terça-feira, outubro 31, 2006

Paranóia

Concebo frios versos sem sentido...
Esmerando-me, atroz, procuro cismas...
No mar que sem tormentas nunca abismas,
Olhar tenso, pretende estar perdido...
Houvesse tanta voz, vaso partido.
Meu mar sempre teria cataclismas,
Nos pântanos permeio convertido,
As vozes intercalam mil sofismas...
Nos pares e patentes, vou pendente,
Esquizofrenicamente desejo.
Clavículas quebradas, absorvente
Famélicas dentadas pedem beijo...
Não falo me consolo e nem versejo...
Se tento me detenho e vou doente...

Augustos Anjos

Todo caos, precedendo meus arranjos,
Me traz as esperanças do conserto.
Nas vozes, nos ouvidos, versos, banjos.
Orquestras desafinam meu concerto...
Os olhos minhas asas, velhos anjos,
Pressinto que não posso descoberto.
Os prazos e memórias, desarranjos.
O céu que se nublava vai coberto...
Augustos, vários anjos e pecados...
Ao gosto de fiel caricatura...
Agostos e setembros versos, fados...
Meus desejos espelham criatura.
Quem me dera, segredos finos, brados,
Nos augustos arcanjos, alma pura...

Tanto tempo

Tanto tempo procuro por paragens,
Onde encontre descanso sepulcral...
Depois das ancestrais, torpes viagens,
Buscando meus caminhos neste astral,
Meus rios e meus mares, ondas, margens,
Espreitam por penhascos... Espectral
Reflexo desvirtua tais aragens
Que vagaram deserto magistral...
Criança sepultada no meu peito,
Olores putrefatos exalados...
Meu próprio funeral será perfeito.
Das ondas emanadas esotéricas...
Mulheres que deixei, virão histéricas
Amores que não foram bem cuidados...

Meus olhos venalmente esfumaçados...

Meus olhos venalmente esfumaçados...
No quarto que decifro minhas lendas.
Febrilmente, revelo os embaçados
Amores que mortalhas sem ter prendas...
Não permitindo tempos disfarçados
Nem os templos que abrigam tais contendas.
Nossos braços, num mar, entrelaçados,
Bocas que nos cuspiram, nunca ofendas...
As febres delirantes paralíticas...
As rochas que tombamos, monolíticas,
Os medos tatuados nossas almas...
As mortes que vivemos por lazer
No fundo não nos trazem ermos traumas,
Deveras, confundimos com prazer...

Aurora terminando, a vida passa...

Aurora terminando, a vida passa...
A morte desafia e me persegue...
Quem fora caçador, se encontra caça,
Na fonte que se seca, vou entregue...
A vida se cansando, sangra, lassa...
Não haverá ninguém que me carregue,
Nos templos divinais, já se esfumaça
Qualquer que seja o sonho que se apegue...

Aurora derradeira, vislumbrada,
Não deixe meus retalhos no caminho...
A vida que passei, tão deslumbrada,
Sem lume vai secando meu jardim...
O tempo que tempera seca o vinho...
O mundo que remando, morre em mim...

Liberdade

Liberdade, sangrenta podridão,
Qual sarnenta cadela mata a cria...
Resvalando em demência e solidão
Naufragando oceanos, fantasia...

Liberdade baseia escravidão,
É morte que delira-se na orgia,
Penetrante, profundo vergalhão,
É noite que invernosa, finge estia...

A Morte, companheira libertária,
Galgando seus cadáveres e lamas,
Sempre a te procurar, totalitária...

Liberdade teu nojo glorifica
Pedes carnificinas, cortes, chamas,
Mas somente teu canto santifica!

As negras gralhas, resolutas pragas...

As negras gralhas, resolutas pragas...
Agourentas tempestas e mordazes...
As noites vagueando, tornam vagas...
Os mantos que devoram, finas gazes,
Não posso percorrer luares, plagas,
As vastas cordilheiras incapazes
As gralhas verdadeiras nunca afagas,
São corvos que crocitam mais audazes...

Mortalhas que me vestes, negra gralha,
Defiro meus rancores e meus versos...
A cama que me deste, vil canalha,
Cosida com meus nervos e tendões...
Busquei a liberdade, tons diversos,
Cuspiste ferozmente corações...

Nas minhas celeradas despedidas,

Nas minhas celeradas despedidas,
Em meio a tantas formas já se esgarça...
As portas destroçadas, destruídas...
Lágrima descritiva olhar esparsa.
Nos epitáfios trazem torpes vidas,
A carpideira sorte não disfarça.
Meus restos perambulam avenidas...
Quem fora delicada e mansa garça
Olhares sorrateiros, fés carpidas...
Viés tantas balanças quanto cardos...
Não pude discernir qual fora a fonte...
Os versos embalando velhos bardos,
O pranto se decifra em mãos algozes...
Não posso recuar: ouço tais vozes,
Os olhos vãos, perdidos, horizontes...

Tantas vidas perdidas

Tantas vidas perdidas, vãs, insanas...
Sou grato por poderes que me dás.
Nos medos que navegas e me explanas,
As rosas dos jardins que me darás...
Tumores meus, nefastos minhas ganas,
Mordaças que não podes, mas trarás...
Flutuas nos meus sonhos, nas campanas,
Nos jogos que pretendo ser teu ás...
Ganindo, o coração desfeito em brasa,
Vicias meus desejos, vagos sensos...
A cama que delito em tua casa...
Humílimo pretendo teu perdão...
Amores que iogados, teus incensos,
Vai da maternidade até caixão...

Nossa morte, reflete essa ventura.

Nossa morte, reflete essa ventura.
Esperanças desfeitas embrutecem..
Os braços esperando uma ternura,
Meus medos vagas teias, vidas tecem...
Amiga, não me espere noite escura,
Cabelos, bocas, olhos envelhecem...
Na noite que não somos, caradura,
Corações e memórias envilecem...
Assemelhas miasmas e delírios.
Nas gamas infindáveis de solvências.
A morte não denota meus martírios...
Os campos constelares sem sementes...
Nossa morte, envolvida em coincidências
Permuta-se esperanças de descrentes...

Esquartejado

Esquartejado, coração, maldito...
Escória do humanismo, vil demente...
Utópico, repete velho rito,
Amor que não propaga sempre mente...
Esquálido persigo, vou aflito,
Rastejo meus pecados, vil serpente,
Nos guizos das senzalas, o meu grito.
Nos solos destroçado, sou semente...
O monstro varizento da minha alma,
Devora esquartejando essa couraça;
No fundo sou prudente, peço calma,
Mas regozijarei cada segundo,
A vida destruindo a carapaça
Um verme passeando pelo mundo...

labirinto

Quantas vezes, procuro em vão, faminto;
Pelos campos, florestas e cascatas,
Nas estradas terrível labirinto...
A lua refletindo suas pratas
Vai, enorme, acendendo meu instinto...
Penetro vagamente pelas matas...
Mas, embalde, vasculho e nada sinto
Meu cavalo cansado, fere patas...
Vestido de esperanças já me canso...
Se neste labirinto, nada encontro...
Meus destinos, meus rumos, não alcanço...
Minha alma vai seguindo, alma às escuras...
Labirinto d’amores, desencontro...
Encontrarei caminho, nas alturas...

As musas

As musas sequiosas dos amores,
Procuram pelos faunos indecentes...
Nos lagos desnudadas, belas flores,
As ninfas se entrelaçam bocas, dentes...
Penetram tantas línguas sem pudores,
Meus olhos delirantes pois descrentes,
Misturam alaridos, gozos, cores
Percebo meus desejos mais dementes...

Quem dera se pudesse, sagitário,
Em meio a tantas bocas, seios, sexos...
Feneço neste bosque lampadário,
Espreito tais bacantes, plena orgia...
No lago refletindo tais reflexos,
Especular imagem da alegria...

Esperança

De que me valeria canto e lira
Se não pude saber de nossas luzes?
O manto que te cobre, feito em tiras,
Me pesa com poder de várias cruzes...

Meus gozos e festanças são mentiras,
Caminhos não prossigo, tantas urzes...
Por tanto que fizemos, não me firas.
Não restam meus desejos, teus obuses...

Mundo, é mister que sejas meu amigo
Não posso descobrir as armadilhas...
Quem dera se soubesse do perigo...

Espero calmamente meu sepulcro,
A vida traz delícias como em ilhas...
Esperança: alavanca, vida é fulcro...

Minha alma aprisionada

Minha alma aprisionada nos teus sonhos...
Vetusta e tão austera, morre encantos...
Os olhos que te miram, mais tristonhos
Servis, esperarão teus mansos cantos...

Os dias que passei, tão enfadonhos,
Decerto se tornaram belos, santos...
Matando pesadelos vis, medonhos...
Num átimo, se tornam acalantos...

Para amores, sonhares, fabulosos...
Minha alma aprisionada em teus desejos!
Perfumes delicados, olorosos,

Navego nos teus braços sem ter medo...
Minha alma procurando por teus beijos
Descobre, desta vida, seu segredo...

maldições

Mãe, sorrateiramente, maldições
Maldiçoas caminhos me amofinas...
Não vieram de ti, bem sei, senões,
Mas as pernas que me deste, vãs, finas,

Não podem resistir às solidões,
Nem podem libertárias, libertinas,
Não vivem sem celeumas nem perdões.
São vagas, minhas almas lamparinas...

Ignota, imbecil ou ser venal.
Vazio estapafúrdio, quase zero...
Meu mundo que não pude nada quero,

Resumo num recorte de jornal.
Não sirvo nem talvez de calendário...
Quem sabe encontrarás no obituário?

Lancei ao fogaréu toscos desejos,

Lancei ao fogaréu toscos desejos,
Carcaças e caraças, velhas cismas...
Os olhos chocalhando seus lampejos.
Nos medos carregando torpes prismas...
Pergaminhada pele segue em pejos;
Mergulho no oceano que me abismas.
Me rompem madrigais e cacarejos
Distantes as palavras, servem crismas...

Meus ossos esfalecem mesmo em vida,
Destroços que falecem pouco a pouco...
Restando meus segundos de partida.
O mundo me relega a vil carcaça...
Semeio tempestades, corro louco,
Devoro tantos raios nesta praça...

A morte

A morte, minha esquálida parceira,
No beijo que tortura pede lábios...
Fugindo deste vulto a vida inteira,
Perdendo meus caminhos, astrolábios...

Vencido postergando esta videira,
Não posso disfarçar amores sábios...
Procuro por vingança a companheira,
Jamais encontrarei nos alfarrábios

Nos livros de magia ou de presságios.
A morte não permite tais saídas...
Nos olhos, nos momentos, nos adágios,

Pedágios que pagamos, nossas vidas...
Não posso pressupor, isso alucina...
A morte qual a vida é luz divina!

Lambias, sorrateiro

Lambias, sorrateiro, todo o chão,
Venenos e vermífugos, verdugos.
Tão servil, adubavas o porão
Comias as espigas e sabugos.
Amores que vivera, lassidão...
Fermentos e fecálicos expurgos,
O cheiro das entranhas, podridão!
Serpenteando ruas, valas, burgos...
A noite em suas plêiades luzentes,
Trazia uma esperança de melhora.
Os braços dos canalhas envolventes,
Os vermes das vermelhas carnes podres...
Vivendo nos barracos toldos, odres...
A morte se prepara, santa, aflora...

Descoradas roseiras

Descoradas roseiras, vã procura...
As trevas negrejando toda luz...
Não posso completar a noite escura,
O campo da discórdia serve a cruz...

Nossa bandeiras vestes da candura,
Nesse momento audaz, clamam Jesus.
O rumo dos remendos da ternura,
Não vencem nas estradas cada pus...

Mentiras e verdades são dolentes,
São plenas dos repastos dos demônios...
Nascemos navegando sim, mecônios...

Morremos nossos ares nos pulmões.
Os gestos mais noturnos, indecentes,
Soturnos, vasculhamos os porões...

Amor cuticular

Amor cuticular, guerrilha e gládio...
Esfomeado, come a própria amante,
Devora não deixando nem estádio,
É força que não cansa, delirante...
Temores desse amor:lítio, vanádio,
Verborragicamente está diante
Do que demonstrará notícia e rádio.
Me jogará ao chão: forte bastante...
Amor cuticular, estranhas unhas...
Coração decoravas com venenos...
Os medos e os saldos são pequenos,
Tacanhos os lugares onde punhas
Os barcos naufragados nos serenos...
As luas e os vermes, testemunhas...

subterrâneos d’alma

Nos subterrâneos d’alma vivo cético
Não creio nos miasmas nem nas almas...
Na vida tal qual morte, um verter ético
Não podem transfundir lamas nem calmas...

Entretanto sentidos mais estéticos
Me permitem sorver meus velhos traumas,
Trazendo meus fantasmas epilépticos.
Revejo nos escombros ratos, palmas...

Nas convulsões terrestres, pessoais,
Nos olhos explodidos nos orgasmos
As sombras dos desejos canibais,

Os vermes que passeiam nossas bocas,
Seus ovos, suas larvas, restam pasmos:
Estômagos, esôfagos são tocas...

Inexoravelmente voltarás!

Inexoravelmente voltarás!
O tempo me deforma e te conquista.
Nada mais do que fomos restará,
A não ser tempestade que resista
Por entre tamarindos, ananás
Vergonhas de deixar a menor pista...
Leio nos teus jornais tempos atrás,
Que de mim nada mais nem sombra e vista...
Os meus segredos frágeis, necrofágicos,
Formam um mausoléu que já cultuas...
Os olhos demarcando são pelágicos,
Os tempos se trafegam necrológicos.
As formas que deformas, carnes cruas.
No coquetel vermelho, tons ilógicos...

podres testemunhas

Que fazer senão podres testemunhas
Sequiosas sorvendo cada gota?
As noites tenebrosas que compunhas,
Aspergindo teus cancros, viva, rota...
O cérebro e meus olhos, decompunhas,
Cada qual removido cota a cota;
As tuas mãos ferinas sim, expunhas
Do meu crânio, ossos, tecas, calota...
Emulsificar todos elementos!
Transformar tudo em pasta digerível...
Os óleos, tuas presas, meus tormentos...
Amar quem me destrói, é fato incrível.
Mas do que poderão meus pensamentos:
Renovação? Fator indiscutível!

Ladravas

Ladravas pelas noites, solitário...
Nas guias agonias e canções.
O medo me acompanha, é tão sectário,
Nos versos universos e verões...

Amor que te protege, mais notário,
Não permite mentiras nem versões...
Nas dores e nos prantos, solidário.
Temores e maus tratos, seus perdões...

Lambias minhas mãos, tão carinhoso,
Vibravas com meus feitos, minha glória.
O tempo te trazia venturoso.

Amigo que não nega todo amparo...
Por vezes da tristeza sentes faro,
E mudas, sem querer, meu rumo e história...

símicos

Tanta vida caminha minha vida,
Nas entranhas bactérias, vírus, vermes...
Verdades e mentira vã, curtida
Com gosto e paladar, seres inermes...

Carrego metagêneses bisonhas;
Vestígios braquiais, formas vorazes.
Espécies diferentes, vis,medonhas,
Cravam intestinais lanças audazes...

Meu sangue coagulam, bebem, lavam.
Na boca decompõem ácidos láticos.
Nos beijos e mordidas mais enfáticos...

Fermentam seus venenos e me cravam
De toscos resultados vivos, químicos...
Meus órgãos membros, tolos, símicos...

espécie canibal

Os homens e mulheres ancestrais,
Caminham pelos cérebros remotos...
Seus nomes espelhados nos varais,
Os portos que viveram sequer fotos...

Ondeio não odeio nem sei mais,
Já não repetirão perpétuos motos
Os homens verbalizam animais
Nos olhos rebeldia e terremotos...

Mercenários, guerreiros e tacapes,
Nas guerrilhas vivendo seus escapes,
Escalpes e merendas sangue e sal...

Os lobos e raposas sobressaltam
Fome e voracidade sempre assaltam,
Os olhos desta espécie canibal...

A morte, p’ra quem vive, é sempre o preço!

Dos filhos que geraste mais vorazes,
As larvas, os insetos, as serpentes...
Nas bocas e peçonhas não te aprazes,
Os olhos, as mandíbulas, vertentes...

Demonstram toda força, são audazes,
Nos mundos variáveis oponentes
Traduzem mais banais os mais tenazes
As fomes deflagradas, vermes, dentes...

Os falsos mergulhões temem segredos,
Invadem superfícies sedentos...
As patas tremulantes, ânsias, medos...

Não temo se não sinto ou se conheço...
Reflexos medulares, mortos, lentos...
A morte, p’ra quem vive, é sempre o preço!

A noite dos amores

A noite dos amores, densa e bruta,
Não permite perfumes nem de rosas
Amar, renunciar à tensa luta,
Não posso receber as mãos nervosas

Nem templos esculpidos nesta gruta,
Coração, responsável por sedosas
Ilusões... Quem me dera a nova escuta
Trouxesse esses meus sonhos, lendas, prosas...

Amor que não perdoa me constrange,
Não deixa essa pobre alma libertária.
Amor nas nossas guerras, qual falange;

Nos pícaros febris, mais alto encerra...
Noite que não permite luminária,
Estrela apaixonada pela Terra...