segunda-feira, fevereiro 15, 2010

24856

O nome da esperança eu logo risco
Deixando em branco a página do sonho
E quando nova história eu proponho
Talvez eu te pareça mais arisco,
E sei que dos caminhos que confisco
A sorte sendo atroz; tenso e tristonho
A cada novo dia recomponho,
Mas sei quão arranhado o velho disco.
Repete-se a desculpa costumeira
E sei que mesmo ainda que não queira
A vida se desvenda em falso brilho.
Não posso presumir outro caminho
Se eu sigo, como sempre mais sozinho
Nas hordas dos anseios que ora trilho.

24855

Lambuzo-me do fel que recebi
Enquanto tu fazias velhas cenas
E tudo se transcorre em vão, serenas
Os dias que talvez trazendo a ti
O todo que deveras reparti
Em doces e suaves noites plenas
Mascaro os meus enganos com amenas
Palavras que contigo eu aprendi.
Descreves as parábolas insanas
E quando na verdade desenganas
Profanas as vontades mais suaves,
E sei que do passado ainda trazes
As garras infelizes e mordazes
No quão em desespero dor agraves.

24854

Aos poucos me despindo chego a ti
Deixando esta nudez mostrar deveras
Anunciados medos, frias feras
Temperos desta vida que sofri

Depois do temporal; eu percebi
O quanto navegaste em vãs esperas
E tento percebe por que temperas
O gozo do prazer que jamais cri

Com tua mansidão irada noite
Aonde o vento e o frio, ledo açoite
Avassalando o encanto que servil

Espreita dos umbrais a lua mansa,
E enquanto esta borrasca em nós avança
A voz de uma esperança ressurgiu.

24853

E faço com o nada um novo trato.
Trazendo este silêncio que me acalma,
Por mais que a realidade adentrando a alma
Prepara para a dor sobejo prato,

Se tanto me entregando já destrato
O bem que sendo imenso; nega o trauma
Perfilo em descaminhos medo e calma
E a eles com denodo, eu sigo grato.

Empedernidos dias horas vãs
Ascendo aos desencontras das manhãs
Anoitecendo em mim a primavera,

Esvaecendo o que se fez peçonha,
Poeta quando canta ou sofre, sonha
Do morto e do fantástico se gera.

24852

No espelho em fundo falso eu me retrato
E faço neste frágil diapasão
Amostra do que sinto moldarão
Os dias ansiosos, fino trato.
Encontro este banquete e em cada prato
Sereno caminhar ou aversão
No verso que trazendo outra versão
Transfere a realidade em vão retrato.
Transcendendo à verdade outra mentira
Ou mesmo insânia torpe em que se atira
A frágil tentação de ser audaz,
Devasto e deixo em tiras meu caminho
E quando aqui me dou desencaminho
O que já fora outrora vida em paz.

24851

E vejo que em mosaicos me perdi
Extraindo os meus anseios não percebo
Além do que deveras já recebo
Da velha ingratidão medonha em ti,

Escusa-me se tento ver aqui
O belo pensamento onde me embebo,
Quem dera se pudesse ser mancebo
Soberbo e nababesco que me vi

Em tramas quixotescas pela vida,
Enquanto este dantesco ser duvida
Do passado que tramas no arabesco

Exposto nas vitrines, galerias
Aonde se mostrara em rebeldias
Caleidoscópio imenso, gigantesco.

24850

Mergulho o que me resta, inteiro, ali
No pote destroçado em doce e mel
E faço do meu rito o ser incréu
E bebo o que sobrara ou mal perdi,
Acidulando o quanto não vivi,
Esbarro neste barco de papel
Ilusionário rumo traça ao léu
O que roubara ainda agora em ti.

Estraçalhando o bote quero o cais?
E mesmo que quisesse em anormais
Marinhos vis destroços desta herança
Arcaico timoneiro sem timão
Augúrios malfazejos mostrarão
Aonde o desamor ora me lança.

24849

Coleto o que me deste, teu destrato
Feroz e meteórico caminho,
Vencendo o sofrimento já me aninho
No corpo que insensato inda maltrato,
O nó que tanto quis e ora desato
Numa era tão distante fora ninho,
Agora avinagrado e tênue vinho
Expondo falsamente o meu retrato,
Amargas soluções nesta acidez
Da qual cada esperança se desfez
Deixando para trás uma agridoce
Estrada onde talvez não possa ver
Senão o que me deste em desprazer
Como se um sonho bom ainda fosse.

24848

No câncer que eu cultivo eu me esfumaço
E fumo sem pensar em morte e dor
Sem dó do que talvez vá recompor
Na vida à qual me entrego a cada passo,
E nada do passado trama o braço
Aonde se pusesse redentor
Caminho que destrói jardim e flor,
O amor que tanto quis agora escasso.
Escondo-me nas teias da fumaça
E vago pelo medo que ora passa
Trafego entre as estrelas, turva teia,
E quando novo trago; aspiro vejo
O beijo alucinado de um desejo
Que tanto quanto o medo me incendeia.

24847

E trago em cada trago, cada maço
Verdades absolutas ou mentiras
Às feras mais vorazes já me atiras
O medo que sincero agora abraço
Trazendo em cada verso um falso laço
A minha vida exposta em frágeis tiras
E quando como a Terra, rodas, giras
Causando a cada passo um embaraço.
Alegre sentimento que aqui exponho,
Mascaro o meu futuro que é medonho
Metaforicamente em luz sombria,
O quase perpetua o meu retrato,
Verdade nua e crua ainda acato
E faço do viver vã fantasia.

24846

O manto feito em pleno sofrimento
Decerto já não cabe em quem sonhara
Com noite bem segura e até mais clara
Depois da tempestade em fero vento,

E quando nos anseios me alimento
Não posso mais vencer quem escancara
A sorte como fora fria escara
E nela com certeza o meu tormento,

Do qual ao ter notícias faço enredo
E quando algum carinho a ti concedo
Concentro minhas forças e maltrato

Às quantas andaria a noite vã
Sabendo que talvez nova manhã
Despreze do passado este retrato.

24845

Martirizado eu sigo em noite imensa
E teimo entre as diversas emoções
Os sonhos que deveras ora expões
Traduzem no final a recompensa

De todas as esperas, desavença
Aonde se perdiam as noções
Trazendo tão somente as aversões
Ao quanto no vazio ainda pensa

Quem tanto procurou uma ancoragem
E sem se perceber fúria e voragem
Agora não decifra mais sinais

Dos vândalos caminhos que propostos
E são praticamente agora impostos
Expressando tormentos espectrais.

24844

A morte; eu sei, será tal recompensa
Que tanto me esmerara em conhecer,
A fúria do querer e não poder,
Diversa do que uma alma tola pensa
Expõe a negação feroz e imensa
Do quanto poderia, mas sem ter
Esgota no final o próprio crer
E dele sem saber não há quem vença.
Emergem-se demônios do passado,
O canto que pensara bem cifrado
Exposto nas vitrines, nada diz,
Somente o meu anseio refletindo
O quanto do vazio agora findo
E torna após a festa um infeliz.

24843

Farrapos do que fui molambo em vida,
No fogo que me queima, audaz e lento
Criando a cada dia outro tormento
A sorte não se mostra mais saída,

Herética vontade que me agrida
Mereço alguma paz? Nem mesmo tento,
E quando na tocaia espreito atento
O bote significa outra ferida.

No desacreditado passo em vão,
Apenas os degredos me trarão
Alguma tentativa mesmo insana,

Quem tanto se propôs em amizade
Agora ao ver que a vida se degrade
Também por força de hábito me engana.

24842

Ao ver a minha sorte já perdida
Depois de tantos anos sem poder
Acreditar no que não quis mais ver
O tempo sem futuro numa ermida
Criada pela angústia, envelhecida
Esta alma que talvez pudesse crer
No quanto se desdenha o próprio ser
Na estátua erroneamente e em vão erguida.

A lucidez se entorna em cada estrela
E quando me preparo para sê-la
Escondo-me deveras deste brilho
E teimo em desvendar qualquer promessa,
Bem antes que esta insânia recomeça
Tropeço em minhas pernas e me humilho.

24841

Eu bebo a tempestade num momento
E dela faço o mote preferido
Enquanto se acender fogo e libido
Nas ânsias do desejo me atormento,
Vivendo a cada dia novo alento
Mergulho neste espaço e decidido
Encontro o que pensara já perdido,
O gozo da alegria; sentimento.
Feliz quem tanto sabe o que mais quer,
Nos olhos delicados da mulher
O brilho extasiante se traduz
Na fúria de uma insânia consumida
E dela vejo enfim a minha vida
Repleta de esperança, medo e luz.

24840

Encontro no vazio o meu assento
E teimo entre as estrelas multicores
Sabendo que por onde queres, fores
Também irá contigo o pensamento,
E quando solitário, eu me atormento,
Vivendo os mais antigos dissabores,
Amargas ilusões matando flores
Deveras no final, eu me arrebento,
E ausente da esperança que vigora,
Não sei por que talvez ao ir embora
A sorte se refaça e deixe a luz
Entrar pela janela do teu quarto,
Dos sonhos e delírios se me aparto
Apenas a mortalha me conduz.

24839

A noite vai passando-se esquecida
Em meio às tempestades, temporais
E dele noutra senda transtornais
Vereda há muito tempo destruída.
Enquanto a nossa história se decida
Nas ânsias em tormentos, vislumbrais
Momentos entre lutas, divinais,
E deles talvez dor inda regrida.

E vós ouvindo ao longe o meu apelo,
E dele uma vontade de revê-lo;
Caminho feito em luzes do passado,
Descrevo o que deveras já não vedes
A sombra dos receios nas paredes
Demonstram o futuro degradado.

24838

A cada novo tombo, outra ferida
E dela não aprendo quase nada
A história se repete e desagrada
Quem tanto procurara uma saída

E vê o renascer da despedida
Enquanto outra esperança desfraldada
Traduz a podridão que assim degrada
Deixando à própria sorte, dividida

Seara onde talvez pudesse ter
Além do desvario do prazer
Um dia abençoado em nova esfera.

Mas sei que este vazio se recria
E deixa como rastro uma agonia,
Que aos poucos nova dor abriga e gera.

24837

Expondo a minha carne em sofrimento
Enternecidas noites não virão,
E quando vejo as chuvas de verão
É delas que ainda creio num alento,
Por mais que se mostrasse em vão tormento
O tempo aonde as horas mostrarão
Que tudo se fizera simples grão
Aonde em solo agreste ainda assento

Sabendo que cevar inutilmente
Colheita tão pequena se pressente
Ou mesmo a solidão da terra nua.
Assisto; um camponês sem esperança
Que à própria insensatez ora se lança,
À história que sem nexo continua.

24836

Vasculho estes resíduos na gaveta
E vejo este retrato, inútil cardo,
E tendo ainda vivo o velho fardo
Lembrança ressurgida; um vão cometa
Pegando ferozmente esta caneta
Quem dera se pudesse ser um bardo
Teria em minhas mãos, adaga e dardo
Por mais que este vazio se arremeta,
A sorte desvendada em novo rumo,
Trazendo os meus engodos que ora assumo
Revivo dissabor que ainda ensina
Decerto tal desvelo eu sei, mereço,
Justificando assim cada tropeço
Bem mais do que pensara em sorte ou sina.

24835

Castelo de ilusões, ruindo cedo
Não deixa qualquer sombra sobre a Terra
E quando a fantasia assim se encerra
Condeno-me ao vazio do degredo
Sabendo da emoção que ora concedo,
Aonde uma esperança se descerra
O medo de seguir, a vida emperra
E tudo se desvenda em vão segredo,
Encerro o meu caminho e já cansado,
Descrente do que fora um manso prado
Vislumbro apenas seca ou aridez,
Semeio contra toda expectativa
Por mais que a crença estúpida inda viva
Meu mundo à própria sorte se desfez.

24834

Escombros espalhados nas calçadas
Demonstram os fantasmas do que fomos,
Apenas do total, os meros gomos
Demonstram esperanças desgraçadas.

As hordas dos meus sonhos, estagnadas
Explodem no vazio que hoje somos
Erráticos cometas, falsos cromos,
Ostentam as mentiras mal traçadas.

Estranhamente estamos sem saída
O quanto se percebe e se duvida
Explode num perpétuo e vago nada

Assisto à derrocada desta insana
História que deveras quando engana
Prepara na ilusão, a barricada.

24833

Expresso em cada verso o que hoje sinto
Diverso do que um dia imaginara
Mergulho neste mar e na água clara
Descrevo a maravilha em puro instinto.
Nas ânsias desta insânia ora me tinto
E vejo o que talvez a alma pensara
Durante os devaneios. Já me ampara
A luz das ilusões, medo desminto.
Pereceram errôneos caminhares
Mas quando perceberes e notares
Altares do que fomos soerguidos
Das sombras dos temores, tu virás
Trazendo finalmente a mão audaz
Em sonhos previamente concebidos.

24832

Vulcão que fora intenso, agora extinto,
Não deixa que se pense em novo amor,
Percebo neste intenso decompor
As cores pelas quais já não me pinto,
Vencer as ilusões, ora pressinto
Talvez não haja um rito redentor,
Pudesse ter ao menos o calor,
Mas sigo sem pensar, vontade e instinto.
E quando a luz do sol já se apagando
O teto dos meus sonhos desabando,
À beira do terrível precipício,
Prenunciando o fim da nossa história
A sorte se mostrando merencória
Retorno ao meu passado desde o início.

24831

Estreitos os caminhos que persigo
Pedaços espalhados, ilusão
O tempo diz das horas que trarão
A cada amanhecer o joio e o trigo,
Viver a expectativa de um abrigo
Mostrando a mais completa divisão
Aonde poderia em diversão
Saber do que deveras não abrigo.
E sinto a me perder vela e pavio
E quando noutro senso eu fantasio
Estampidos diversos bomba e fogo,
Acendo esta esperança benfazeja,
Porém minha alma além do que deseja
Há tanto desconhece o fim do jogo.

24830

Não tendo mais sequer algum amigo
De que me valeria ter um sonho?
Ao menos cada passo aonde eu ponho
A sorte, na verdade diz perigo,
E tudo o que deveras já consigo
Traduz este momento em que medonho
Transcrevo a poesia que componho
Vivendo sem saber se ainda ligo.
Perpetuando a dor em vã espera
Olhar da fantasia, em luz tão fera
Esquiva-se do atento caminheiro,
E sabe muito bem fingir discórdia
Atento ao desmembrar de tal mixórdia
Das sendas mais escusas, já me esgueiro.

24829

As noites são vazias, ocas, nuas
E trazem aos olhares treva e medo
E a cada passo ainda em vão concedo
A sorte pela qual ao léu atuas,
Algozes de nós mesmos. Continuas
Vivendo do que fora noutro enredo
Além do que talvez não queira e cedo
Andando sem destino, tantas ruas.
Acendo outro cigarro e bebo mais
Encontro da esperança, os seus portais
E adentro sem saber se existe fim.
Mas quando te percebo noutra rota
A vida que sonhara se desbota
Matando o que restara dentro em mim.

24828

As facas entranhando, duras, cruas
Expondo a derme, os músculos e os ossos
Apenas do que fomos, vis destroços
E bebes das imagens que cultuas

Andando sem destino nestas ruas
Os pingos do passado, frios, grossos
E os erros cometidos, teus e nossos
Mesquinhas ilusões, e continuas.

Arquétipo do sonho, que ao revê-lo
Percebo no final um pesadelo
Sem justificativa que inda possa

Trazer à própria vida a funda fossa
Aonde se imiscui senso e loucura
Aonde a sorte insana a luz procura.

24827

As crias do meu sonho em desabrigo
Somente reproduzem dor e pranto
E quando se mostrasse em desencanto
O verso que cultuo; inda persigo
Vagando sem saber se algum perigo
Impeça o que talvez audaz eu canto,
Mergulho nas insânias; entretanto
Durante a noite vaga inda prossigo.
Senzalas do passado, tais algemas
Além do que em verdade não mais temas
Adentram minha casa e em tal sevícia
A morte talvez surja como escape
Na mão da fantasia este tacape
Exposto com temor, cruel malícia.

24826

Um resto perambula e não consigo
Trazer à vida a escória que inda sou,
E tudo o que deveras se mostrou
Completo desalento e desabrigo.
Ainda poderia, algum amigo
Mas nada do que fomos, pois restou
Atravessando a vida, quero e vou
Buscar após a curva o joio e o trigo
Arfante caminheiro vendo o fim
Da estrada pela qual entendo e vim
Vagando sem saber se tem saída
O beco que ora entranho em retrocesso
No passo descabido que não meço
Retrata o que sobrara de uma vida.

24825

Saber de outras galáxias, astros, luas
Percorrendo este etérea maravilha
Da fantasia intensa enquanto trilha
Acima das estrelas, belas, nuas,
E quando junto a mim também flutuas
Perceba quanto a vida já nos brilha
E toda sorte impede uma armadilha
Além desta esperança que inda atuas;
Desarvorada mente não mergulha
E sente a frialdade de uma agulha
Exposta em cada passo que quiser.
Ascendo ao infinito em cada verso
E sei no quão soberbo este universo
E um canto se perdendo assim, qualquer.

24824

Na negritude plena me perdendo
Noturna fantasia não sacia
E mostra renovada alegoria
O quadro sem retoques devolvendo

À dura realidade sem adendo
O tanto que deveras merecia
Quem ama e na verdade ainda adia
O sonho em suas mãos esmorecendo.

Escuta a própria voz e não percebes
Que ainda vão distantes velhas sebes
Por onde o caminheiro ouvira os hinos

Da Terra em agonia, seu lamento
E quando novamente te atormento
Nublando estes momentos cristalinos.

24823

O frio dentro da alma corroendo
Traçando esta acidez que nos deforma
O amor jamais conhece lei ou norma
E sabe que o prazer é dividendo,
Olhando para trás já não desvendo
Sequer o que a ilusão ainda informa
Moldando no pressente esta reforma
Tramando o que deveras não atendo.
Assiduamente busco uma saída
No etéreo labirinto feito em vida
A cada novo dia, um outro enigma
Proposto pela esfinge da emoção
Sabendo das angústias que virão,
Marcado em ferro e fogo, vão estigma.

24822

Esparsos os meus passos sem pegadas
Adentro os túneis vários da ilusão
E sei que novos tempos mudarão
As sinas e os desvios das estradas,
As horas que procuro; malfadadas
Entranham esperança e confusão
E sei que tantas mágoas mostrarão
Ferrenhas emoções abandonadas.
Escrava do talvez uma alma espera
Aquém da força intensa da quimera
Exposta em noite estúpida ou sombria
As cores da raríssima alvorada,
Sabendo que afinal não terá nada
Tampouco o sol que ainda fantasia.

24821

As horas vão passando, simplesmente
E delas nem notícias no futuro
No quanto imaginário me procuro
O todo que conheço, volta e mente.
Por mais que tanta dor inda atormente
E mostre a cada passo um vão escuro
Exploro os descaminhos e perduro
Momento talvez tosco ou envolvente.

Uma alma se embeleza em mansidão,
Porém outros caminhos mostrarão
O fim inevitável desta história
Enquanto reluzindo em lua calma
Percebo que talvez uma torpe alma
Expresse esta verdade merencória.

24820

E o vento da ilusão, tão envolvente
Tomando a nossa vida num instante
Aonde se pudera deslumbrante
Verdade se aproxima e me desmente,
Felicidade inda estando ausente
O vento do passado, delirante
Impede que prossiga e siga avante
Da sorte e do porvir sigo descrente.
Amar e ter nas mãos o meu destino,
E enquanto neste intento eu me alucino
O barco se perdendo em vil deserto,
Manter um cais seguro é o que me importa,
Mas quando vejo assim, distante a porta
Do fim das ilusões, já nos alerto.

24819

O outono que recebo como herança
Adentrando este inverno inevitável,
O quando desejara mais amável
Não resta nem sequer mera lembrança,
Olhar que no horizonte em vão descansa
Prenunciando o gozo interminável,
Apenas um delírio descartável
Procela se resume em água mansa.
Senhoras da alegria e da tristeza,
As horas enfeitando a pobre mesa
Augúrios passageiros, maus presságios
Dos juros, dividendos; os deságios
Não causam mais sequer uma surpresa
Apenas me preparam os naufrágios.

24818

Do quanto me envolvi numa esperança
Encontro os meus fantasmas e os devoro,
O quanto neste intento me demoro
Permite o renascer de uma lembrança
A vida sem temores quando alcança
A paz na qual decerto eu me decoro
Na límpida expressão de sol e cloro
O mundo meu propõe uma aliança.
Vencer os meus antigos preconceitos
Embalde enquanto medos são desfeitos
Luzindo estrela guia ao fim da tarde
Moldando nova noite em festa e riso,
“Palhaço da ilusão” quero e preciso
Da luz que o fim da vida inda retarde.

24817

De estrelas reluzindo em madrugadas
O céu se emoldurando traz à espera
O bote audacioso da pantera
Em meio às fantasias desfraldadas

Esperanças no cerne destroçadas
Negando desde sempre a primavera
Na fúria intempestiva da quimera
Histórias muitas vezes mal contadas.

E tudo não passando de ilusão
Que bebo, mas os dias mostrarão
Que tudo sendo em vão, nada haveria

Sequer uma alegria ou mesmo a luz,
Estúpida fornalha que seduz
Enquanto gera medos e agonia.