar morre bisonho.
Astuciosamente a insensatez
Devora com terrível fome e gula,
Enquanto a morte chega e mesmo adula
Quem nela e só por ela se desfez
Assisto ao derrocar desta quimera
Na sôfrega ilusão que assim se esmera.


24891



Adentra o mar imenso feito em luz
O mesmo pensamento que movera
Enquanto uma esperança como a cera
Aos poucos se desmancha e isso me induz

Ao tempo aonde quis acreditar,
E sei que a poesia já se cala,
Minha alma de tua alma, uma vassala
Esboça a reação e morre ao mar.

Estrídulos diversos, ânsias loucas,
Erguendo falsos túmulos, a sorte
Sem ter sequer lugar que inda comporte
Sem dúvidas deveras me tresloucas

E trazes gargalhares que histriônicos
Transcendem em momentos desarmônicos.



24892


Jamais perceberia em quantos versos
Eu poderia ter felicidade,
E mesmo que mais alto, insano eu brade
Os dias entre dias tão diversos
Resumem o reflexo de universos
Aonde permitindo o que se invade
Gerando após o medo a tempestade
Em ventos mais profusos e dispersos.
Erguendo além do brilho do horizonte
O olhar que se permite ao que desponte
Num traiçoeiro gesto; em juventude.
Não cabe mais a sorte nem tampouco
O grito desumano ou mesmo rouco
Que a sanha desta vida, ainda mude.



24893


Retiro dos meus olhos, fúria e trava
E delas faço a ti raro jantar
Servindo de bandeja a fome e a clava
Adentro sem pensar o imenso mar,

Salgando a tempestade que nos lava
Escondo em minhas mãos raio e luar
Vulcânica expressão em fogo e lava
Tomando este cenário, devagar.

Ainda não consigo ver após
O que será enfim, então de nós
E atendo aos meus anseios mais vorazes.

Não quero adivinhar dia futuro
Se assim, ensandecido inda perduro
Procuro pelas ânsias que ora trazes.



24894

Nefasta imagem trago do passado
Antevendo afinal, o quão possível
Viver a fantasia, este desnível
Por vezes sem temores, livre brado,

E quando se demonstra este ansiado
Momento em que tornara bem mais crível
O mundo imaginário incorruptível
Infelizmente noutros desmembrado,

Ao perecer inútil fantasia
O quanto se tentara e se esvazia
Assola-me sem paz, a realidade.

E quanto mais procuro e nada vejo,
Audácia se mostrando em ar sobejo
Traduz ao fim de tudo esta ansiedade.


24895

Minha alma desfilando assim sozinha
Sem ter sequer a paz que necessita
A vida que desejo ora maldita
Traduz a solidão que se adivinha

Nas ânsias do viver, ela se aninha
Nos antros mais vorazes e palpita
Destroça qualquer sonho de pepita
E torna a minha senda mais daninha.

Esgarço em tempestade esta ilusão
E traço as desventuras que virão
Numa ânsia sem parâmetro e mergulho

Nas vagas deste insano temporal
E o riso que pensara triunfal
Traduz ora somente um torpe orgulho.


24896


Porquanto um caminheiro amargo e triste
Seguindo cada passo deste nada
A sorte muitas vezes destinada
A quem na caminhada já persiste
Demonstra este vazio que inda insiste
Tornando mais difícil minha estada
E o quase se transborda e desarmada
Uma alma tão ferida, enfim desiste.
Nefasta madrugada, noite fria
Aonde procurar a poesia
Se a vida assim sonega qualquer chance,
E mesmo que se entregue nada vindo
O quanto se deseja belo e infindo
Não tendo quase nada ao fim se lance.



24897



Ecoam dentro em mim vozes dispersas
Falando do que um dia quis em paz
E enquanto fosse à vida pertinaz
As horas em carinho e luz imersas,

Mas tudo não passara de conversas
E o canto se mostrando então mordaz
Herege paisagem que se faz
Diversa da que ainda em sonhos versas.

Escuto em tédio imenso a ladainha
Que aos poucos sem remédio se adivinha
E traz nos mesmos moldes, riso e pranto,

E tudo o que talvez ainda queira
Explode além da fúria costumeira
E indiferente a tudo, ainda canto.

24889

Um deus que é tantas vezes tão medonho,
Arcaica fantasia em ar sombrio
Que ao mesmo tempo mato e até recrio
Enquanto em voz altiva recomponho
O rumo pelo qual ando tristonho
E bebo em temporal etéreo frio
No torvo amanhecer, um ar esguio
E o bêbado luar morre bisonho.
Astuciosamente a insensatez
Devora com terrível fome e gula,
Enquanto a morte chega e mesmo adula
Quem nela e só por ela se desfez
Assisto ao derrocar desta quimera
Na sôfrega ilusão que assim se esmera.

24888

Nem mesmo da ilusão ainda tenho
Prazer em perceber qualquer fagulha,
E tanto do prazer já não se orgulha
Quem teve pela vida algum empenho,

Aromas mais diversos não contenho
E teimo contra o frio, encaro a agulha
E sem fazer tormento, sequer bulha
No quanto sem vigor eu fecho o cenho

Ao empunhar a glória, falsa espada
Aonde se pudesse iluminada
A tenda originária, fim e meio.

Atrelo-me aos vagões e descarrilo
O gozo perpetua vago estilo
E nele sem pensar eu me norteio.

24887

Minha alma de meu corpo vai saindo
E quando me procuro e não me atrevo
Aonde se pudesse ser longevo
A sorte procurada; eu não deslindo
O amor que se buscara quase infindo
O gosto do passado sorte e trevo
Percorro este vazio que ora cevo
E o tempo devagar vai progredindo

Num cíclico prazer de vida e morte
Sem ter sequer um porto que comporte
A eterna variedade em luzes feita.
Ascendo ao temporal e nele, serva,
Uma alma que daninha, expõe tal erva
Da qual se quis um dia, mais perfeita.

24886

E volto em redenção a ser menino
Após tantos momentos dor e tédio,
O amor que imaginara um bom remédio
Do qual e pelo qual me determino

Aonde se pensara dobra o sino
E a morte novamente em seu assédio
Destrói de uma esperança base e prédio,
E o tempo sem controle não domino.

Astuciosamente a vida passa
Entranha-me nos olhos a fumaça
E os carros me trazendo à realidade.

Aonde quis a paz de um tempo manso,
Contemporaneamente agora alcanço
Somente este senão que corta e invade.

24866 até 24885

24866


Não tendo nem saudade, o que vier
Trará alguma paz e dela vejo
Momento mais feliz ou benfazejo,
Albergando a esperança em novo affaire.
Elevo-me e percorro cordilheiras
Andinas ilusões, quedas imensas
Ainda irei manter as velhas crenças
E delas as palavras corriqueiras,
Antevisão de tempos mais ferozes
E deles preparando o meu final,
Aonde se quisera triunfal
Escuto do passado estranhas vozes,
E quando a realidade se agiganta
O grito; eu sinto preso na garganta.




24867


Já sabe distinguir alho e bugalho
Quem tanto procurara a luz mais terna
E sendo que em meu peito ainda inverna
A cada novo passo me atrapalho,
Mas tudo se repete e não reflete
Os erros mais comuns, medo e vingança
Aonde uma esperança em vão balança
Herança de outras eras pinta o sete,
Eclodem das crisálidas fantoches
Escusas criaturas que disformes,
Às vezes decompostas ou enormes
Permitem que dos passos tu deboches
E traces outra cena mais suave
Sem ter sequer a angústia que isto agrave.


24868

Impede que perceba claridade
À sombra inevitável da neblina
Herética figura que alucina
Enquanto o nunca ser ou ter invade.
Esqueço a poesia ou mesmo a prosa
E deito sob as névoas onde trazes
Olhares mais serenos ou mordazes,
E a sorte se mostrando caprichosa
Explana sobre o tema dor e vida
O quarto de dormir, abandonado,
À beira deste abismo o tosco Fado
Aonde minha história se decida,
Descanso o meu olhar sobre o vazio
Que mesmo espuriamente eu desafio.



24869


Rajando pelos céus, a tempestade
Que sei ser quase sempre tão cruel,
Assim ao desfiar meu carretel
Por mais que insanamente ainda brade

Não tendo outra saída que me aguarde
Escravo do passado, eu sinto o açoite
Por tanto que deveras não me acoite
Sabendo que esperança chegou tarde

Não vejo mais o brilho, nem desejo
Escracho caminhar de um tolo ator,
E mesmo que pudesse recompor
Estrada mais diversa em ar sobejo,

Vagando por estrelas o infinito
Expressa esta ilusão e em vão eu grito.




24870

Aonde não chegasse este rumor
Da torpe humanidade que se entranha
Por todos os caminhos, céu, montanha
E destruindo aos poucos, sem louvor

Destroça o que se fez com tanto amor,
E a vida que pensara, outrora ganha
Definha-se deveras noutra sanha
Contrariando ao Pai, o Criador.

Perdoe se meu verso não encanta;
A fúria deste ser se mostra tanta
E a ela não resiste eternidade

E enquanto a realidade nos degrade
Pudesse ter aqui em minhas mãos
O fruto da esperança em belos grãos.




24871


“Possa escutar dos anjos” os seus cantos
E ter a consciência de um futuro
No qual e pelo qual inda procuro
Em meio aos descaminhos, fartos, tantos,

E sendo tão comuns os desencantos
Nas teias do vazio eu me penduro
E tendo o meu olhar ausente e escuro
Expresso no não ter velhos quebrantos.

Escusos andarilhos, noite suja
Por mais que deste vão uma alma fuja
O tempo sonegando a paz mais terna

Das aversões diversas, os verões
Que a cada amanhecer já não expões
Traduzem a esperança que ora hiberna.


Citação de Machado de Assis



25872

“Lá onde a alma do vate” se perplexa
Ao ver tanta beleza desfilando
O dia que sonhara bem mais brando
A sorte se encaixando, mais complexa

Permite acreditar na dor anexa
Que tantas vezes creio me guiando,
Aonde se mostrara tanto e quando
E o tempo ao grande amor assim se indexa.

Descrevo a cada verso um claro alento
E por viver do sonho eu me atormento
Enquanto me apascento em voz macia,

A senda que desvendo não traduz
Realidade tosca em fogo e obus,
Mas dela uma esperança me inebria...

CITAÇÃO DE MACHADO DE ASSIS.




24873

“Ah! mas então será mais alto ainda;”
Esplêndida paisagem, cordilheira
Aonde esta ventura corriqueira
Aos poucos me transforma e se deslinda,

Vestindo a tênue glória a luz infinda
Por mais que a realidade isto não queira,
Andando em precipício, vejo à beira
Do tanto que imagino e já não finda

Eqüidistante sorte: vida e fim,
Perpetuando em sonhos dentro em mim
Assíduas borboletas das crisálidas

E larvas; preparando a liberdade
Que agora como um etéreo som que brade
Falena libertária que assim brade.

Citação de Machado de Assis.


34874

“Ventura, o amor e a paz” são dividendos
Herdados pós batalhas insensatas
Ao mesmo tempo entranhas e desatas
Os dias em momentos vãos e horrendos,

Expondo estes retratos frente á luz
Aspectos mais diversos desta vida
Que enquanto nos prepara uma guarida
Transforma falso brilho que reluz

Num último bastião que se permite
Emoldurada tela em tons diversos
E dela a insensatez de tolos versos
Buscando ao fim de tudo algum limite

Que possa inda moldar este sorriso,
Embora de soslaio ou impreciso.

CITAÇÃO DE MACHADO DE ASSIS.



24875


Glória da Natureza, riso e pranto
Belezas entre farsas e loucuras
Aquém do que na fé inda emolduras
O medo se transforma e me agiganto
No tanto permitido luz e canto,
Aonde se preparam nossas curas
Por vezes ensimesmas e murmuras
Enquanto com firmeza me levanto
E traço sobre as pedras, marcas fartas
Os gozos mais audazes tu descartas
E deixas como herança a turva espera.
Das fráguas o calor de alguns segundos
Catervas de delírios vagabundos
E a mansidão terrível de uma fera.


24876


O deserto nas urzes sem oásis
Angustiadamente me desfaço
E tramo sem ternura o mesmo passo
Diverso dos enleios que me trazes,
Apenas devaneios, toscas fases
O mesmo a ingratidão sonega o abraço
E quando me percebo sem espaço,
A casa se abalando, podres bases.
Dos antros e catervas, são afins
Os claros temporais, medos chupins
Sorvendo sanguinários; alegrias
E delas agonias traduzidas
Explodem em angústia nossas vidas
Que em vão por tantas vezes concebias.



24877



Nas vagas deste mar tempestuoso
Encontro um tenso abrigo, praia e areia
E quando a fome invade e banqueteia
Com toda a minha força, belicoso

Anseio muito além de simples gozo,
A sorte caprichosa se bandeia
E deixa sobre o mar sem lua cheia
Um ar fátuo, terrível, desairoso.

Mesclando ar e tormenta; eu fantasio
Cenário que se mostre mais sombrio,
Mas mesmo assim caminho contra o vento

Permanecendo imerso em tal ocaso,
Por vezes da verdade eu me defaso,
E mesmo em calmaria me atormento.


24878

“Porém minh’alma triste e sem um sonho”
Jamais se encontraria em plena paz
Se tudo o que faria não compraz
Tampouco o que deveras vão componho.
Se o todo numa parte recomponho
E o beijo se mostrara mais mordaz,
Porque, se nunca fui pleno e capaz
O mar onde me espelho é tão medonho.

Elejo dentre todos os infaustos,
Além dos meros ritos e holocaustos
Aquele que inda possa traduzir

Alguma luz após o temporal,
E mesmo que isto seja um ritual,
É nele que inda espero algum porvir.


CITAÇÃO DE FAGUNDES VARELLA



24879

“Murmuro, olhando o prado, o rio, a espuma”
Bem antes que se nuble o céu e arisco
O tempo perpetua cada risco
Enquanto a fantasia em vão se esfuma,

Aonde poderia ter alguma
Vontade de sonhar, já não me arrisco;
Na flórea maravilha de um hibisco
O olhar para o infinito então se ruma.

Traduzo neste rio as minhas mágoas
E quando mergulhando em calmas águas
Espero pelo menos lenitivo,

E sinto que inda resta uma esperança
Enquanto a minha alma assim se lança
Das ânsias e desejos tantos, vivo.

CITAÇÃO DE FAGUNDES VARELLA


24880


“O flóreo bafo que o sertão perfuma”
Expressando esta senda à qual me entrego
E a voz em maciez agora emprego
Tocando a mansidão que esconde a bruma.

Arestas apontadas deixam claro
Que tudo poderia ser melhor,
Mas quando se percebe bem maior
O encanto para o qual eu me preparo

Ao ancorar meu sonho em belo prado,
As dúvidas fenecem, reconheço
Que além de qualquer forma de tropeço
Mantenho cada dia ensolarado

Olhando o raro brilho deste céu,
Usando para tanto este cinzel.


CITAÇÃO DE FAGUNDES VARELLA


24881

“Uma mulher completamente nua”
Exposta em galerias, desejada
O quanto deste todo trama o nada
E a vida, normalmente, continua.

A velha prostituta em cada rua.
Prazer feito bandeira desfraldada
A sorte tantas vezes desgraçada
Enquanto a tosca atriz, fingindo atua,

Hedônicos fantasmas, inocentes,
Ou sátiros ateus, incréus ou crentes
Saciam-se na fonte apodrecida

O Pai, silencioso vê tal cena
Revejo ali Maria Madalena,
Milênios se passaram? Mesma vida...


CITAÇÃO DE AUGUSTO DOS ANJOS

24882

Apenas negritude, espessa treva
Adentrando os umbrais em noite escura
Imensa solidão nos emoldura
E a vida só tristezas inda leva

Perenes ilusões? Frágil cenário
E nele restituo velhas cismas,
Enquanto novamente tu me abismas
O tempo este terrível adversário

Não deixa qualquer dúvida e transporta
O sonho para além onde não posso
Saber se existe luz e assim esboço
A reação estúpida, vã, torta

Mas tudo o que me resta; então me calo,
Da noite tempestade, fúria e abalo.



24883

Balões riscando o céu não mais decoram
As noites onde eu quis verso e magia,
E apenas solidão agora guia
Os tempos em que os medos já se afloram,

Se os barcos noutras ilhas não ancoram
O tempo se transforma em agonia
A estrela preferida se perdia
Enquanto as esperanças se demoram.

Arbustos se tornando quais ciprestes
E quando em teu olhar tu me arremetes
À tosca imensidão deste oceano

O caos se aproximando e até quem sabe,
O todo neste pouco já se acabe
E enquanto me procuro em vão me dano.



24884

Brincando com estrelas que não vejo
Há tanto se espairecem em noite fria
A porta que deveras não se abria
Traduz destinos vários do desejo

Ao qual o coração de um sertanejo
Bebendo do luar em poesia,
Transforma o que talvez tanto queria
No quadro divinal aonde almejo

O brilho redentor feito a criança
Que à vida sem perguntas já se lança
Medonhos temporais? Enfrenta em paz.

Porquanto ser feliz é ter nas mãos
Certezas que permitem sins e nãos
Que apenas a verdade assim nos traz.



24885

Sonhando com diversas maravilhas
Brincar de ser feliz é o que mais quero
Enquanto o mundo vejo amargo e fero
Diverso da ilusão que ainda trilhas,

Por mais que na verdade as armadilhas
Demonstram o final no qual tempero
A sorte do viver, audaz e austero,
E nele com certeza, agora brilhas.

Serenas as manhãs com maciez,
E sei do quanto a vida já nos fez
Trazendo raro encanto a quem se quis.

Depois de tantos medos, desenganos,
A vida já nos traz diversos planos
E deles a certeza: ser feliz!

24865

Trará tanta agonia em fria leva
As ânsias de um viver que se completa
Nas dores da ferida mais concreta
Tramando invés de luz, terror e treva.

Apego-me aos valores mais insanos,
E faço do profano um sacro altar,
Aonde poderia mergulhar
Não tenho mais remédio, mato os planos

E sigo á revelia; perco o porto
E quando não concebo solução
Arrulhos pacifistas me trarão
Olhar mesmo perdido, quase absorto

Forjando uma saída mais honrosa
Por mais que a sorte, a vida amara glosa.

24864

Não há capacidade que descreva
O tanto que se perde em falsa luz,
Ascendo muito além da minha cruz
E mesmo em caminhada mais longeva.

Adestro-me e percebo que talvez
Ainda possa ser além do vago
O quanto me percebo e não afago
O vento que deveras se desfez,

A ansiedade toma cada espaço
Aonde outrora havia uma esperança
Medonha realidade já me lança
E dela este porvir vazio eu traço

Mas sei que no final, o picadeiro
Será meu palco eterno, o derradeiro.

24863

O quanto que fui rude e sou qualquer,
Aquém da majestade onde queria
Poder me extasiar nesta ambrosia,
Banquete se fazendo sem talher,

Descrevo com astúcia o nada ser
E quando me esquivando da verdade
A fúria do vazio ora me invade
Depois de tanto tempo sem saber

Vencer os mais terríveis inimigos
Cultivo pelo qual já me atormento,
Não cabe lenitivo nem alento,
Olhares mais audazes ou amigos

Não servem para quem se fez do nada,
E trama em nuvens fartas, a alvorada.

24862

Joguete das paixões, o que eu quiser
Jamais se mostrará em plenitude,
E mesmo que deveras já se mude
O rosto amargurado da mulher

Transmite este vazio dentro da alma
Arquétipo de um tempo mais feliz,
Se a sorte contra-ataca ou contradiz
Nem mesmo a fantasia mais me acalma.

Escravo das palavras e do sonho,
Não posso nem pretendo mais sabê-lo
Prazer que se tornando um pesadelo,
Aos poucos me entranhando, nele enfronho

Os víveres de um tosco saltimbanco
Que do vazio, o nada, eu alavanco.

24861

Só mostra o quanto em dor a vida neva
A frase emoldurada na janela
Ao mesmo tempo diz do medo e vela
Deslinda num instante aborto e ceva,

Vagasse por momentos mais felizes
Talvez ainda visse a claridade,
Mas tendo a realidade que degrade
Diversa da esperança; já desdizes

As lendas de um amor insano e raro,
O peso do viver agora enverga
E a dor do nunca ser, minha alma alberga
E o fim desta existência em vão; declaro

Usando o que me resta, a poesia,
Que este decrépito canalha guia.

24860

A vida se passando em tal marasmo
Perenes ilusões? Já não as tenho
E sendo a liberdade o meu empenho
Não posso prosseguir vazio ou pasmo.

Descrevo caricata garatuja
Que enquanto quis a sorte que não veio,
A morte a cada instante mais anseio,
Embora da verdade às vezes fuja

Buscando algum refúgio noutras sendas,
E sei o quão inútil atitude
Por mais que o tempo esqueça ou mesmo mude
Nos sonhos e nas ânsias que desvendas

Explícito fantoche que, medonho
Aos poucos sem defesa em vão, me exponho.

24859

Sorriso que recebo? De sarcasmo,
Mas mesmo assim melhor que a cusparada
Que há tanto traduzira a minha estada
Num único momento, este marasmo.

E; pasmem, já não vejo solução
Tampouco necessito algum alento,
Se mesmo em calmaria me atormento,
Preparo as dores tantas que virão.

Não tendo no infinito qualquer crença
Apenas perambulo sobre a Terra
Minha alma trancafia a porta e encerra
Gerando uma discórdia, e a desavença

Em verdade estampando esta faceta
Que ao suicídio, aos poucos me arremeta.

24858

Descrevo em cada verso o meu retrato
Relevos entre os vales que vivi,
E neles sem surpresa eu percebi
A imagem de um canalha e caricato.
Às cordas que me trazem sonhos, ato
E vejo envilecido desde aqui
Angustiosamente ora eu me vi
Mesquinha imagem tosca em desacato.
Descrevendo-me assim, vulgo e medonho
Assisto enquanto aos poucos decomponho
A imagem que eu criara, falsamente.
Esdrúxula e venal fotografia
Que a realidade expõe vital sangria
E a consciência plena não desmente.

24857

Habito os subterrâneos da cidade
Penetrando bueiros da existência
Aonde não encontro resistência
Talvez possa viver tranqüilidade.
Um asqueroso ser em liberdade,
A morte se tornando uma iminência
Do reino dos esgotos, eminência
Figura que decerto não agrade;
Mas luto pela tal sobrevivência
E tendo deste fato consciência
Não temo mais algemas, rompo a grade
Irrompo dos mais pútridos lugares
E quando meramente me notares
Especular retrato da verdade.