domingo, outubro 29, 2006

A esperança se renova

A vitória de um cidadão vindo das camadas sociais mais exploradas do
país, com experiências de vida ligadas à miséria e fome no seco
interior nordestino e depois na periferia dos grandes centros, quando
migrou para o "Sul Maravilha", nas eleições para a Presidência da
República de um dos países mais ricos do mundo, líder de um bloco
econômico importante como a América Latina, já surpreendia o mundo em
2002.
O interessante disto tudo é que, esse cidadão de origens humildes e
proletárias passou a ser visto como referência de bom senso e de
capacidade extrema de conciliação e de diálogo, sendo respeitado por
líderes tanto de primeiro quanto de enésimo mundo.
Visto sob uma ótica errônea, era tido como um radical inflexível e um
ignaro, incapaz, algo que beirava ao esdrúxulo.
Esta visão foi logo substituída por outra, a de um líder nato e, coisa
rara, com experiência de vida num dos países mais injustos do planeta,
mesmo sendo um dos mais ricos.
A vítima do coronelismo impregnado no Nordeste e, a posteriori, das
oligarquias econômicas do Sudeste rico e injusto, passou, com
conhecimento de causa, a ser observada com uma ótica diferente.
Todo líder é amado e odiado na mesma e antagônica medida.
Com Lula não é diferente. Ele é amado e respeitado e odiado e visto
com despeito por vários outros.
Há uma coisa que concordo plenamente, Lula tem trinta por cento de
votos sob QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA da mesma forma que é rejeitado por
outros tantos por cento.
Isso, da mesma forma que ocorre com Lula, ocorre com qualquer outro líder.
Entre esses extremos, temos os quarenta por cento que aprovam ou
desaprovam de forma mais independente.
Foram estes que o elegeram há quatro anos e o reelegeram agora, em 2006.
Não foi fácil, aliás, foi extremamente difícil e somente o fato da
idoneidade moral e a capacidade de liderança deste líder foram capazes
de dar sustentação ao homem, principalmente ao homem, acima de
qualquer figura partidária ou ideológica.
A pressão exercida pelos trinta por cento de anti-Lula, apoiados por
uma imprensa burguesa e, muitas vezes, odiosa, ultrapassou os limites
do bom senso e da serenidade.
Somente a força de um líder inconteste poderia fazer com que este
suportasse, quase que isolado, esta pressão.
Em um dado momento, Lula estando só, voltou seus olhos para quem o
elegeu e para o sentimento que moveu este povo à sua direção: A esperança.
Ela mesma, distante tantas vezes do coração deste povo sofrido e
massacrado mas que, diante das medidas vistas como populistas, mas de
cunho Popular em sua base, sobreviveu e se transformou paulatinamente
numa realidade que esboça um retrato de Brasil melhor.
Os erros cometidos por neófitos despreparados para o poder, demonstram
que um partido de homens, feitos por homens não é uma instituição
sacra e acima do bem e do mal.
O PT, nas suas origens era formado por muitos sonhadores e poucos ou
quase nenhum oportunistas.
Havia uma brincadeira que dizia que o PT tinha muito louco mas poucos
ladrões.
Com o inchamento necessário para se tornar competitivo, o partido
aceitou várias pessoas sem olhar passado, presente ou ideologia,
abrindo as portas para muitos oportunistas.
O duro não é a formação de um caixa dois, mas sim a aceitação
sistemática de alguns políticos de sua prática, dando razão a uma
parte dos trinta por cento que não aceitavam Lula.
É óbvio que ficou aquele aspecto da prostituta falando da ex-virgem
que posava de vestal.
Mas o PT não tinha o direito de fazer isso, todos menos o PT.
Na sua mea culpa e autoflagelação à Opus Dei, o PT se isolou de Lula
e, ao contrário de quem pensa que o protegeu, o abandonou.
Houve um momento em que Lula condecorou o inepto e inexistente
Severino Mensalinho...
Isso não passava de um sintoma da solidão a que foi legado pelos
autofágicos petistas.
Porém, com a força do líder e seu amadurecimento tanto quanto homem
quanto político, Lula se reergueu das cinzas e passou a dominar
totalmente o cenário político nacional.
E fez isso contra todos e contra tudo.
Quase às vésperas da eleição, outra vez o partido apronta mais uma
lambança. E coloca em risco, novamente, a reeleição de Lula.
Outra vez, o líder ressurge e carrega vigorosamente todos os seus
aliados e devasta os oponentes. Devastação absoluta pois ao repetir a
votação da primeira eleição demonstra que a ESPERANÇA NÃO FOI FRUSTRADA.
Agora, no segundo mandato, já devidamente vacinado e fortalecido,
passará a ter uma atuação mais independente e, obviamente mais libertária.
O fato de ser um democrata afasta qualquer tentativa de mudança de
regras eleitorais, a não ser o provável final da reeleição, cujo
advento custou ao país muito mais do que possamos imaginar.
Provavelmente nos tenha custado bens importantíssimos como a CSN, a
Vale etc...
Mas isso é passado e temos que olhar para a frente, para o brilho de
uma estrela no final desta estrada, não somente uma estrela vermelha
mas muito mais que isso, uma estrela multicor e com os brilhos dos
olhos do povo faminto e da criança que espera e anseia por um futuro
de glória.
Uma estrela auriverde, que a "brisa do Brasil beija e balança"... Uma
estrela com cheiro de esperança!

Azia

A cabeça rodando: que cerveja!
Nesses botequins, tanta verdade!
Aquele que não sabe se deseja,
Um Cristo provocando a liberdade!
Se não vejo e não creio, pois que seja!
Nas mesas deste bar, tranqüilidade
Misturada aos destilos da saudade...
Aquele que não sabe nunca almeja!

Mas, se vi tua sombra desfilando
A nudez que jamais foi primazia.
Os meus olhos vermelhos procurando...
Nos traçados, os passos cambaleio,
Unicamente espero por teu seio!
No fim da noite, resta-me esta azia!

Desculpe se não creio em teu narciso,

Desculpe se não creio em teu narciso,
Espelhas os defeitos e mentiras...
A cor desses acordos não preciso,
As sedas desfarei todas em tiras...
Por vezes mais sincero e tão conciso,
No campo das estrelas não atiras.
Nas verves e nas lavras perco o siso.
Esqueço dessas musas e das liras...

Deliro nos meus cantos? Falsidade...
Meus versos imprecisos e falsários...
Vendetas e conchavos: claridade?
Não sei se me pressinto ou desfaleço.
No mundo dos poemas, meus armários...
Não falos dos amores: não mereço!

Silenciosamente a vida neva.

Silenciosamente a vida neva.
Rasgo todas as cartas que mandaste!
Não sigo hierarquia, sou teu traste...
Nos pálios e palácios, sorte leva...
Nada para esconder, nem desbaste.
O ramo destas guias já me entreva
O tempo que passei e me enganaste
Morte me levará, próxima leva...

Que se danem meus guias e gurus!
Bailo sobre esses mantras, seus incensos...
Nos nirvanismos, farsas, andam nus
Meus dedos não bifurcam nem me calam.
Os olhos que devoro são imensos.
Nas mágicas que fazes, já se estalam...

Torpes trevas, penumbras e calvários.

Torpes trevas, penumbras e calvários.
Meus miasmas sensíveis e enfadonhos,
Se quedam insolúveis, motes vários.
Nas varizes dessa alma: tramas, sonhos...
Nas derivas das rias; estuários.
Cálices de vinhoto são medonhos,
Nos charcos e nos pântanos, sudários...
Meus amores fanaram-se, tristonhos...

Involuo, termino quase feto.
Não vasculho verdades nem compêndios.
Reverso sou descrente me repleto...
Desorganizo formas e remédios,
Não debelo revólver nem incêndios.
As trevas tenebrosas seguem, tédios...

Ó lua plena, amiga e companheira!

Ó lua plena, amiga e companheira!
Na plenitude orgástica do céu,
No lampadário belo vens inteira
Qual fosse a primaz deste bordel.

Fantástica expressão mais verdadeira
Do medo e da beleza fel e mel.
Da vida que passei, lua primeira,
És trama e contração vivo dossel...

Envolta inspiração deste cometa,
Que em volta de teus brilhos, navegante...
Decifras os meus mantras, és poeta,

Meu plenilúnio! Tuas tramas, trilhas,
Dominas todo espaço, delirante,
As loucas, as amantes, tuas filhas!

Nas catedrais fantásticas que levo,

Nas catedrais fantásticas que levo,
Os templos dos amores esquecidos...
Sofrimentos terríveis que relevo,
Os tempos dos pretéritos, olvidos...
Nas ogivas dos templos, meu enlevo,
Nas memórias saudosas, tempos idos.
Sempre que estou vazio, quase elevo
Meus olhos para os altos reunidos...

Neles, os meus amores se concentram
Na súcia das tristezas e das trevas.
Os medos, as vergonhas lá se adentram
Brandindo as multidões dos meus fantasmas...
Nas catedrais esfrias, gelas, nevas,
Congelas meus rancores, mil miasmas...

A vida se demonstra em verde mata,

A vida se demonstra em verde mata,
Nessa luta incessante contra a morte.
Que venha no machado que maltrata,
Na serra que derruba, triste corte...
As árvores, amigo que desmata,
Gigantes ou miúdas no seu porte.
Espíritos que mata e desacata,
Produzem a vingança tensa e forte...

Nos golpes que dizimam a floresta,
Moto serras, machados e queimadas.
Em pouco tempo nada mais resta...
Revoltas da natura são terríveis
Os ventos e as águas revoltadas,
Da natureza, forças invencíveis!

Se quando meu olhar, parado, vidra

Se quando meu olhar, parado, vidra
Na busca de teus olhos que me cegam...
Embriagado, tonto, desta cidra,
Meus pensamentos soltos, te navegam...
Procuro nos quintais, faminto, féculas,
Embalde não deixaste nem sinal...
Amando-te com todas as moléculas,
Espero por teu beijo, canibal...

Desejos me tornaram demoníaco,
Expresso essas vontades e delitos...
À beira do prazer, afrodisíaco
Encontro em teu carinho, em tua pele...
À margem do que sofro, meus conflitos,
A boca que deliro, me repele...

Meu sonho se tornando o derradeiro...

Meu sonho se tornando o derradeiro...
A morte me permite essa oração.
Entrego-me em teus braços, sou cordeiro,
No sacrifício louco da paixão...
Um verme que campeia sorrateiro,
Omite-me palavras de perdão.
Talvez eu não mereça o verdadeiro
Sentido da palavra compaixão...

A solidão constela minha sorte,
Nas amplitudes todas, sou fracasso...
A boca que me oscula, fria morte,
Encobre e vai nublando tudo em volta...
Amor que já perdi, meu embaraço,
A dor dessa saudade me revolta!

Não sei se ter terei depois do baile,

Não sei se ter terei depois do baile,
Nas brumas e nas plumas, falsidade...
As cartas que me mandas, não sei braile,
No fundo não me queres de verdade...
Teus mares e manteigas são meu tédio.
Exportas mesquinhez com fino trato...
Veneno em leves doses é remédio.
Cuspiste sem saber, no próprio prato...

Agora essas manhãs entardeceram,
Não posso sempre estar, de fato, alerta...
As luas que mentimos, se perderam,
Os versos que te faço são mixórdia...
O pomo da verdade e da discórdia,
Naufraga na mentira desoberta...

Vestida de inocência

Vestida de inocência caminhavas...
Teus passos me guiaram para o sol.
Noturnas serenatas enluavas,
Te via como forma de farol...

Bem cedo, nas auroras, madrugavas;
Estrelas que iluminam meu paiol.
Ladrilhos de brilhante tu passavas,
Meus olhos te seguiam, girassol...

Vestida com beleza fina e rara,
Não pude disfarçar, tudo o que sinto...
Das vezes que te vi, pérola cara,

Valeu por toda a vida que sonhei...
Aquarelas gentis, tonto, te pinto.
Um arco íris uso como spray...

Com sangue e com suor

Não sei se poderei fazer meus versos,
Com sangue e com suor de minha amada...
Os campos que passei, meus universos,
Relembram minha vida tão cansada...

Meus dias vão passando, são dispersos,
A noite das promessas, enlutada,
Sentimentos gentis seguem reversos,
Das lutas que travamos, resta um nada...

Não sei se meu tormento é teu prazer,
Nem sei se vou gozar com tuas dores...
No fundo magoamos cada ser

Que surge nos caminhos que passamos...
Falar assim tão mal desses amores,
É forma de mostrar que nos amamos!

doce fera

Amores são tão raros quais bromélias
São poucas as floragens, mas viçosas...
Na durabilidade das camélias,
No fresco aroma, lembro-me de rosas...

Nos brilhos e belezas que te espelhas,
Encontro essas canções voluptuosas.
Nas dores que me trazes, tristes, velhas,
As noites-pesadelos, horrorosas...

Amor que traz beleza duma orquídea
Ao mesmo tempo dói, e me envenena...
No bote que prepara a dor ofídia,

Tantas vezes solidão, minha quimera...
Mesmo com suas tramas vale a pena,
Enfim, domesticar a doce fera!

Criança que brincava

Criança que brincava, fundo corte.
As mãos tão carinhosas, pois maternas.
Num tempo que me achava, fosse forte,
Nas horas que passei, serenas, ternas...
Passados tantos dias, vejo a morte
Espero as ilusões, vidas eternas...
Não creio que ninguém vivo se importe,
As dores das lembranças que me infernas...

Chegando na metade do caminho,
O resto desta estrada é só descida...
Inverno que maltrata passarinho,
Cabelos, rugas, marcas não me deixam...
Epílogo fatal do que foi vida,
Meus olhos embaçados não se queixam...

Meu cigarro esparrama-se em fumaça

Meu cigarro esparrama-se em fumaça,
Como o sonho que tive e não tem jeito...
Dançávamos felizes, plena praça.
Floriam os jardins, amor perfeito...

O tempo traiçoeiro, sempre passa,
Sozinho vou dormir, imenso leito.
Nos bares me embriago, rum, cachaça,
Nas curvas da saudade é que te espreito...

Cigarro companheiro; não te largo,
Embora no final me trairás...
O gosto: doce beijo hoje é amargo.

Calado me esfumaço pela vida...
Nas horas mais difíceis peço paz.
Espero, sem sinal, a despedida!