quarta-feira, setembro 06, 2006

Árvores

As árvores podadas com machado,
Cortadas sem nenhuma precisão;
Seus caules, aquecendo no carvão,
Refletem tantas marcas do passado.

Nos bosques, nossas matas, um recado,
Deixado pelas marcas sobre o chão.
Dos restos que sobraram no sertão,
O solo empobrecido, abandonado...

Os homens poluíram o cenário,
Afastam das florestas o canário;
Silêncio recobrindo, tão medonho...

Nos caminhos, nascentes abortadas,
Destruindo t’as folhas nas queimadas.
Eu, tal qual as árvores, tristonho...

Amarga Vitamina

Saudade, libertar-me de ti, quando?
Cavalgas todo dia meus martírios,
Sorvendo cruelmente meus delírios,
Me libertar de ti, sair voando...

Novos caminhos, livre irei buscando,
Procuro pelos campos, alvos lírios.
Nas procissões, minha alma traz os círios...
Mas a saudade sabe vir matando...

Muitas vezes, m’engana essa farsante,
Acredito esquecer mas, nesse instante;
Ressurge fatalmente, me tortura...

Momentos que, pensei, minha loucura
Tivesse terminado, eis que domina,
Saudade, minha amarga vitamina...

Quem sou?

Quem sou? Por tantas vezes me pergunto,
O que Deus quis, fazendo-me tristonho,
Dessa melancolia fez meu sonho;
Não temo o tempo, fujo desse assunto;

Quisera ser semente, morro junto
Com todos os pomares, sou bisonho...
Meu barco, no oceano, nunca ponho;
Nas lamas de tais almas, me besunto.

Fracassos foram formas de reclame,
Quintais, jardins, nas flores, sou estame;
Procuro por comparsa, gineceu...

As farsas tomam todos os meus dias,
Recebo em troca, setas, vãs, vazias...
Quem sou? Alguém que em vida, feneceu...

Lágrimas contidas

Contidas, minhas lágrimas não caem.
Simplesmente se calam, abortadas;
Mas, caladas, profundamente traem
Quem sempre quis conter as alvoradas...

De minha alma, servidas, sempre saem;
Mas, meus olhos, contêm as rebeladas.
Vez em quando, fingidas sim, atraem
As dores que escondiam madrugadas.

Mesmo nas amarguras que retive,
As lágrimas são sempre escondidas.
A força, gigantesca sobrevive,

Ludibriando todo sofrimento;
Minhas senzalas, nunca mais vertidas
Num pranto que disfarço, ao menos, tento...

Retrato

Disfarço, tão somente, minha dor;
Num canto delicado, forjo o riso.
Meu mundo, falsamente, fiz conciso,
Na verdade, fui sempre um amador...

Gargalhei, zombei, pranteando amor...
Nunca pedi sequer nenhum aviso,
Vingativo o tormento foi preciso,
Mas, ironicamente, sou ator...

As dores, vão tomando-me d’assalto,
Penetram carcomendo, mas num salto,
Me vingo, sorridente, desse fato...

As mágoas construídas dia a dia,
Repetem tal solene melodia.
Espelhos não refletem meu retrato...

Teus Olhos

Teus olhos, minha amada, meu caminho...
Carícias dos meus sonhos mais profundos.
Neles, eu encontrei diversos mundos.
Reconhecendo brilhos, sei teu ninho...

Tiraram dos meus dias, triste espinho.
Calaram na minh’alma, foram fundo,
Das emoções que trago, num segundo,
Nos teus olhos, decerto, teu carinho...

A lua, mais ciumenta, te procura;
Sem teus olhos, a noite fica escura.
Por certo, quer roubar o teu luar...

Quando, a escuridão tomou a Terra,
O mundo entrou em triste, cruel guerra,
Faltava simplesmente, teu olhar...

Amores Tardios

Minha vida anoitece sem ter novas;
Notícias que produzo, requentadas.
Verdades que me foram reveladas,
Guardadas nesse cofre como provas

Dum tempo que passei, espero as covas...
As bocas que beijei, abandonadas;
Já quase centenárias, foram dadas
Num testemunho triste. Mas renovas

Um velho coração, já sem sentido,
Vieste num cavalo colorido;
Iluminando um céu deveras torto...

Te procurei, em vão, agora vens,
Num momento improvável, ond’os bens,
Razões do meu viver, me encontram morto..

Realidade e Sonho

Quisera ser poeta, ledo engano...
Meus sonhos foram simples fantasias,
Pensei verter; nas minhas poesias,
Amores e sentidos, foi meu plano.

Tentava convencer-me, mas insano,
Quando pensava assim, tu me mentias.
Nos meus passos, falsária, me seguias...
Sonhando ser marinho, fui serrano...

Sonhei poder vencer qualquer quimera,
Sem, ao menos, perder um só segundo...
Embora foste tanto, fui quem dera...

Recebo essa verdade, tão soturno,
Meus dias acabaram num noturno
Sonho, onde m’acordaste enfim pro mundo...

Podre Convés

Desalentado, busco essa princesa,
Que me deixou tristonho há tantos dias,
Matando cruelmente, as fantasias,
Deixando assim nenhuma luz acesa.

Meu coração deságua na represa
Que construíste. Mentes melodias,
Deixando minhas noites tão mais frias...
Meus olhos se cegando em tal beleza...

Vagueio pelas noites sem luar,
A vida foi soturna, quero o mar;
Mas o mar tão distante, sem marés.

Nas ondas que me trazem tal saudade,
Desalentado, fujo; mas, maldade,
Meu barco naufragou, podre convés...

Tarde Dourada

Tarde dourada, brasa que, celeste,
Queima feroz, ardendo minha musa;
Devagar, levantando sua blusa,
Vou concebendo nova, leve, veste...

Morenas passam; belo gosto agreste,
Desafiam o olhar que o golpe acusa.
Uma nuvem, passando, vai intrusa,
O vento expulsa para o rumo leste.

Suas mãos passeando delicadas,
Nessa tarde feliz, as mãos marcadas.
Pela forte presença do Sol Deus,

Clareando por toda essa cidade.
A vida refazendo suavidade,
Carícias dos teus beijos que são meus...

Falso Amor

As mentiras contadas foram tantas...
Amor quando permite essas mentiras,
Desfaz-se totalmente, em várias tiras,
Jamais reconstruídas. Velhas mantas

Que, do frio, verteram flores santas;
Cantavam simplesmente falsas liras,
Amor, em emboscadas, tanto atiras...
O meu cruel queixume, rindo, cantas...

Quando, louco, pedia teu carinho;
Nunca pensei quedar-me, então, sozinho...
Em meus versos, cantei sem ter nem eco.

Agora, lenços brancos, onde seco
As lágrimas que teimam em descer,
Percebo, sem amor não sei viver...

Pesadelo

Meu reinado, fugindo entre meus dedos...
Tantos sonhos, verdades virtuais.
Lindas mulheres nuas, carnavais...
A noite compartilha meus segredos!

Majestade, senhor de todos medos,
Vitorioso em guerras e na paz.
Loucos desejos, tudo sempre apraz,
Dono dos mares, terras e penedos...

A noite traiçoeira fez miragem,
Do que sempre pensei, simples imagem,
Perdida no oceano, crueldade...

Acordo, meros sonhos. Pesadelo
Que a vida envolve nesse seu novelo,
Trazendo tão somente essa verdade...

Fingimento

Meu sentimento exposto, torturando,
Rasgando, sem ter pena, o coração;
No que resta do peito, vai cravando
As garras mais sutis dessa emoção...

Tantas noites passadas, procurando,
Encontrar nos meus versos, a canção
Que permita viver. Agonizando
Tento sobreviver, nessa paixão!

Restam somente rimas esquecidas,
Alimentadas pelas, já perdidas,
Emoções que me negam sobrevida...

Sonhando com meus versos mentirosos,
Navego os universos vaporosos;
Onde minh’alma finge nova vida...

Perigo

Quero erguer os meus sonhos no teu céu,
Fazer dos pensamentos meu neon,
Cobrir espaços, levo todo som
Que possa repetir, arrancar teu véu...

Caminhar tuas brasas, fogaréu,
Perder todo sentido, todo tom,
Roubar de tua boca, teu batom;
De vidro, era somente teu anel...

Meu bem está guardado, não recuso,
Sou recluso, limite mais confuso,
Que divide, fronteiras invadidas...

Eu sei da tua história, mas não digo.
Iludes, finges frágil, mas nem ligo;
Desse perigo, gozam nossas vidas...

Amor Que Morre

Amor morrendo, padecendo tanto,
Deixa feliz no maltratar demais...
Se metade gozando novo encanto,
Outra, sofrendo, perde toda paz...

Satisfação consola todo pranto;
As lágrimas rolando, nunca mais...
Por outro lado, angústias no recanto,
Saudades tão ferozes, vida traz...

Amor jamais falece, só renova...
Corações procurando vida nova,
O tom dado, canção desafinada...

Amor sacana rindo, faz sofrer;
Num desmaio fingido, vou morrer,
Por certo, a dor transforma-se em piada...

Visita

Tua visita, aguardo, toda tarde;
Não me cansarei, nunca dess’ espera...
Pois bem sei que sentir essa cratera
Aberta no meu peito, cruel, arde...

Sinto teus passos, tremo, faz alarde
Meu coração, batendo, desespera.
Mas mudo, fixo olhar, minha tapera
Vazia continua, sou covarde,

Queria tanto teus braços; mas, nada...
Tua ausência, mortalha abandonada
Por esperanças tolas, mas felizes...

A minha boca sonha com teu beijo,
Mas te buscando tonto, nada vejo.
Me resta teu retrato e nada dizes...

Fel

As rosas que, nascidas junto às urzes,
Têm o mesmo perfume d’outras flores;
São iguais aos desejos que, das dores,
Transformam essas trevas, novas luzes...

Carregando, pesadas, velhas cruzes,
A minh’alma procura por frescores
Primaveris, a noite gera cores,
Assim como; na guerra, paz, obuses...

Liberdade sangrando nas prisões,
Esperanças matando corações,
Afago, tantas vezes, traição!

Carinhos, muitas vezes, bofetão...
Das abelhas, picadas, trazem mel;
Sorrisos, quantas vezes guardam fel...

Solidão

Nesses meus versos, tento te dizer,
Da boca que não beijo e tanto quero...
Celebro meu desejo, mordaz, fero.
Em tal fogueira, sonho, enfim, m’arder...

Porém, ao mesmo tempo, sem querer,
Por temer teu silêncio, nada espero.
Então me silencio. Nada gero,
Somente esses meus versos posso ter...

Na mansidão, volúpias atormentam,
Minhas angústias, mudas, só aumentam...
Mas sou feliz, fazendo esse poema...

Sonhar é doloroso, mas acalma,
A vida transtornada cede calma,
Embora a solidão seja meu tema...

Quem me dera

Quem me dera; poeta fosse, enfim.
A solidão seria brincadeira,
Caminharia minha vida inteira,
Sem precisar sair, fugindo assim

Me evaporar, sem escapar de mim...
Buscar, sendo faminto, a verdadeira
Razão para jamais ser a primeira
Vez que terei roubado teu carmim...

Nos lábios que sonhei, nada retive,
Esplendor com misérias já convive;
Ter dimensão exata que se sonha...

Quem dera versejar sem ter saudade,
Falar de minha vida, falsidade;
Sorrir da fantasia mais medonha!!

Mestra

Pelas noites sem sono, sem sentido,
Pelos desejos que negaste, rindo...
Pela boca mordaz, me destruindo,
Simples fato: jamais me dest’ouvido...

Pelo que me fizeste, divertido
Achar que nunca iria ver saindo
De minha alma queixumes. Vou abrindo
Meu peito, vagabundo e corroído!

Agradecendo a vida que negaste,
Ilusão que, vencendo, enfim, mataste;
Não deixando senão tanta tristeza...

Agradeço a carpida noite fria,
Foste mestra, vencida a dor n’orgia,
Criaste, sem querer, a fortaleza...

Meu coração fazendo confusão

Meu coração fazendo confusão,
Já nem sei se te quero ou nem te quis.
No meio das batidas, fui feliz?
Não quero nem respondo sim ou não!

Um coração moleque, sem perdão;
Inventa sua praia, diz que não diz.
E, pior, tempestade, pede bis...
Paga pra ver qualquer novo sermão...

Eu fiz meu calendário sem ter datas,
Perdi todo meu tempo nas ingratas
Sensações que me trazes, vagabundo...

Fiz meus versos, confesso que menti,
Muitas vezes, vadio, nem sofri.
Mas por fim, coração percorre mundo...

Antítese

Quanto mais eu te vejo, menos sinto...
Teus olhos são distantes, mas presentes...
Quando estás assim perto, são ausentes;
Quando digo: conheço-te, mais minto.

Mas, paradoxalmente; se me tinto
Com as cores dos meus olhos, são urgentes
As mudanças; tragando minhas lentes,
Nos teus olhos, então, os meus eu pinto...

Quem me dera saber do não sabido,
Meu olhar, nos teus olhos, escondido.
Reflexo que embriaga, deixa louco...

Conhecer minhas dores e destino,
Ao mesmo tempo, vago, perco tino,
Mergulhando em teus olhos, pouco a pouco...

Contradição...

A chuva lava essa tristeza, amor...
No espelho d’água dos teus olhos, brilham
Tantas estrelas que, cadentes, trilham
Pelos espaços. Nos teus braços, flor...

Na confusão dos sentimentos, dor
E alegria que, juntas, maravilham...
Sem ter teu corpo; medos compartilham
Com todas as angústias, meu temor...

Nas águas mais profundas, abissais,
Num deserto temível, te perdi,
Agora, sempre, quero muito mais.

Quero essa trajetória sem sentido,
Busco tanto, jamais pensei em ti,
Não queria sequer, ter conhecido.

Cordel - A minha sina - capítulo 11 - Um tiro dado pela culatra... E salvador.

Acontece que, na pressa
De sair do matagal,
Eu trupiquei nesse pau;
Minha vida anda as avessa,
Inda morro numa dessa!
As perna quase parti,
De cara pru chão caí,
O negócio tava feio,
Eu num arranjava meio,
Desse fardunço saí...

Machucado, bem doído,
Tive que ficar parado,
Cheiro de mato queimado,
Eu pensei: eu tô perdido,
Nesse caminho comprido,
Eu num tenho salvação,
E não tem mais jeito não,
Como posso me escapar,
Se não encontro lugar,
Nem encontro solução...

A noite tava chegando,
Escura e muito fechada,
É parar a caminhada,
Ali ficar matutando
Num posso sair andando.
O mato pegando fogo,
Complica mais esse jogo,
Brilhando lá d’outro lado,
Se chegar eu tô ferrado...
Rezei, pedindo num rogo.

Arrastei dentro da mata,
Devagar, fui deslizando,
Vi dois foguinho brilhando,
Tanto medo me maltrata,
Procurei marca de pata,
Encontrei um rastejar,
Trem começa a complicar,
Os dois olhinhos brilhando,
Nesse bicho rastejando,
Pensei logo : Boi Tatá...

Escondido desse bicho,
Fiquei nesses matagá,
Eu sei que esse Boi Tatá,
É pior que carrapicho,
Se não vazar num esguicho,
O troço pode feder,
O danado vem fazer,
Com o pobre do coitado,
Um fogaréu desgraçado,
Fazendo o cabra morrer...

Depois é que me lembrei
De ter matado um gambá,
Os restos dele deixá,
E pelo que eu já bem sei,
Esse gambá que matei,
É que trouxe esse malvado,
Não vivo mais sossegado,
Minha sina é de matar,
Como é que vou escapar,
Desse bicho disgramado...

Mas pru sorte, seu dotô,
Deus é muito meu amigo,
Com Ele corro os perigo,
Me protege sim sinhô,
O meu maior protetô!
Um caçador, nesse instante,
Deu um tiro na vazante,
Do rio que passa perto,
Esse tiro foi incerto,
Passando bem raspante...

Esse tiro salvador,
Dado sem ter direção,
Foi a minha salvação,
Esse tal de caçador,
Sem ter noção, atirou
Na casa do Boi Tatá,
Acertando tudo lá;
E fazendo um grande estrago,
Escapei dessa, tô pago,
Mato parou de quemá...

O caçador, desastrado,
Me salvou desse bagaço,
A faca que corta é d’aço,
O medo traz estampado,
Eta mundão mais danado,
Feito de cruz e diabo,
Vou babando igual quiabo,
Eu tô fedendo defunto,
Mas vamo mudá d’assunto,
Pois senão assim, acabo...