quarta-feira, agosto 30, 2006

A cada tempo...

No tempo do meu sonhar,
Tempo que vai tão distante,
Procurando a todo instante,
Por tempo, espaço e lugar,
Acreditando passar,
A temporada da vida,
Numa luta divertida
No meio da tempestade,
Trazendo amor de verdade,
Sem ter lágrima sentida...

Tempo me traz essa brisa,
Onde o coqueiro balança.
Traz um guerreiro com lança;
A mão nesse mar que alisa,
O riso da Mona Lisa,
O medo de não prosseguir,
Meu tempo de tempo vir,
Nos contratempos sem medo,
A vida faz arremedo,
Do tempo que já perdi...

Não sei dessas temporadas,
Que a criança guardou,
No tempo que era d’amor,
Agora são massacradas,
Bandas da vida, guinadas,
Nas grinaldas me lancei,
Tanto tempo eu já passei,
Mas não me deixaste em paz,
Tanto tempo fui capaz,
De tentar o que não sei...

Versos trago sem tempo ter,
Tempo tenho pra sonhar,
Temporais para chegar,
Onde teimo me entreter,
Saberia sem saber.
Não vivo sem temporais,
Quero muito e tento mais,
Não sossego com tão pouco,
Tampouco gritando rouco,
Tempo, preciso demais...

Na curva da temporada,
Que passei lá nas Gerais,
Tempo templo até me traz,
O que julguei emperrada,
A sorte já vai danada,
A morte é mote sem fim,
Quero tempo para, enfim,
Firmar o meu pensamento,
Que transforma todo vento,
Tempo que pedi pra mim...

Meus cadernos tão antigos,
Me perco nas espirais,
Num jazigo, aonde jaz,
Os meus sonhos são castigos,
Tempo me aponta os perigos,
Curvando nesse meu lago,
Onde meu tempo eu afago,
Onde não tenho porque,
Quero já ver e vencer,
O meu tempo anda tão vago...

Teimoso sei não caço,
Rãs perdidas no brejo,
Amores lá d’Além Tejo,
Nas vilas perdi meu laço,
Vencendo enfim, meu cansaço,
Quero fazer o meu canto,
Trazendo com tempo encanto,
Nos vales quero profundos,
O melhor de tantos mundos,
Teve tempo pro meu pranto...

Um desejo trem gigante,
Que na vida tem tempero,
Fazer amor com esmero,
Pela vida radiante,
Estando só por instante,
Nos braços da minha amada,
Passando essa temporada,
Deixando o tempo prá trás,
Meu tempo de não ter paz,
Procurando nova estrada...

Tempo de ser mais feliz,
Tempo de ter esperança.
Tempo de ser tão criança.
Tempo que o tempo não diz,
Tempo de ser aprendiz...
Tempo de não ter mais medo,
Tempo de guardar segredo,
Tempo de se ter saudades,
Tempo de dizer verdades.
Tempo que faz meu enredo...

Nesse mundo fugaz, meu maior vício

Nesse mundo fugaz, meu maior vício,
As minhas mãos descem marginais,
Te buscando na veia, quero mais...
És o princípio, desde meu início...

Amor que não se julga, sei fictício,,
Aquele de promessa do jamais,
Aquele que enfim, tanto fez e faz...
Não deixando restar nem mesmo indício...

Viciado, portanto, sem ter cura,
A mão divina deixa a mata escura.
Eu tenho essa criança dentro em mim...

Porém sem aconchego do carmim
Dos lábios que beijei, num sem ter fim...
A tua ausência, amada, me tortura...

Trovas - Temperos

Eu só quero seu tempero,
Misturado na panela.
Meu amor é verdadeiro,
Tanto amor tenho por ela...

Tem a delícia do sal,
No tempero do churrasco.
Bolinho de bacalhau,
Por essa moça eu me lasco...

O sabor de cheiro verde,
Temperando essa morena;
Depois deitado na rede,
Da saudade tenho pena...

Um maço de cebolinha
Temperou o nosso amor,
Depois ela vem, s’aninha,
Esquentando meu calor...

Da salsinha que tempera,
Dá sabor para a comida;
Coração batendo fera,
Temperando nossa vida...

Alho com beijo na boca,
Não combinam na verdade,
Amor al dente, faz louca,
Aquela tranqüilidade...

A cebola no meu bife,
Dá um gosto especial,
Não me chame de patife,
Esqueça esse carnaval...

Noz moscada é o seguinte,
A comida fica boa,
Tem mulher pra mais de vinte,
Tem menina e tem coroa...

Pimenta deixa arretada,
Qualquer comida baiana,
Meu amor, de madrugada,
É gostoso, se sacana...

Erva doce dá tempero,
Na broa fica um encanto.
Amorzim, me dá um chêro,
Senão vai rolar meu pranto...

Mostarda na minha pizza,
Naquela de quatro queijos.
Meu amor vê se m’atiça
Na delícia dos teus beijos...

Catchup tem seu gosto,
Por demais adocicado;
Me deixa beijar teu rosto,
Deixando, fico empolgado...

Um limão cai bem no peixe,
Dá um sabor delicado;
Meu amor nunca me deixe,
O resto deixa de lado...

Se quiser, coentro, te trago;
Ajuda no temperar,
Quero a paz desse teu lago,
Aprender, nele, nadar...

Pimenta do reino traz,
Sabor a mais no salame;
Meu amor vou ser capaz,.
De tudo desde que m’ame...

Se tempero enfim, faltou,
Perdão te peço, querida.
Tanto amor que temperou,
Temperando minha vida...

Quando a minha montanha de desejos

Quando a minha montanha de desejos,
Num momento infeliz, desmoronou;
Nada, a não ser entulho, me sobrou.
Como fora gentil saber teus beijos!

Mas dessa sinfonia, poucos arpejos,
Nem isso mais resta, tudo acabou!
Depois que tudo acaba, quem sou?
Procuro, perguntando aos realejos...

Morenos, os teus olhos, vão sem rastro;
Pergunto por teu colo d’alabastro,
A resposta, nem vento, sabe dar...

Quem dera Deus, pudesse te encontrar,
Mas nem o pó d’estrada, nem o ar,
Meu mundo vai perdido, sem seu astro...

Joao Polino - O mar é azul

O mar é azul, e isso ninguém pode negar. Acontece que, em Santa Martha, distante do mar e próximo da montanha, essa realidade traz fantasias maravilhosas sobre o tamanho, a cor e o sabor salgado da imensidão marinha...
João Polino ,meninote ainda, resolveu ir sozinho ao Rio de Janeiro. Coisa quase impossível àquela época, nos anos trinta. Estradas de terra sem nenhuma pavimentação, teria que ir a cavalo até Alegre e depois pegar um ônibus que o levaria à cidade Maravilhosa.
Mas nada é impossível quando os sonhos são grandes e a força de vontade maior ainda, e esse era o caso do nosso herói.
Num dia de domingo, nos idos de março, montou o seu cavalo, prometendo trazer a água do mar, pelo menos um cantil, para a sua amada irmã e quase mãe Oracina...
Dias longos e difíceis nas costas de um cavalo cansado e envelhecido, um verdadeiro rocim quixotesco, iam os dois, o jovem cavaleiro e o velho animal descendo a serra do Caparaó.
Dinheiro? Quase não levava, o bastante para pagar as passagens de ônibus entre Alegre e o Rio de Janeiro. Coragem muita, dono dos fantásticos e irresponsáveis dezesseis anos de idade.
A noite trazia as suas armadilhas e era melhor dormir, deitado sob a luz da lua e ouvindo a sinfonia de grilos, sapos e corujas. Claridade, somente a dos pirilampos que povoavam os sonhos do nosso amigo.
Passa-se o primeiro dia, o segundo e no terceiro dia da aventura, o imprevisível aconteceu. O cavalo, cansado da viagem, deitou-se e não mais se levantou.
O que fazer? Como poderia seguir adiante?
Para sua sorte, estava próximo de Alegre, deixara Celina para trás e a serra agora estava acabando, numa descida cheia de curvas e desesperanças...
Voltar atrás seria a decisão de qualquer um mas, quem disse que João Polino era qualquer um?
Herói que se preza não pode temer intempéries nem dificuldades e, promessa feita era para ser cumprida.
Faltavam poucos quilômetros para chegar em Alegre e isso era o bastante.
Mas, o dinheiro que levava não daria para a volta, já que teria que comprar ou, pelo menos, alugar um outro corcel.
A decisão cruel, embora a única possível, se apresentou. Teria que comprar um cavalo em Alegre e reiniciar a viagem, de volta...
Mas, pensamento rápido como o de João era raro e, teve uma brilhante idéia.
Água azul, mar azul, água salgada e mar salgado...
Oracina não perdia por esperar!
Numa vendinha no centro de Alegre, João resolveu os seus problemas.
Comprou um tablete de anil e um quilo de sal.
A água poderia ser do rio Norte mesmo, o cantil esperava a água marinha...
Não deu outra, três dias depois, Oracina tinha em suas mãos a mais legítima água azul e salgada do mar nas suas mãos...

Cordel - A minha sina - capítulo 6 - O Bosque Solidão

Passando essa confusão,
Vendo que tava lascado,
Um caminho disgramado;
Minha triste maldição,
O danado capetão,
Num ia deixar barato,
Nem correndo para o mato,
Nem correndo pra diabo,
Minha vida vai ter cabo,
Na beira desse regato...

Fugindo e correndo tanto,
Não queria nem assunto,
Prá terra dos tal pé junto,
Eu num quero virar santo,
Nem quero encontrar encanto,
Mas num tem como escapar,
Se o troço se complicar,
Como vou fazer nem sei,
Nessa confusão, entrei,
Vamos ver no que vai dar...

A terra tem muita liça,
Tem fome de dar com pau,
Cantando o pinica pau,
A coisa toda se enguiça.
Muita gente tem postiça,
A dentada de morder,
Eu juro que quero crer,
Em meu padinho de fé,
Vou correndo vou a pé,
Só num quero, então, morrer...

Nos braços de Jericó,
Vou montado num jerico,
Não tenho outro pro bico,
Minha vida é lida só,
Amargando qual jiló,
Não tem muito jeito não,
Procurando solução,
Fui procurar descanso,
Nas bandas doutro remanso,
Mas descanso é ilusão...

Chegando na mata agreste,
Correndo da assombração,
Desse tal de capetão,
Encontrei cabra da peste,
Que nem centavo que reste,
Valia para pagar,
Mas quem houvera encontrar,
Numa hora delicada,
Qualquer que seja essa enxada,
O que quero é capinar...

Companheiro Virgulino,
Casado lá com Marina,
Deixando da minha sina,
Me disse do desatino;
Te vira com teu destino,
Nessa nem posso falar,
Quem mandou se complicar,
Eu te dei o ajuntório,
Mas agora, no cartório,
Marina quer se casar...

A bichinha tá buchuda,
Num posso deixar de lado,
Você que é muito tarado,
Vai ter que buscar ajuda,
Na terra do Deus m’acuda,
Que fica por outra banda,
Nos reisados de Luanda,
Onde a curva faz o vento,
Nos grotões do esquecimento,
Onde Judas tem quitanda...

Eu montei no jumentinho,
Das asas fiz seu arreio,
Me empaturrei de centeio,
No meio desse caminho,
É só seguir direitinho
Que no final dá em nada,
A vida traz enxurrada,
É só se deixar levar,
Aprendendo a navegar,
Em barro e terra molhada...

Fiz caminho de três luas,
De galope e de pinote,
Encontrei um molecote,
Que me disse então das suas,
Seguindo por essas ruas,
Ladrilhadas de brilhantes,
Com pegadas de gigantes,
Para o meu amor passar,
No bosque vai encontrar,
Um anjo de diamantes...

Seguindo pela alameda,
Passando pelo matão,
Um anjo de coração,
Queimando na labareda,
Me mandou pela vereda,
Ponteada de luar,
Chegando a comemorar,
Cada alma que passava,
Pertinho, eu acho, que tava
Daquele bendito lugar...

Era a minha salvação,
Encontrar Deus me acuda,
Pra sair dessa rabuda,
Não tem outro jeito não,
É deixar meu coração,
Seguindo nessa procura,
Vasculhando noite escura,
Procurando pela sorte,
Prá fugir da minha morte,
Criando essa criatura...

Depois do tal Solidão,
Como se chama esse bosque,
Para que nunca se enrosque,
Travando o coração,
Anjo é famoso ladrão,
Tive que cair n’estrada,
A noite enluarada,
Ajudava no caminho,
Tenho que ir bem sozinho,
Senão não vai dar em nada...

Nem cheguei a dar dois passos,
Uma coisa me parou,
Meu coração caducou,
Não quis sair dos compassos,
Naquele anjo os abraços,
O coração quis trocar,
Não queria me deixar,
Seguir a minha viagem,
Pensei logo na bobagem,
Eu não podia esperar...

Deitado naquela rua,
Nas pedrinhas tão cheirosas,
Pareciam ser de rosas,
Uma linda mulher nua,
Me dizendo: sou sua,
Não podia resistir,
Como é que iria partir,
A vida estava marcada,
Pois, naquela madrugada,
Eu não podia sair...

Meu compadre Virgulino,
Já tinha me alertado,
Preu tomar muito cuidado,
Com tal bosque cristalino,
Esse anjo, de desatino,
Tinha feito muito estrago,
Coração deixava vago
Nem deixava respirar,
Matando bem devagar,
Sangrava fazendo afago...

Eu caí da montaria,
Abracei essa mulher,
Seja o que Deus quiser,
Pelo menos por um dia,
Vou deixar a fantasia,
Dos meus sonhos me levar,
E depois vou viajar,
Sem nunca mais ter paragem,
É preciso ter coragem,
Vou, então, me encorajar...

Um perfume diferente,
Chegou de leve, na boca,
Não posso dormir de toca,
Mas não há quem mais agüente,
Envolvendo toda gente,
Nesse tamanho desejo,
Naquela boca dar beijo,
É sentir que está no céu,
E depois tirar o véu,
Nessa peleja eu pelejo...

Mas nem beijava direito,
E depressa já sentia,
Uma ventania fria,
Uma dor dentro do peito,
Reparando bem direito,
O que parecia um anjo,
Como da viola o banjo,
Ficou coisa diferente,
Meu peito deu na corrente,
Como então, que eu me arranjo?

Uma risada safada,
Bem conhecida por mim,
Com aquela voz chinfrim,
Uma voz bem debochada,
Soltou uma gargalhada;
Foi, então que eu reparei,
Desde a hora que cheguei,
O bosque da Solidão,
Só queria o coração,
Depressa então, eu saquei,

No bornal que tava ali,
O meu punhal de dois gumes,
Acostumado em costumes
De sangrar ali e aqui,
Nesse mesmo instante vi,
O peito da desgraçada,
Aberto, na buracada,
Que aprendi a fazer,
E lá dentro eu vi bater,
O coração da danada!

Meti a mão num segundo,
Arranquei numa mãozada,
Do peito dessa safada,
E vazei correndo o mundo,
Deixei esse bosque imundo,
Sem ter pena nem ter dó,
Eu fui correndo mais só,
Do que nunca tinha feito,
Coração ranquei do peito,
Nessa estrada como pó...

Aquela risada esquisita
Depois me lembrei direito,
A danada tinha o jeito,
Da risada da maldita
Daquela vaca e cabrita
Da mulher do capetão,
Foi nesse momento então,
Que vazei no capinado,
Nunca mais voltar pros lado,
Do tal Bosque Solidão...

O frio traz Regina e chocolate

O frio traz Regina e chocolate,
Minhas mãos procurando por você,
Somente encontram vagos sem por que,
Esse frio aumentando, tudo abate...

Só queria saber, a vida late,
Desavisada a mente me faz crer,
Que nunca mais irei, ao menos, ter
Os carinhos que esquentam, nem chá mate,

Nem os lábios suaves de Regina.
Grávido dos desejos, abortados...
Queria, lhe procuro, pelos lados.

Sua mão que eu queria, mão divina,
Perdida nessa gélida matina,
Somente deixam sonhos congelados...

Música ao longe, canto tão suave;

Música ao longe, canto tão suave;
Noite perpetua-se mais tranqüila,
Nem os grilos entoam nessa vila;
A música distante , lá do vale,

Chega para os ouvidos, traz a chave
Que poderá afinal, fazer d’argila,
Aquela que pensei ser a pupila
Que me fará ver, luzes dessa nave

Que navegado a esmo, pensei morta...
A música atravessa a linha torta,
Deixando a solidão lado de fora...

Quem me dera pudesse crer outrora,
Nesse momento santo que s’aflora,
Música te trouxesse à minha porta...

Eu queria ser livre eternamente

Eu queria ser livre eternamente,
Livre do tédio dessa longa espera.
Livre para tentar uma nova era,
Livre como a criança que não mente,

Apenas sonha. Quero simples mente,
Sem as perguntas tantas, vida impera
Sobre essas vastidões, dúvida fera,
Eu quero a liberdade, simplesmente...

No marfim dessa lua que me cobre,
Não queria jamais ser o que sobre,
Nem perceber vergonha em tantos medos.

Queria conhecer tantos segredos,
Mas não me restariam nem meus dedos,
Ao olhar o teu rosto, d’ouro e cobre....

Minha certeza sofre com mentiras

Minha certeza sofre com mentiras,
Não quero mais colher tal dividendo
Quando o sonho de belo, fica horrendo
A vida sangra, passa toda em tiras...

Meu corpo ao chão, jogado, quando estiras,
Não sei mais se terei, nem bem pretendo...
Passarei a sentir meu mundo, lendo
No carrossel de lendas onde giras...

Nas legendas da sorte, fiz a rima,
Onde tentei poder jogar esgrima,
Com a tenda que cobre meu tesouro;

Meu moinho quebrando, trigo e ouro,
Na tentativa audaz, salvar meu couro,
Procuro a cura, tanta que redima...

Décimas - Falando minha verdade

Falando minha verdade,
Buscando novo cantar,
Procuro tanto teu mar,
Mares dessa saudade;
Reviver a liberdade...
Quero a boca que me nega;
Que nunca, jamais , sossega...
Quero tentar ter amor;
Desses prados sei a flor,
Flores que a lágrima rega...

Falta minha temporada,
A primavera da vida;
Onde não sei despedida,
Na mais feliz alvorada,
Por amores inundada...
Quero ser tua semana,
Uma esperança que emana
De cada novo cantar,
Horizontes por voar...
Minha luta mais temprana...

Turbilhão de sentimentos,
Não queria tempestade,
Mas tudo isso me invade,
Em todos novos momentos,
Tantos velhos tormentos...
A sombra do que já fui,
Nada mais tenho, se exclui
O que tive, o que passei;
Nos braços aonde errei,
Meu mundo se queda, rui...

Num silêncio vou solene,
Buscando por minha luz,
Carregando velha cruz,
Não há dor que não me empene;
Amor que sonhei perene.
Perante tanta vergonha,
Tudo de bom que se sonha,
Passa para pesadelo,
No frio que corta, gelo;
Restará só dor medonha...

Pus meu barco nesse rumo,
Sem leme, o barco virou;
Do nada que me restou,
A saudade dá seu prumo,
Minha vida virou grumo,
Recebi trato da morte,
Não quero ter essa sorte,
Nem quero mais solavanco,
Assisti tudo no banco,
Na arquibancada dei bote...

Fiz a casa desse barro,
Feito de sangue e pudim,
O que mais quero pra mim
É saber que, se me esbarro,
Nas tristezas qu’hoje varro,
Foi revés, mas eu reverto,
Minha dor vive em aperto,
Carteada do destino,
Se tem dor, logo me empino,
No final terei conserto...

Nas matas nos pinheirais,
Tudo que for machadada.
Tudo que suar enxada,
São coisas que pedem mais,
A violência que traz paz,
O corte dessa esperança,
A morte vem de criança,
Nos braços dessa parteira,
Sangrando essa terra inteira,
Engorda a pança se dança...

Desculpe tanta flechada,
Acenderei teu pavio,
Secarei esse teu rio,
Não terás mata fechada,
Não te restarás mais nada,
Nem sombra de natureza,
Quem sabe, sem ter beleza,
Sem ter água pra beber,
Poderá, pois, conceber,
Meu amor em tua mesa...