sexta-feira, setembro 01, 2006

Velhice

Juventude perdida como dói,
Maltrata cada dia, sem ter pena,
A distância cruel, de longe acena.
A memória sedenta, se corrói...

Fui feliz não sabia, se destrói
O pensamento busca a velha cena,
Procuro te encontrar, mas a safena
Implantada no peito, como sói

Acontecer, remete ao velho enfarte,
Medo sutil da morte, m’apavora...
Tentando ser feliz, vou até Marte;

Mas quem me espera, cínico catarro,
Que por mais que eu fugisse disso agora;
A velhice emergente tira um sarro...

Fui andando para o norte

Fui andando para o norte
Procurando o meu caminho,
Dei azar, nunca dei sorte,
Por isso estou tão sozinho,
Nas curvas do bem querer,
Eu me perdi de você...

Não quero saber mais nada,
Tenho minhas mãos cansadas,
Mulher, quanto mais amada,
Mais duras, as nossas estradas...
Quero saber de seu colo,
Lhe deitar, mansa, no solo...

Tenho calos nos meus pés,
De tanto que caminhei,
Fui em frente, de viés,
Meu caminho eu já errei...
Mas não passo de idiota,
Perdendo meu rumo e rota...

Vi nas travas do destino,
O olhar dessa quimera,
Meu amor é de menino,
Mas ela é uma pantera.
Tenho sede, um copo dágua...
Para aplacar minha mágoa.

Sei que não teria cento,
Por isso quis a dezena,
Meu amor o seu assento,
Com jeitinho, me envenena.
Quis ter beijo da mulata,
Seu ciúme me maltrata...

Nas bugigangas da vida,
Encontrei o seu retrato,
Minha dor na despedida,
Coração pagando o pato...
Vem pra casa meu amor...
Faz frio quero calor.

Batendo o queixo de frio,
Procurei por meu amor,
Coração bate vazio,
Esperando o cobertor...
Vem pra cá minha menina,
Coração bate em surdina...

No gole desse conhaque,
Vou acabar meu enredo,
Meu amor não é de araque
Sem você, vivo com medo...
Medo de ter solidão,
Sem você não vivo não...

Meu sapato já furou,
Minha calça está rasgada.
Seu amor foi que ficou,
Sem você não tenho nada,
Vi a curva desse vento,
No meio d’esquecimento...

Fui pescar lá no riacho,
Uma sereia peguei,
Bananeira já deu cacho,
Todo menino é um rei...
Quis saber de sua boca,
Acabou, dormi de touca...

Usei isca de primeira,
Pra pegar peixe mulher,
Mas caí, tomei rasteira,
Agora, ninguém me quer...
Não sei mais falar bonito,
Tanto sofro quanto grito...

Joguei rede pra pescar,
Agarrou no meio fio,
Quando a noite é de luar,
Coração bate de frio...
Nas curvas dessa saudade,
Eu só encontrei maldade...

Vou buscar um curativo,
Pra curar minha ferida,
Amorzinho, fica ativo,
Seu amor nem Deus duvida,
Amor bicho interesseiro,
Procura outro travesseiro...

Fiz a cama no terraço,
Esperando pela lua,
Meu amor me deu cansaço,
Minha luta continua...
Procurando por Maria,
Encontrei quem não queria...

Vendo espaço lá no céu,
Quem quiser pode comprar,
Deixa levantar o véu,
Espera o que vou mostrar...
De carroça capotei,
Duas pernas eu quebrei...

Procurei a minha chave,
Não achei nem fechadura,
Ciúme é como um entrave,
Tem gente que não atura...
Quero o gosto da maçã,
O perfume d’hortelã...

Minhas dores são do parto,
Meus amores são de fé,
Vou lhe propor mais um trato
Acho que esse vai dar pé,
Você canta seu bolero,
Eu imito o quero quero...

Quis um beijo me negou
Quis carinho, não me deu,
Andando por onde vou,
Não vai nem ela nem eu...
Meu amor me disse não,
Acabou todo meu chão...

Vou terminar essa joça,
Não tenho mais paciência,
Vou me deitar na palhoça,
O resto é coincidência...
Fiz um verso pra você,
Mas você não quis nem ler...

Nas guimbas dos cigarros que fumei

Nas guimbas dos cigarros que fumei,
A marca do batom que lá deixaste,
É parte do que temo, no contraste
Do que sou e pensava, mas errei...

Teus lábios tão vermelhos que provei,
São como a fantasia que queimaste,
Deixando tão somente, um simples traste.
No lugar de quem ousa ser teu rei...

Vieste, no calor dessa batalha,
Onde fomos unidos nada existe...
A boca transportando essa navalha

Decepa o que já tive d’ilusão...
Teimoso, meu amor então resiste,
Enquanto me restar um coração!

Pantera

Bicho preguiça, quero só teu colo,
Deitado no remanso, curva do rio...
Conhecer teu amor, de pólo a pólo...
Deixar meu coração bater vadio...

Quando estirada estás, no mesmo solo,
Vagabundo procuro, quero o fio
Que me possa prender, dentes amolo
Pronto para morder, quero teu cio...

A pantera cruel, de firmes garras,
Cravando no meu peito, as suas presas.
Nas suas serenatas, as guitarras

Deliciosamente dissonantes,
Refletem teu gemido. Vão acesas
As luzes que refletes, ofuscantes...

Pedágio

Quando pensas fingir, sei do teu jogo...
Disfarças não enganas quem conhece
Teus beijos, alegria duma prece.
Quando finjo temer, peço, num rogo

Que perdoes meus erros, queima o fogo
Ardendo meus sentidos, ator cresce
Nos engodos, mentiras, como houvesse,
Realmente tristezas. Como o sorgo

Cultivo tais mentira, que me dizes.
Nos meus portos, procuro por veleiros,
Mas, insana, por vezes, contradizes

O que sempre parece meu naufrágio,
Mas, no fundo, jamais são verdadeiros.
Mas compensa pagar esse pedágio...

Nudez

Eu vou me expondo assim, num só soneto,
Deixando sangrar cada poro meu;
Mostrando minha face, quis ateu
Mas nada sei, nem sonhos mais prometo.

Voltando ao meu passado, me remeto
Ao princípio da noite, mas morreu
O que foram as trevas, sinto o breu
Tomando cada crime que cometo...

Asmático sentido, me sufoca...
Acendo incensos, alma fica quieta,
Procura renascer da própria toca...

Mas quem sabe meu pálido caminho,
Que se disfarça, a mesa vai completa,
Posta sobre toalhas, branco linho...

Minha vida passando num segundo...

Minha vida passando num segundo,
Traz na tela cinema e fantasia.
Quem me dera morrer por mais um dia,
E ressurgir, nos braços do teu mundo...

Meu coração vagando, vagabundo...
Um cais de porto, tempo, ventania.
Quero poder sangrar, na nossa orgia.
De tantos sentimentos, vou, me inundo...

Minha vida, recebo teu bafejo;
Desde que sei, fugaz enquanto tempo...
Nas alfazemas, lírios, percevejo...

No resto da cantiga não sei mimo.
No resto do meu tempo, contratempo,
Com certeza, quem amo, sempre rimo...

Você aqui comigo..

Você aqui comigo, trouxe vida.
Guardei aquele beijo no meu mar...
Me diga agora então, onde encontrar
O beijo que foi dado, despedida...

Sem você, vou morrendo na partida,
Que farei, meu amor, não sei nadar;
Se soubesse então, como irei roubar?
Netuno, com certeza não vai dar

A pérola mais cara que ele viu,
O beijo mais suave da sereia,
Perto do seu é vulgo, quase vil...

Tanto tormento, dores são marinas...
Depois de tanto sonho, nessa areia,
Morrer, nas mãos amadas, assassinas!

Meu Senhor

Meu Senhor, me perdoe se não posso
Ter minhas mãos tão limpas quanto quero.
Perdi meu tempo, busco amor sincero,
Muitas vezes, percebo, quase roço,

Outras tantas, procuro pelo Vosso
Amor, mas não prossigo. Sei tão fero
Quem me propôs viver, quem dera, vero
Sentimento que, nunca mais endosso...

Nos meus caminhos, tortos e sem nexo,
Busco as mudas gentis dos sentimentos.
Tantas noites, amor dizia sexo...

Agora mais cansado, nada busco.
Eu nem sei de torturas, nem lamentos...
Só sei que na luz, teimo ser tão fusco...

Tua beleza, crime sem castigo

Tua beleza, crime sem castigo,
Me fascina qual fora meu pecado;
Quero viver somente um doce fado,
Poder estar pra sempre, no perigo

Que representa amar, viver contigo;
Cada momento assim, desesperado,
Esperando poder ter encontrado,
Enfim, para essas dores, meu abrigo...

Mas, tantas vezes, foges, sem por que...
Na tua fuga, busco por meus olhos;
Em vão, pois os carregas, tento ver

Mas não enxergarei nem mais um brilho,
A vida aproximando-se, seus molhos
Carrega pelos campos onde trilho...

Quando nada mais disso me restar

Quando nada mais disso me restar,
Seguindo no deserto dos sentidos;
Não sobrar nem sequer os meus olvidos.
Quero poder morrer em denso mar,

Na certeza cruel de não vagar,
Nem por onde andaria, nos relidos
Momentos infelizes, são perdidos
Meus olhos, procurando seu olhar.

O meu caminho, a esmo, sem futuro,
Busco na manhã, cega, sem você.
Não lhe encontro, senão no triste muro

Da solidão, guardado nos meus medos,
Como poderei, livro que se lê,
Simplesmente vazio, sem segredos...

Não quero mais conter tal tempestade

Não quero mais conter tal tempestade.
Recebendo das flores seu perfume...
Vou perseguindo estrelas, vaga-lume,
Quem sabe então, terei felicidade...

Fechando tantos bares, na cidade,
Bebendo muito além que de costume,
Sussurro tão somente esse queixume.
Busquei em meio a sonhos, qualidade...

Não encontrei talvez, nenhum resquício,
D’outra coisa qualquer, senão meu vício.
A cabeça rodando, traz respostas...

Minha vida passando, as mãos impostas
Vou sentindo essas garras, minhas costas
Marcadas pelas garras, precipício...

Sou cornudo mas sou feliz...

Quero a vida bem de manso,
Nunca quero me estressar.
Na cadeira de balanço,
Vivo de papo pro ar .
Quando chove mato a sede,
Deitado na minha rede...

Pingo d’água na goteira,
Não deixou meu bem dormir,
De segunda a sexta feira,
Meu amor, estou aqui.
No sábado e no domingo,
Desse amor quero respingo.

Coisa chata é trabalhar ,
Já dizia meu avô;
Andando de lá pra cá,
Faço o que meu vô falou;
Trabalho cansa demais,
No trabalho perco a paz...

Aprendi somente rima,
Eu nem sei tocar viola.
Minha vida vale a prima,
Mesmo fugido da escola,
Aprendi fazer meu verso,
Olhando para o universo...

Já viu que coisa bonita,
É a flor na primavera.
Bela moça, laço, fita,
Fosse minha, quem me dera...
Mas quê que eu posso fazer?
Só tenho amor pra viver...

Chove chuva pequenina,
Vem molhar o meu chapéu,
A chuva trouxe a menina,
O castigo vem do céu...
Gostei tanto dessa moça,
De chorar, fiz uma poça...

A porta do tempo bate,
Vento batendo na porta.
Amor azul e escarlate,
Teu amor é que me importa...
Arco íris cobre tudo,
Sem teu amor, fico mudo...

Mas não posso ter segredo,
Nem posso falar a verdade.
Tal amor foi meu enredo,
Resultou felicidade.
Quero saber de teu beijo,
Onde está nosso desejo?

Eleição tem nesse ano,
Eu já tenho candidato.
Na terra do desengano,
Eu não vou pagar o pato.
Você governa meu peito,
O seu amor tá eleito...

Vinha na curva do rio,
Quando na margem avistei,
Chamei para o desafio,
Na sua terra fui rei.
A vida andando tão boa,
Nos braços dessa coroa...

Na montanha dos prazeres,
Meu amor encontro fé,
Na placa tem os dizeres,
Minha casa é de sapé.
Tem a moeda dois lados,
Nossos casos separados...

Vim de tarde sem magia,
Procurei por Madalena,
Encontrei só a Maria,
Sem amores, sem ter pena...
Veneno de jararaca,
Se for ela, a vida empaca...

Fui levar o meu amor,
No cinema, prá ver fita.
Nem bem ela lá chegou,
Quis tomar uma birita.
Moça pinguça de fato,
O filme acabou no mato...

Depois dessa choradeira,
De neném no meu ouvido.
Acabou-se a brincadeira,
A vida perdeu sentido,
Todo dia bem cedinho,
Me levanto sem carinho...

A coisa tá diferente,
Já não tenho mais sossego,
Todo dia no batente,
Tenho que estar lá n’emprego...
Patrão é coisa do demo,
Levando o barco com remo...

Cineminha sem vergonha,
Acabou com minha paz.
‘Tô parecendo um pamonha,
Ninguém me conhece mais...
De tarde já ‘tô cansado,
Levando vida de gado...

A cachaça é que tem sido,
Minha leal companheira.
Só ela me dá ouvido,
O resto todo é besteira.
Bebo sim, e bebo tudo,
Nada falo, fico mudo...

A danada da mulher,
Fica em casa o dia todo.
Faz tudo o que bem quer,
Não anda, criando lodo...
Me restou só essa pinga,
Mas um dia, a gente vinga...

Me mandaram um recado,
Pro trabalho seu doutor.
Tinha um cabra bem safado,
Debaixo do cobertor.
Agora virei chifrudo.
É bom que acabo com tudo...

Tão os dois aqui do lado,
Veja que coisa bonita.
Ela nua ele pelado,
Olha a cara da maldita.
Eu é que fiquei feliz,
Tome essa meretriz...

Seu delegado desculpe,
Não quero mais complicar.
Por favor não mais me culpe,
Nunca mais vou trabalhar...
Eu já pedi demissão,
Libertei meu coração!

Sextilhas Seu moço me licença

Seu moço me dê licença,
Vou contar para você,
A vida traz recompensa,
Já não quero mais morrer,
Quero o gosto da partida,
Tudo de bom nessa vida;

Não deixa nem um sinal,
No ranço dessa saudade,
Corro meu canavial,
Vou voltar para a cidade,
Nas ondas do rio mar,
Sem ter hora pra voltar...

Quero o desejo da moça,
Na boca que tanto quis,
Não me interessa essa poça,
Eu só quero ser feliz...
Tenho duas mãos cansadas,
Nas carícias, bem treinadas...

Tenho os pés para pular,
Nas mantiqueiras da vida,
Nem preciso mais voar,
Trago dor já bem curtida,
No couro que Deus me deu,
Quem sabe de mim, sou eu...

Quis ver a banda passar,
Cantando coisa d’amor,
Meu amor deixei por lá,
Chora um peito sofredor,
Pelas bandas do sertão,
Eu deixei meu coração...

Nosso amor que eu não esqueço,
E também teve valia,
Tanta dor que não mereço,
Dói de noite, dói de dia.
Mas agora vou de lado,
Esqueci do teu recado...

Tudo em volta era tristeza,
Eu deixei tudo pra trás,
Agora busquei beleza,
Agora eu só quero paz...
Já não quero mais a morte,
Encontrei saúde e sorte...

Nos braços dessa morena,
Foi a minha solução,
Amor demais me dá pena,
Bate firme coração...
No canto da sabiá,
Meu coração bate lá...

Fiz um verso pra Maria,
Joana quem quis ouvir,
Meu amor, bem que queria,
Meu amor eu bem te vi...
Mas não quero mais mentira,
Nem amarras nem embira...

Caprichoso e nordestino,
Fui seguindo meu caminho,
No meu mundo, meu destino,
Antes só que ser sozinho,
Tenho o canto do tié,
Eu canto, canta você...

Já podeis da terra, filho...
Lembrar dessa cigana,
Da vida sei estribilho,
Ela nunca mais me engana...
Sorte cigana cruel,
Muito amargo, traz o mel...

Eu plantei o meu roçado,
Deu formiga comeu tudo,
Nem fiquei preocupado,
Entrou calado sai mudo...
Formiga tanto que deu,
No seu roçado sou eu...

Meu amor troce de Minas,
Ouro em pó e muita rês,
Nas pernas dessas meninas
Enrosco tudo de vez,
Queria ter meu balanço,
Colado contigo, danço...

Faz frio quero teu colo,
Vem comigo se aninhar,
Eu vou te deitar no solo,
Tanto amor pra se amar...
Não reclame dessa sina,
Relaxe minha menina...

Quis um beijo não me deu,
Um abraço me negou,
Meu amor, então morreu,
Nem quer saber mais quem sou...
Chorei, um choro fingido,
É melhor que eu ter morrido...

A lua é de São Jorge,
O cavalo e o dragão;
A saudade em meu alforje,
Vai pesando o coração...
De banda, então eu caminho,
Já não ando mais sozinho...

Quis ter medo nada tive,
Meu segredo sei de cor,
Tanta dor que me contive,
Não quero viver mais só,
Preciso de companhia,
Seja de noite ou de dia...

Vagabundo coração,
Bate tanto sem ter senso;
Meu amor peço perdão,
Noutra coisa já não penso...
Quero a vida divertida,
Nos teus braços quero a vida...

Meu carro perdeu a roda,
Ao subir nessa alameda,
Vou cantando minha moda,
Queimando na labareda...
Faz assim um só carinho,
Coração apressadinho...

Meu amor, quando se gosta,
Não sei rezar outra prece;
Até mesmo um vira bosta,
Cantando nunca se esquece...
Quero teu carinho amada,
Toda noite e madrugada...

Meu amor tem um cadinho
De tudo que posso ter,
Machucando, vagarinho,
Matando sem perceber...
Amor trouxe novidade.
Agora? Maternidade!

Na fumaça do cigarro,
Amor fez as espirais;
No ronco desse meu carro,
Não te esquecerei jamais...
És a rosa na janela,
Tens o lume dessa vela...

Mas um amor pirilampo,
Não merece essa atenção;
É forte como relampo,
Mas num firma o brilho não...
Acendendo e apagando,
Meu coração vai matando...

Amor tem que ter saudade,
Já dizia esse poeta;
Um grande amor, na verdade,
Que é nossa principal meta,
Tem que deixar ess’azedo,
Certeza cheirando a medo...

Terminando meu cantar,
Eu falarei com clareza;
Não dá nem pra comparar,
É no mundo a realeza...
Bem maior, digo a verdade,
Que todo amor, a amizade!

Nos meus antros sentido vai confuso

Nos meus antros sentido vai confuso,
Não sei das diferenças nem dos fatos,
Eu quero converter os meus recatos,
Na sensação d’amor farto e profuso...

Quem sabe poderei, viver incluso,
Meu mundo tão recluso rompa o trato,
Nessas covas cavadas, sou um rato,
Não conheço sequer, nem roca e fuso...

As minhas soluções são mais problemas,
Não consigo sentir quais os dilemas
Que podem vir, sanar as minhas lendas...

Coberto no deserto, não sei tendas,
A vida nunca soube das agendas
Perdidas nesse espaço, sem algemas...

Vindo lá, do sertão, da minha terra

Vindo lá, do sertão, da minha terra;
Onde cantam segredos, passarinhos...
Lá, onde sol e lua fazem ninhos,
Onde o cio brotando, vem e berra.

Nos gemidos sutis, a noite cerra
Os olhos e permite mil carinhos,
Dos grilos e corujas nos alinhos
Noturnos, nova vida, velha a serra...

Trazendo minha rústica esperança,
Lavada a cada sonho de criança.
Renovando segredos de minh’alma...

Talvez seja por isso, tanta calma;
Natureza conheço, como a palma
Da mão que acaricia, mas avança!

Lavo os olhos na saudade

Lavo os olhos na saudade,
Meu caminho segue o mar
No mote que eu encontrar,
Minha sorte de verdade
É saber da claridade,
É não poder mais ver morte,
Nem cruzar o pólo norte,
Nem sanar essa ferida,
Nem cuidar da despedida.
Nem reclamar dessa sorte...

Minha lida foi marcada,
Pela curva desse vento,
Meu maior, grande provento;
É não saber mais de nada,
Não ser boi nem ser manada,
Nem usar cabeça baixa,
Tanto amor, a gente acha,
Na serra dessa esperança,
Que maltrata essa criança
Cuja morte não se encaixa...

Quero sentir teu perfume,
Acalentar o teu pranto,
Esconder-te em meu recanto,
Não quero mais teu queixume
Não cabe mais teu ciúme...
Quero te dar, namorada,
A minha mão cansada,
Para poder descansar,
A vida inteira, te amar,
Sem ter mais medo de nada...

E quando, enfim, a saudade,
Bater forte sem descanso,
Pensa então nesse remanso;
No lago azul, claridade,
Que te amei, com tal verdade,
Que nunca, alguém amaria,
Te desejei todo dia,
A cada instante sem medo.
De Deus já sei o segredo,
Tanto bem que te queria...

Cordel - A minha sina - capítulo 8 - Na terra do cirandar...

Depois de ter conseguido,
Sair do tal Tororó,
Vazado, comendo pó,
De me sentir perseguido,
Tanto tempo lá perdido,
Nessa ciranda de roda,
Minha vida tendo poda,
Por causa desse diabo,
Tá tentando me dar cabo,
Não vou cantar essa moda!

E quase que ele me pega,
Usando da fantasia,
Que meu peito já queria,
Mas a verdade me nega,
Amor é coisa que cega...
Tenho que ter mais calma,
Pois senão perco minha’alma,
A coisa pode estourar,
Não quero mais complicar,
Nem enfiar minha palma...

Nesse mundo da ciranda,
Pensei sair bem depressa,
Mas a vida me confessa,
Que pra frente é que se anda
Senão a coisa desanda,
Não vai sobrar nem poeira,
Dançarei a vida inteira,
Sem ter como nem dizer,
Eu não quero assim morrer,
No meio dessa besteira...

Bem perto do Tororó,
Tem as terras do De Conta,
Onde tem gente que apronta,
Faz e nem sente mais dó,
Comendo um saco de pó,
A gente passa por lá,
Tem tanta gente que dá,
Vontade de ficar triste,
O meu peito não resiste,
Dessa gente muito má...

Um grito desafinado,
Bem agudo por sinal,
Foi todo meu grande mal,
Eu ouvir o tal miado,
Um bicho pobre felino,
Tava nesse desatino,
Amassado qual paçoca,
Corria de toca em toca,
E pedra em cima, zunino...

Foi pedra e foi paulada,
O bichano quase urrava,
De tanto que apanhava,
Mas não pensei mais em nada,
Também dei u’a cacetada,
Acertei bem de primeira,
Foi uma bruta sangreira,
O gato tá esfolado,
Dessa vez tá bem matado,
Mas vazou na capineira...

Dona Chica s’admirou
Do berro que o gato deu,
O danado não morreu,
E bem depressa escapou.
Pras terras pr’onde vou,
Vou guardar acontecido,
Dele não ter se morrido
Não vou mais m’esquecer,
Quase vi gato morrer,
Mas agora tá fugido...

Saí depressa dali,
Fui em busca d’outro canto,
Mas, logo ouvi novo pranto,
Escorrendo qual xixi,
Nessa mata me perdi,
Procurando quem chorava,
Uma bela moça estava,
Triste que dava pena,
Sua mão de longe acena,
Perguntei que se passava.

A moça então já me disse,
Que um moço cirandeiro,
Acendeu o candeeiro,
Depois fez muita bobice,
Que bem antes que s’ouvisse,
Deixou ela tão sozinha,
A moça era bonitinha,
Minha vontade coçou,
Logo se recuperou,
Pensei logo na Ritinha...

Ela falou da ciranda,
Da meia volta prá dar,
Onde fora cirandar,
Mas caiu meio de banda,
No mundo fez a quitanda,
Mas a vida foi mesquinha.
“O amor que ele me tinha,
Era pouco e se acabou”;
Me mostrou ali no lado,
Um anel todo quebrado,
Foi tudo que lhe restou...

Deixei a moça tristonha,
Não pude falar mais nada,
Passei para outra estrada,
Numa curva mais medonha,
Dessas que nem gente sonha;
Pesadelo sei de cor,
Uma dor foi bem maior,
Quando tive o desprazer,
De perto conhecer,
Uma sina bem pior...

Um moleque bem safado,
Filho do Seu Francisco,
Um pivete bem arisco,
Ria-se tanto o danado,
Um jeito desengonçado.
Quis saber logo o porquê,
Só pedi pra me dizer,
Ele me contou sorrindo,
Foi contando achando lindo
O que passo pra você:

“Pai Francisco entrou na roda,
Tocando seu violão”.
Não fazia nada não,
Mas tem gente que vem, poda,
Nem pode cantar mais moda,
Delegado não quis não,
“Pai Francisco foi pra prisão”.
“E como ele vem faceiro”,
Contava pro mundo inteiro,
O seu filho, sem perdão...

O pobre tão machucado,
Depois de tanto apanhar,
Não podia nem cantar;
“Vem todo requebrado,
Boneco desengonçado”.
Eta filho desumano,
O velho entrou pelo cano,
Tomou tanta da porrada,
Inda agüentar a gozada,
De beltrano e de sicrano!

Deixei depressa esse mato,
Fui buscando outra paragem,
Mas a tal da sacanagem,
Não respeita nem regato,
Como digo, assim, de fato.
Percebi, numa sacada,
A rosa despedaçada,
Que, por causa dum entravo,
Brigou com um velho cravo,
E saíram na pancada...

E logo ali, adiante,
Vinha moça bem tristonha,
Roupa amarrada na fronha,
Que por tristezas que cante,
Me mostrava estar diante,
Dum caso que me entristece,
A moça bonita padece,
Duma pobreza sem dó,
A vida fazendo nó,
A dor no meu peito cresce...

Me dizia não ter cobre,
Tanta coisa assim perdi
De marré, marré, dici;
Eu sou pobre, pobre, pobre...
Eu tentei um gesto nobre,
Mas reparei meu bornal,
Não dava nem pro mingau,
As migalhas que trazia,
Meu bem, fica proutro dia,
Quem sabe lá pro Natal?

Andando mais um pouquinho,
Passando naquele rio,
De noite um tremendo frio,
Reparei, bem de mansinho,
Um sapo dando pulinho...
Mas não era um pulo só,
Tanto pulo dava dó,
Tava todo jururu,
Era um sapo cururu,
Cum frio no fiofó!

No meio do sururu,
Uma coisa também vi,
Me deu vontade e eu ri,
Um tremendo brucutu,
Falando assim pro bitu:
“Vem aqui, bitu, vem cá”,
“Não vou lá, eu não vou lá”,
Respondia o bicho arisco,
“Você me quer de petisco,
Não quero mais apanhar”.

Saindo desse buraco,
Passei por rapaz chorão,
Chorava de borbotão,
Eu fui logo dar pitaco,
Me respondeu num só taco:
“Deus, o que será de mim,
Como vou viver assim.
O meu boi, tadim, morreu”...
Mas antes ele que eu:
“Vai buscar no Piauí!”

Depois de tanta mazela,
Encontrei uma saída,
Dei um tchau na despedida,
‘Tô ficando matusquela,
Escapei dessa esparrela,
Mas pra nunca me esquecer,
Do meu grande bem querer
Pra não perder a centelha,
Peguei a rosa vermelha,
Hei de amar até morrer!

Salmo 9

Senhor, eu te louvarei,
Com todo meu coração,
Suas maravilhas são,
As coisas que contarei,
Eu, em Ti, me alegrarei.
E saltarei de prazer,
Cantarei louvor, por crer,
Ao teu nome, Meu Senhor.
Meus inimigos, com dor,
Viste todos, perecer!

Meu direito tem sustento,
A minha causa, também,
Injustiças? Sei não tem,
No tribunal, seu assento;
Justiça é o teu provento!
O ímpio, tu destruíste;
Pois seu nome não resiste,
Para o sempre, eternamente.
Meu Senhor, perpetuamente,
Assentado, sempre existe!

As cidades arrasadas,
Teu Tribunal preparado,
Para julgares qual fardo,
Terão as vidas erradas,
Serão, enfim, alcançadas,
A justiça e a retidão.
Oprimidos, lá terão,
Um refúgio abençoado,
E para o angustiado,
Encontrará firme chão!

Os que teu nome conhecem,
Nunca estão desamparados,
Louvores serão cantados,
Dos aflitos que padecem,
Teus olhos nunca se esquecem!
Misericórdia Senhor!
Repare bem minha dor,
Causada por quem m’odeia,
Levanta então tua teia,
Para que eu cante louvor!

M’alegre essa salvação,
Os gentios, enterrados,
Nas covas de pés atados,
Pelo Senhor do Sião,
Ao inferno, eles irão!
Como, também, as nações,
Que, de Deus, e seus portões,
Fecharam a sua entrada.
A necessidade azada
Terá suas provisões...

O homem não prevalecerá.
Aos gentios, julgamento,
Que padeçam do tormento,
O Pai amedrontará,
Em todo temor que há!
Para que saibam, verdades,
Que essas nações e cidades,
São por homens nada mais,
Que julgam ser demais,
No fundo, são veleidades...