quinta-feira, setembro 21, 2006

Versos Mórbidos

Nestes meus versos mórbidos, nefastos,
Um resto de esperança apodrecendo..
Os vermes me passeiam, seus repastos,
Solitário vivi, mal percebendo

Teu afago funéreo, teus emplastos...
Se à sombra das angústias, vou vivendo.
Se a sorte me negou caminhos castos.
A vida vai nefasta me envolvendo...

Ri-se fantasmagórica miragem.
Espelhas meus fatídicos amores...
De tudo que passei, sequer imagem...

Os restos que sobraram vertem dores...
Da lama que me cobre, brotam flores.
As flores que apodreces, fina aragem...

Diamantinas Alvoradas

As cinzas que emanavam dos meus dias,
Criando tempestades sem descanso.
As rondas que faziam poesias
Meu rio procurando seu remanso...

As farpas que me deste, ventanias
Os píncaros sublimes não alcanço.
Não quero mais Renatas nem Marias...
Apenas restos sobram, então danço!

Minhas diamantinas alvoradas
Mentiram semelhanças e defeitos.
Carruagens divinas são levadas

Pelos corcéis velozes... Seus feitos
Espelharam as lendas e as fadas...
Os dias pareciam tão perfeitos!

Velhice

A velhice batendo em minha porta,
Trazendo as tempestades invernais...
A boca que beijava anda mais torta,
As pernas já não dançam carnavais.

O que fora vital, já não me importa.
As horas já não passam, voam mais.
A faca desdentada já não corta.
Os olhos que choravam pedem paz...

A velhice não deixa um só momento...
Não permite sequer esquecimento.
Representa fantásticas nevascas.

Da pele diferenças velhas cascas...
Aprendendo depressa a ter perdão.
Peço: Não envelheça o coração!

Rosas Murchas

As rosas que me destes já murcharam...
Crisântemos perdidos no jardim...
As horas que se foram não deixaram
Hortênsias, lírios, palmas nem jasmim...

Perfumes se perderam, não voltaram.
Adornos que plantaste, foram fim...
Nos campos nem certezas enluaram,
Tantos nãos ouvi, nunca mais um sim...

Mergulhei insensato, sem temor...
Velhas rosas murchadas sem alento...
Ressequidas torradas por calor

Excessivo, queimadas pelo vento...
As rosas vão mostrar o esquecimento.
Qual rosas que morreram, nosso amor!

Naufragando

Naufragando essa vida, num contexto,
Procuro por tais flechas que m’atiras...
Não quero mais saber de teu pretexto.
Nem quero conviver com tais mentiras.

Anos passam, amores são bissextos,
Velhas matas cascatas rotas tiras...
Esquecendo palavras do meu texto,
Nas sanfonas dançavas nos catiras...

As vozes que se calam sabiás;
As bocas que se beijam pedem paz.
Os olhos que se queimam nunca riem,

Impedem os que pensam vidas criem...
Não quero mais naufrágios da saudade...
Madrugaste tristezas falsidade...

Pedras

Das pedras insensíveis do caminho,
Dessas mansas ribeiras sem destino...
Não quero me encontrar jamais sozinho.
Nem quero mergulhar, ser assassino,

Cortar os pulsos, livre sem ter ninho,
As ondas me levaram, desatino...
Os portos que deixei, já me definho...
Vou de banda, pesado, torto, esquino...

Misturando essas dores com prazer,
Vivendo simplesmente por viver...
Não quero combater minhas tristezas,

Nem quero mergulhar nessas represas,
Onde escondes fatal impaciência.
Amar é destruir toda ciência!

Lua Sertaneja

Quem me dera ser lua sertaneja,
Iluminando as grotas da saudade.
Cariciando a mão que se caleja
Nas dores que disfarçam vaidade...

Beijando tão sutil quem se deseja,
Fazendo amor santa liberdade.
As falas já contidas, bela, arqueja...
Roubar dos verdes olhos, claridade...

Quem me dera nascer no plenilúnio.
Não caberia nunca mais esse infortúnio,
Nas carícias das fontes, matas, rios...

Iluminando cantos mais sombrios...
Quem me dera viver essa paixão,
Descansar os meus braços, ribeirão!

Dor Libertária

O que me invade, queima, arde traz luz,
Não me deixou jamais perder o canto.
As bodas entranhadas, minha cruz.
As cordas esquecidas, fino pranto.

Não quero nas esquinas um Jesus,
Já existe um mendigo e seu espanto.
Não quero a casa escura. Jorra pus
Das feridas rasgadas no teu manto...

Uma mortalha assaz fendida, pútrida.
A certeza voraz nova, antipútrida.
Nas esquinas que formam essa rua,

Vertentes solitárias, solidárias...
A tarde enlanguescida anda mais nua...
A dor que nos invade, libertária!

Força do Desejo

A força do desejo pulsa forte...
Cabe-nos simplesmente não temer.
A boca escancarada se é da morte,
Não deveria nunca mais comer...

Pelas ruas dos sonhos que se aporte
O novo, meus meninos, vão vencer!
Quem fora crueldade perca a sorte,
Que nunca mais respire um bem querer!

Nas margens violentas desses rios,
As canções abençoadas são hinos!
Não se permitam tétricos desvios.

Que a coragem de todos os meninos,
Seja a força maior. Seus desafios
Nos tragam novos dias, cristalinos!

Ocidental

Do lado ocidental, fétido lixo...
Das marcas das torturas sem sentido.
As trevas são restolhos, olho fixo.
A fome esmiuçada, sem partido..

O canto de teu povo, mais prolixo,
Traduz a velha forma dum olvido.
Nas paredes do peito, logo afixo
Cartaz, mensagem ,texto nunca lido!

Esqueço as canções, lutas e derrotas.
Destinos se cruzando, tontas rotas,
As vozes que te cantam se esmorecem...

Do lado acidental vidas padecem...
Esperanças transitam, novas, brotas...
Do lixo ocidental, as flores crescem!

Meus Leitos

Joguei todos os sonhos no estuário
Que percorre meus vales e montanhas...
As flores que colhi do mostruário,
Perfumam essas costas onde lanhas...

Não posso me livrar do teu cenário,
Nem posso achar amores nas entranhas.
Meu outubro ou outono passa hilário.
Carcomidos bastardos terços, banhas...

Quando partiste morto me deixaste!
Nas profundezas da alma, tais relíquias...
Nos dedos, dolorosas paroníquias...

Na vida que me roubas, mergulhaste.
Não quero conhecer os teus defeitos.
Somente irei dormir meus vários leitos...

Bocas Que Beijei

Nas bocas que beijei, um só veneno...
Na luz de um dia nasce meu amor!
As cordas que se cortam, sou pequeno.
Vou fazer faca, prata, luz e cor!

O brilho das mudanças, já te aceno.
Cabeças vão rolando meu torpor...
A dor sorrirá campos rios, fenos...
Não restará sementes nem calor...

Tanto sal escorrendo meu trabalho...
Venenos nas bocas que beijei.
As horas sem verdades que passei,

Temperam meus martírios, al dente, alho...
Amores que neguei num ato falho...
Nas bocas que beijei, nunca fui rei!

Meu Canto

Corro a te encontrar, triste como o vento...
As tortas caminhadas, céu de prata.
Perfazem meu telúrico lamento...
As flores se perderam, minha mata...

O pranto perseguindo novo invento,
As várias compleições dessa cascata.
Não quero saber pátria, me apascento...
Não tenho mais sustento nem bravata...

Todo meu canto, faca, enxada e foice,
Perdido navegante sem ter praia.
As hóstias engolidas, tudo foi-se,

Restou tal solidão que já se espraia...
Venha depressa ouvir o trem chegando...
Corro a te encontrar, vou procurando...

Burguesia

Os ratos devoraram sensatez...
Nas retinas queimadas pela luz...
Os ratos mortos pedem sua vez,
A carcaça inebria... Me seduz.

Olores decompostos, pequenez,
Abro a boca, escancaro velha cruz...
Nauseabundos seus beijos, mal me fez...
Os ratos devorando um avestruz...

Nas salas, nos meus quartos, meu sofá,
Roedores vorazes fazem festa...
Procurando carniça chegam lá.

As portas não resistem, abrem fresta.
A lua escancarada trava já
Os ratos devorando, pouco resta...

Ratos

As noites que passamos soluçantes...
As cordas do meu pinho te espreitavam.
As vozes que pedimos dois amantes...
Dormiam nas cadeiras nem chegavam...

Nas mortes que mordemos elegantes..
Fruteiras e morteiros misturavam...
As noites que salvamos mais dançantes
Mergulham nos passantes que se amavam...

Estrela que perdi, numa esplanada,
Vagueia poesia pelos bosques...
As frases se jogavam nos quiosques.

As fotos amarelas dizem nada...
Os ratos que comeram almanaques,
Nas nossas festas usam velhos fraques...

Violinos

Ouço, distantes, belos violinos...
Seus sons invadem toda minha vida..
Recordando meus velhos tempos... Hinos
Cantados por suaves vozes... Lida

Diária em busca de límpidos destinos.
A morte não deixou de ser sentida
Companheira fiel, meus desatinos...
Vida longa, arrastando a mão perdida...

Quem dera, violino, não parasses...
As cordas que traduzem fantasias.
Casas iluminadas, meus disfarces

Se escondem nas esquinas e nos dias...
Meu amor, por favor, nossos enlaces
Se repetem ao som das melodias...

Estrofes

Nas estrofes que tento, meu tempo urge.
Marcas de tuas patas não saíram...
Os dentes antes fortes, já caíram,
Antes o sempre bravo já nem turge.

Vai solitariamente, a dor ressurge...
As aves que voavam, descaíram,
Os tempos que sonhara já se expiram...
Da poeira noturna nem luz surge!

Nas estrofes que tento, nada faço.
Não tenho mais canção nem serenata.
A mão que acaricia me maltrata.

O resto que deixei, forjou abraço...
O rosto que t’amei nem ouro ou prata.
A noite vai vencendo meu cansaço!

Dança Delirante

Dançavas delirante, era um dantesco
Espetáculo dado por teus passos...
Nas salas, telas raras, um afresco...
Os medos segredavam seus compassos...

Pergaminhos escritos, arabesco.
Nossos vasos quebrados... Velhos paços
Festivos; nos coretos, um ar fresco

Mentindo nossas dores sem remédio...
O tempo decorando todo tédio,
Os olhos esquecidos pedem óculos.

Nas bocas doidivanas, meus ósculos,
Nos templos bacantes minha fome.
Dançavas delirante, a noite some...

Oligarquia

Nas festas que sangramos, dois convivas.
Nas orgias bacantes sem saveiros...
As carnes que cortamos, foram vivas,
Os olhos que comemos, costumeiros...

As pernas amputadas mais altivas,
Os medos que mordemos brasileiros...
As podres madrugadas tão passivas.
Os penhascos saltamos, verdadeiros...

Nesta festa dançavam velhos ogros,
Devoravam crianças sempre rindo...
Mortos mães, pais seus filhos e seus sogros,

A porta da desgraça sempre abrindo..
Os restos da família dei aos cães.
Repartindo, solícito, tais pães!

Noites Solitárias

Nas noites solitárias, ouço vozes.
Solidárias repetem meus lamentos...
Percebo teus olhares mais ferozes.
Não me deixam sozinho sem tormentos...

Nem quero nos meus barcos albatrozes.
Repetem, escondidas pelos ventos,
Os sons que me dizias mais atrozes.
As alegrias cátedras, fermentos

Dos meus sonhos, felizes companheiros...
Meu caminho é de pedra, sem esperas...
Os meus olhos perdidos nos canteiros.

Nas bonanças sem luta, guardam feras.
Nos momentos melhores, meus braseiros
Das noite solitárias, vis crateras!

Canoeiro

O velho canoeiro busca o mar...
Já sabe todas lendas, das sereias.
Conhece melodia pra cantar.
Descreve seus castelos nas areias.

Constelações são livros... Estudar
As fases, velha lua. Suas veias
Levam sal e saudades. Navegar...
Reconhece qualquer dor, suas teias...


Romarias marinhas, os naufrágios...
Bancarrotas, riquezas e mentiras.
Roupas rotas, os vinhos e presságios.

As rotas sem destino ao mar, atiras...
Nos olhos, seus amores são pelágios...
As correntes marinhas, suas liras...

Sentinela

A dor que me procura sempre estava
Escondida na boca que eu beijei.
Sentinela perdido me enlutava
Das saudades deixadas, falso rei...

O tempo levará toda essa lei
Que não permite sonhos nem os lava...
Nos vulcânicos dias me encontrei,
Escorrem pelos olhos calor, lava...

A despedida feita neste portal,
A amargura da vida, velho sal...
Os restos das fronteiras que não vi.

Os amores fatais que, sei, perdi...
Todas rosas mais belas do rosal.
As flores dos amores que esqueci...

Minas

Do sertão das Gerais trago a saudade,
Fazendo madrigais, cantando a lua...
Na luminosidade, claridade...
Nas trovas a violência nunca atua...

Os portos mineiros na verdade
São lacustres, reinantes... Andas nua,
Tão nua quanto o vento... Veleidade...
A noite com saudade compactua...

Do sertão dessas Minas, meu tesouro...
Da cabocla serena, sem malícia,
Das bocas abertas, da carícia,

Minhas Minas Gerais forjam meu ouro...
Nas dores das montanhas, touro e couro...
A vida apresentando essa delícia...

Cunhã

Minhas noites seriam mais insanas,
Na turbulência giram meus sentidos.
As mãos que te carregam são profanas,
As noites que vivemos seus olvidos...

Perdidas, minhas lutas... Já te enganas,
Nos portais tristes, álgicos, colhidos...
Sempre me restariam as baganas.
Amantes sentimentos esculpidos...

No azimute, no zênite, n’espaço...
Nas alvas tumulares da manhã;
Descansarei sedento o meu cansaço.

Jamais desistirei dessa cunhã,
Adormecida, lassa no meu braço...
Amada desde sempre, cunhantã!

Correnteza

Quando buscavas, déspota sem par,
As horas mais nefastas, solidão...
Nos restos putrefatos desse chão
Buscavas fantasias sem luar...

Decomposto vazio coração
Tentava sobrevida. Sem parar
Completamente, linda podridão
Balançando as mãos fétidas, meu ar!

Tentei a boca amarga da saudade...
Não pude esculpir lástimas nem frio...
Perpetuo essa minha realidade,

Em tais ondas sinérgicas, vazio...
Quem me fora respaldo, nulidade...
A bela correnteza, leva o rio...

Sacrário

Imagem guardada num sacrário.
Absorvo meus estranhos sentimentos....
As pontas deste velho relicário
Transportam mais perenes meus momentos...

Não quero guardar mais o meu sudário,
As ondas se permitem movimentos.
Amores caudalosos n’ estuário
Que recebem, remanso, pensamentos...

Imagem reluzindo na visagem;
Espera refletir no grande céu,
As cores que coraram meu corcel.

As fontes vão roubando esta estalagem;
Corrompem os meus sonhos, sem cartel,
Amores nunca foram u’a bobagem!