domingo, outubro 22, 2006

Noite escaldante

Noite escaldante, noite das esperanças...
Cruas crianças vestem-se de danças,
As danças descalças insensatas...
Os medos e os ledos desejos, segredos e manhas...
Trazes as crases e as aspas, cruzes e vespas,
Urzes e brasas... Acesas brasas...
As asas e os pés cansados, atados e feridos.
Noites escaldantes, noite das lembranças
Das pujanças e das lanças, alças os velozes
E vilosos pés. Segregas e negas, afagas...
Nas terras distantes,
Crianças e gnomos.
Gomos de esperança...
Somos todos o nada,
Absortos e distintos,
Intestinais...
Versos e versões, imersões...
Noite escaldante...
Daqui para adiante,
Avante e diante de ti,
Os pés descalços, os percalços...
Somos o mesmo eco, o repeteco,
O esterco e o nascimento,
O cimento e a base,
Arquiteto divino.
Nada impede o tropeço.
O meu preço é o recomeço.
Meço meus medos por meus olhos
Lacrimejo meu desejo mais espúrio.
Cúrias e Mercúrios...
Deuses...
Reveses.
Cruzes
Luzes
Urzes.
Reverso
E medalha...

Meus erros

Meus erros, cometidos sem disfarce,
Muitas vezes omisso, outras venal...
Tantas vezes neguei dar outra face,
Outra face, vergonhas, carnaval..

Quantas vezes sonhei com luz que embace,
Quantas vezes desejo mais carnal
Impediu que esperanças eu traçasse,
Minha mão maltratando, um mau sinal...

Meus erros vis, canalhas e mortais,
Um reles cidadão perdendo o tino...
Meus beijos traiçoeiros, imorais...

Quantas vezes deixei de ser justiça,
Quantas noites vivi no desatino,
Meus olhos refletiram a cobiça!

Estação Em parceria com Ledalge

Primavera trazendo flores,
Flores que me perfumam.
Primaveris amores...

Marcos

Estação E exalando perfume jasmim//
E me tornam escravo sem fim//
Sedução e explosão em mim


Ledalge

Teus dedos escorregam no piano...

Teus dedos escorregam no piano...
As sonatas que tocas, os noturnos...
Me levam ascendendo a novo plano,
Acalmam pensamentos mais soturnos...

Nos alegros, adágios, cançonetas,
Meus sentidos encantos e magias...
Vejo sóis, os luares e cometas,
Enternecendo a dor, as melodias...

Teus dedos prometendo tanta paz,
Abandonos, lembranças e promessas...
Meu mundo, das tristezas, se refaz...

Nos arranjos, os anjos me procuram...
As mágoas se reviram às avessas,
As dores que maltratam já se curam...

Estela

Mais sangrante, essa adaga, minha amiga...
Consolo minhas perdas no seu fio,
Disfarço meus temores, tanto frio...
Ternura que esqueci, já tão antiga.

Em meio a tantas mágoas, vou vazio,
Você sabe de tudo mas nem liga,
Amor que já morreu, perdeu a liga,
O tempo que passei, procuro estio...

Mas somente invernosa madrugada
Açoita com seus ventos, a janela....
Não posso, nem serei, não sobrou nada...

A foto na parede não é dela,
A vida se esvaindo, tão cansada...
Amor que fora estrela morre Estela...

Melancolia

Melancolia invade, toma tudo...
Tristeza do que fui e não sabia,
Nas janelas o vento... Fico mudo,
Esperando nascer um outro dia...

Em várias tempestades, sei, contudo,
Nada me sobrará, nem fantasia...
Nada me restará, nunca me iludo...
O que posso fazer? Melancolia...

Meus cigarros consumo sem descanso...
O câncer alimento das saudades...
O final desta farsa vem tão manso...

Os meus olhos cansados, sem remanso,
Não sabem distinguir nem claridades...
Morrer, morrer, prazer final, avanço...

Boneca de Cera

Me lembro da visita que fizeste
À casa dos meus pais, era menino...
Do brilho alucinante que trouxeste,
Me parecia um sol, perdi meu tino..

O tempo foi passando e não vieste,
Um homem triste surge. É meu destino...
Viver passou a ser eterno teste,
Amor que imaginei, morre, assassino...

Me lembro da visita, a porta aberta...
O medo transportando uma saudade.
Saudade do que nunca acontecera.

A visita risonha, a vida incerta...
Uma boneca dorme lembra cera,
Escondida num canto da cidade...

O grande lago

O grande lago; restos da saudade,
Que jamais se secara, já me aborta..
Não há senão resquício que me invade,
Trazendo corrimão, soleira e porta...

O meu lacustre sonho, quem o nade?
A mansidão feroz, a vida torta...
Meus beijos e carinhos, quem há de?
Um vento malicioso, o lago corta...

Meu mundo adormecido nessas margens,
Os trapos que me deste, já os rasgo...
O trâmite seguinte, suicídio!

Amor que me entregaste, sei clamídio,
O beijo que me deste, nele engasgo,
Meu grande lago, aborta essas viagens..

Meu Canto

Meu canto necessita de disfarce,
A voz embotaria o coração...
Não posso oferecer senão a face,
Espero por teu beijo e bofetão!

Nas horas mais doridas se renasce
A vontade translúcida, perdão!
Não quero, nem talvez nunca cessasse
A luz que já me insufla, da amplidão...

Meu canto não distingue nem explica,
Somente degenera e não se expõe
Meu canto que jamais cala, adocica?

Escarra minhas dores, alivia...
Devagarzinho chega e decompõe
Não deixa nem retalhos, fantasia...

A noite apascentando meus olhares

A noite apascentando meus olhares,
O cais se distancia da verdade...
Descubro liberdade nos palmares,
O rosto da tristeza na cidade...

Amores não me trazem novos ares,
No beijo que me rega, falsidade.
O mistério esbraveja nos meus mares,
No lago tão distante, da saudade...

A noite se transcorre tão silente,
Nos roncos e sibilos desses ventos...
O mundo, falseando a minha vida,

O canto da saudade é envolvente,
Me alaga de tempestas, sofrimentos,
Prepara a minha doce despedida...

Brasil

Vivendo num palácio sem pudores,
As gralhas esquecidas sugam sangue.
Olhos esfomeados, lutos, dores...
O perfume emanado, lembra mangue,
A praça não cabendo esses atores.
Nas mãos estropiadas trazem flores...

O rosto macilento das crianças,
Suas mãos estendidas pedem pão...
Disfarçam pois não querem nem lembranças,
Companheiros dormindo o mesmo chão...
Adormecidas sobram esperanças,
Por sobre essas cabeças, setas, lanças...

As gralhas ao passar, tampam nariz,
O cheiro da miséria contagia.
Quem passa pela vida, um aprendiz,
Já sabe muito bem de tal sangria,
Mas outro que percebe e nada diz,
A vida representa ser feliz...

Nas mãos contaminadas pelo lixo,
Nos vermes devorando tudo, aos poucos...
Não são pessoas, quase lembram bicho,
Os olhos tresloucados, todos loucos...
O mundo se apresenta como um nicho,
Sua alma carregada, carrapicho...

A fome que parece hereditária,
Não deixa nem sequer pedir licença,
Nas mãos que se sangraram, alimária,
O crime parecendo recompensa...

Nas ruas um veneno,
Nos olhos sem segredo,
O mundo é bem pequeno
Viver é um degredo!!!

Onde estarás meu Pai? Que não vê isto!
Crianças vão pedindo por clemência!
Adiantou acaso mandar Cristo?
A fome não espera paciência!

Seus filhos esquecidos na sarjeta
A podridão devora tudo enfim,
Me mande tantos raios, seu cometa,
Rasgando, a tempestade dentro em mim...

Não posso concordar com tal vergonha,
A vida não merece essa desgraça..
O dedo na ferida, venha, ponha,
Não posso conceber tanta falácia!

O sangue já sem tinta desta gente,
Sua cama estendida no chão duro...
Amar é necessário e mais urgente...
Precisamos resgate, dar futuro...

Os olhos dessas gralhas canibais,
Não podem nem aceitam tal verdade,
Os homens sempre foram animais,
Escolhem, encobrindo tal maldade...

Meninos vão brincando nos esgotos...
As almas são lavadas pela merda...
Os risos traduzindo perdigotos,
O corte mais profundo tanta perda...

Depois de certo tempo, a mesma história.
As gralhas nunca deixam nem migalhas,
A cachaça embotando sem memória,
Maconha e cocaína, filhos gralhas...

Restando assim somente a podridão,
Cadáveres jogados nas chacinas...
Recendem no perfume, o coração,
Das gralhas, suas almas, fedentinas...

Onde estarás, meu Deus?
Por favor, eu te espero!
Secai os olhos meus!
O medo, desespero!

Essas gralhas são famintas,
Não perdoam nem centavos...
Desse sangue bebem tintas,
Açoitantes acham bravos,
As bravatas que proferem,
Esses vermes que a querem!

Nos seus carros importados,
Nos seus olhos protegidos,
Fingem nem olhar pros lados,
Nos seus sonhos corrompidos,
Nas viagens esperadas,
Nas suas portas fechadas...

No sorriso de deboche,
Na marca triste e profana,
Ouro carrega no broche,
Sonhos de riso e de grana,
Nas peles falsificadas,
Nas suas portas fechadas...

Na exploração do faminto,
Nos seus lucros infindáveis,
Nos porres do mesmo absinto,
No sangue dos miseráveis,
Nas orgias preparadas.
Nas suas portas fechadas...

Os meus olhos embaço e tento ver
Em meio a tanta dor, uma saída...
Minha felicidade sem porque,
Uma sombra acompanha a nossa vida...
Nos lixões da cidade, exposta a fome,
A alegria envergonha-se, vai, some...

Guardado no meu canto, minha cama,
O olhar dessa pobreza e da miséria,
Uma gralha empombada não reclama,
Cidade adormecida, finge séria...
Do outro lado da rua, na calçada,
Adormece a menina abandonada...

Uma sombra abraçando a tal menina,
Um sorriso feroz, vil ironia..
Num canto apavorante, que alucina,
A noite envergonhada, quieta e fria,
Na penumbra percebo o sombreado,
Desse bico a sorrir, ensangüentado...

Os segredos contidos nessas mãos

Os segredos contidos nessas mãos
Que procuram delícias e carinhos...
Nos dias que perdemos, fomos vãos,
Um passarinho chora por seus ninhos...

Esperança traduzem nunca o não...
Os segredos que trazes, leva o mar...
No meu cais esquecido, coração...
Conjuga, taquicárdico, adorar...

Tua maciez, brilho e fantasia...
Necessito saber onde estará
A dona dessas mãos tão carinhosas..

A vida então, será u’a nau esguia,
Que nevoeiro algum, por certo irá
Naufragar-me. São mãos maravilhosas!

Pensando em Ti

Pensando em ti, meu dia vai passando...
As horas não se contam sem te ter...
O tempo todo, em ti eu vou pensando,
Me explica então como poderei viver?

Me embriaga a saudade, me maltrata...
As sensações noturnas, pesadelos...
Enferrujando um coração de lata,
Minhas mãos no vazio... Teus cabelos

Distantes e longínquos, onde estás?
Pensando em ti, meu canto desafina,
Pretendo enfim saber se sou capaz

De conhecer as ilhas da saudade.
A chuva que cai; gota a gota, fina,
Dos olhos me diz não! Resta a ansiedade...

A Praça

Quanto tempo não vamos para a praça!
Das noites que vivemos de tão belas,
Restaram só lembranças, só fumaça...
Amávamos sinceros sob estrelas...

Nada mais restou, a vida esparsa,
A lua e as estrelas que há delas?
Um riso melancólico disfarça...
Nos olhos iluminam outras velas...

Quanto tempo sem praças nem passeios...
Amávamos tranqüilos sem ter medo.
As mãos mais atrevidas buscam seios,

Bem baixinho, trocávamos segredo...
Os amores trocaram seus anseios
E agora, tristemente, dormem cedo...

Albores

A manhã me trazendo seus albores
E seus raios solares... sensação
Da abelha fecundando essas flores,
Na eterna primavera... coração!

A manhã, companheira dos amores,
Refaz a nossa vida, é solução
Para os noturnos medos, seus horrores,
Abrindo a porta, fecha a solidão!

Há tanta coisa mais interessante
Que acompanha os solares raios, vida...
As libélulas, pássaros, as cores...

Nossa vida passando em um instante...
A tristeza anestésica, esquecida...
A manhã vem trazendo seus albores...

Cacos

Por esse tempo todo que passei,
Ao te rever, parece que foi ontem...
A mesma boca triste que fez lei,
Impede que as saudades se recontem...

A mão que tenebrosa, foi açoite,
O tempo que passamos, antes, juntos,
Refletem no espetáculo da noite...
Estávamos distantes, sem assuntos...

As minhas mãos, teimavam serem dela
Os olhos que mirei no camarote,
Ao fundo decorando triste tela,
Amor secando a fonte até que esgote...

O tempo irresponsável, fez cisão,
Uma parede atroz enfim se erguia...
O medo precipita a decisão,
No lago não concebe mais enguia...

Não posso desculpar-me, pois apenas
Uma saudade enorme, na porta entre...
Não vejo tempestades nem acenas,
Nos barcos que permitam que se adentre...

Desatam-se tão céleres os nós,
Não resta nem metade que fui eu.
Resume-se tristeza volta aos pós,
No fundo amor que mata, mereceu...

Nos medos que me deste e eu vivia,
O tempo amargurando nosso doce,
Não posso perceber maior valia,
Derrotas, acumulo... A noite trouxe...

Rever-te foi somente triste alento,
A noite da partida se confessa,
Saudades vão e voltam com o vento,
Os erros cometidos não dão pressa...

Amar demais passou a dar vertigem,
Um coração se agita nesta cela...
O medo conspurcando a falsa virgem,
O rosto transtornado da donzela...

Quem fora só metade quer o tanto,
Quem sabe da saudade, diz amor,
A noite espreitando nosso canto,
No resto desta história, desamor...

Não quero conceber que seja jogo,
O medo no teu rosto se revela...
Ardendo me derreto no seu fogo,
A noite se ilumina tua vela...

Nos olhos negros, luzes irradias,
Nos medos pardos, sangue que destilas,
Nos cantos alvos, cruzes que me guias,
Nos prados verdes, brilham-te, pupilas...

Tua partida deixa seus recados,
Destróis a vida, partes, tantos nacos..
Agora está valendo, rolam dados,
O que restará, junte aos meus cacos!

Naufrágio

Onde fui teu naufrágio peço ajuda.
No porto abandonado desatino...
A dor que te causei deixou-te muda,
O medo de sofrer fez peregrino

O coração servil... Vem e me acuda
Não posso permitir novo destino,
Novo mar, novo porto, a vida estuda...
Diante de teus olhos, eu me inclino.

Os limos, tantas cracas e corais,
Morrendo simplesmente não ancoro...
O sangue extravasando cada poro,

O medo de morrer, perder meu cais...
Meu barco naufragado, rompe a quilha...
Permita-me viver nesta tua ilha...

Alma fechada

A minha alma fechada quer respiro,
O meu berço quebrado diz de farsas
Nos mundos que não vi, resta um papiro,
Charnecas tristes charcos, meus comparsas;

Na sombra que ilumina vou, atiro...
Não me digas licença nem disfarças,
O canto que vasculho, vou, me estiro,
Voando repetis as mansas garças...

A minha alma transmuda-se em concreto,
Inaudita e feroz, nunca se cala...
Amor que me legaste, vai discreto,

O medo caminhando pela sala...
Perdoes por não ter nem mais afeto,
O gosto que me deixas, pus e bala...

Vacuidade

Não pretendo saber da vacuidade
Ausência que transtorna uma viva alma,
Não tenho nem domino a faculdade
De saber do remanso, minha calma...

De meus passos sentindo essa saudade
Que me trouxe teus olhos, tua palma,
Amar é traduzir dificuldades,
É saber dessa vida, a crueldade...

Não pretendo mistérios nem segredos,
As águas correrão sempre pro mar...
Importa-me saber de toscos medos,

Se por mal divinal não sei amar?
O sangue me escorrendo pelos dedos,
A noite me esperando tanto bar...

Ermos

Erramos pelos ermos irreais,
Nas fontes que bebemos, nem sinais,
Os medos se crivaram tempestades,
Os olhos procurando veleidades...

Nos pátios que rompemos, vendavais,
Misturo teus venenos mais boçais
Com as dores que trazem as saudades,
Encruzilhadas deixam as cidades...

Nas cruzadas partícipe sem rumo,
Meu cavalo traz selas prateadas,
Minhas naves esperam novo prumo,

As almas me perseguem nas estradas,
Da morte sem sentir bebi o sumo...
As portas eu deixei escancaradas...

Gilberto e a viagem

Gilberto e a viagem
Aquela noite seria fundamental para que pudesse resolver o velho dilema.
Iria ou não para Ibitirama?
Gilberto era assim mesmo, um camarada muito indeciso, medroso e mentiroso.
Não saberia dizer por que mas sempre tinha medo da noite, mesmo que a lua cheia clareasse todos os caminhos...
Aquela noite então era pior que as outras, o tempo nublado demonstrava que poderia encontrar alguns percalços no caminho e isso era assustador...
Dona Rita, como sempre preocupada, tentava demover a idéia fixa de João “Teimoso” Polino. Estava com pena do menino pois sabia que nada iria impedir o velho de executar o plano.
Levar Gilberto pela estrada era uma questão de honra, afinal o garoto já estava beirando os catorze anos e nunca tinha sequer saído dos arredores.
Depois de muita insistência, e de piores ameaças, Gilberto percebeu que não tinha outro jeito. O que não tem remédio, remediado está.
Dadinho, ria-se por dentro ao ver a aflição do irmão caçula.
Ritinha ajudando dona Rita nas preces e orações, estava preocupadíssima com o pobre garoto.
Pobre garoto em termos, pois o marmanjão com um metro e oitenta de medo e de mimo não parecia em nada com um garoto. Barba na cara e músculos expostos, medroso como ele só.
A noite estava fresca e tinha um vento que, ao invés de ajudar, servia para aumentar os temores do nosso herói.
Mas, o que fazer?
Embornal preparado, canivete para cortar o queijo e o pão que serviriam de alimento no idílio...
Tudo bem que eram somente nove quilômetros, mas pareceria uma eternidade...
Os barulhos e sustos noturnos são terríveis, uma simples coruja toma aspectos atemorizantes e Gilberto sabia disto...
Ao passar pela porteira que delimitava o pequeno sítio, fez o sinal da cruz e, cabeça escondida entre os ombros, partiu...
No primeiro barulho estranho, as calças pagaram o preço pela insegurança do rapaz.
Todo borrado, ficou numa situação difícil, tentando andar mas com o passar do tempo, o odor e a consistência do produto do medo foram ficando insuportáveis.
O medo libera toda adrenalina até que, de repente, Gilberto desmaiou.
Os raios do sol mal surgiam no horizonte quando, nosso amigo despertou do terrível pesadelo...
Como chegar em casa e dizer que não tinha conseguido ir a Ibitirama?
Mais que depressa, ardiloso como ele só, teve uma idéia.
Rasgou a blusa e o casaco com o canivete, riscando a pele até sangrar um pouco, não muito, mas o bastante...
Ao chegar em casa, dona Rita extremamente preocupada com o caçula, e ao ver o estado em que o pobre chegara não titubeou, veio correndo abraçar o menino...
Ao perguntar o que tinha acontecido, Gilberto pôs a imaginação para funcionar.
Uma onça, isso mesmo, uma onça havia chegado perto dele e preparava o ataque, os dentes e as garras à mostra, numa cena terrível e pavorosa...
Dadinho, macaco velho, ao sentir o cheiro que Gilberto emanava, começou a olhar meio desconfiado para o irmão, e sentindo que o mesmo estava mentindo, perguntou irônico:
- E aí o que você fez?
Gilberto, reparando que ia ser desmascarado, mais que depressa respondeu:
- Eu? Quer saber de verdade?
- Claro.
- EU ME BORREI TODO!!!!!

Velhas Gralhas

As velhas galas passam nem se nota,
Recendem tumulares excrescências...
O tempo ministrou já nova cota,
As velhas gralhas pedem continências

De sorrisos irônicos se lota
A nova realidade e penitências...
As velhas galas mortas nas compotas
Esquecidas num canto impaciências...

As podres velhas gralhas embalsamo,
Quatrocentonas vivem do passado.
Com risos de ironia, nem reclamo...

As ricas podres gralhas deste lado,
Grande taxidermista vou e chamo,
O rosto enfim será mumificado!

No Peito que crivaste

No peito que crivaste com adagas,
As marcas dos meus dias infelizes...
Respiram pelos poros, vermes, chagas,
Lampejos de vestais nas meretrizes...

Colônias de bactérias, tantas pragas,
A morte te prepara mil matizes,
Em decomposições cedo te alagas,
Esôfago queimado por varizes...

No peito putrefato verte pus,
Nos olhos arrebentas em sangrias...
Nos punhos cicatrizes lembram cruz,

Os ratos devorando podres dias...
Na mansidão do beijo, minha luz,
Na plenitude estrela e melodias...

No Peito que crivaste

No peito que crivaste com adagas,
As marcas dos meus dias infelizes...
Respiram pelos poros, vermes, chagas,
Lampejos de vestais nas meretrizes...

Colônias de bactérias, tantas pragas,
A morte te prepara mil matizes,
Em decomposições cedo te alagas,
Esôfago queimado por varizes...

No peito putrefato verte pus,
Nos olhos arrebentas em sangrias...
Nos punhos cicatrizes lembram cruz,

Os ratos devorando podres dias...
Na mansidão do beijo, minha luz,
Na plenitude estrela e melodias...

Opalescente Amor

Opalescente amor jóia tão rara
Que nunca poderei me desfazer...
Silenciosamente a vida é cara,
Nos meus sonhos, jamais irei perder

A mansa praia; a noite, lua, clara...
Demoro tantas vezes compreender
Que a vida sem amor, machuca, escara...
Nas mãos que me acarinham, vou morrer..

Nos sinos que se dobram de saudades,
Nos olhos delicados de crianças,
A jóia opalescente, liberdades,

As cores fantasias das lembranças.
O grito que hoje solto, tempestades,
Amor se resumindo em esperanças!

Vida

A vida, milagrosa passageira,
Surgindo por divina precisão,
Nos olhos de quem ama, a verdadeira
E única certeza de perdão.

A vida, dos primórdios, derradeira
Esperança negando a solidão...
És fiel e risonha companheira,
Acompanha o bater do coração...

Nas sombras das saudades e das dores,
Nos sentidos e várias tempestades,
O palco onde perfazem os atores,

Planícies e planaltos das verdades,
Deserto aonde moram os amores,
Nos passos que percorres, liberdades!