sábado, novembro 04, 2006

Cordilheiras gigantes, montes, cumes...

Cordilheiras gigantes, montes, cumes...
No salto extasiante da pantera,
Num laivo mais sutil, tantos ciúmes...
A febre desejosa da quimera...
Na mão que me açoitava, teus perfumes,
Os vértices, os prumos, minha espera,
Deliro mas não ouves meus queixumes.
Ah! Se tu fosses minha... Quem me dera...
Nos olhos vaticínios indefesos,
Traduzes as visões destes profetas.
Cativos meus amores morrem presos
Nos desejos ferozes, domadora...
Porquanto meus martírios quis ascetas,
Desmaiam em teus gozos, redentora!

Nos triclínios orgias e delírios,

Nos triclínios orgias e delírios,
Nas festas sensuais e sedutoras...
Pureza que encontrei nos alvos lírios,
Embalde, se mostraram redentoras...
Mormacentos sentidos abrasantes
Deslumbram maravilhas e tormentos...
Nos lúbricos festins destes farsantes,
A noite se anuvia em pensamentos...
Bizarrices e gozos são normais,
A seda que cobria se esgarçou.
Desejos e prazeres bestiais.
Deslumbres, fantasia cristalina....
A pureza dos lírios se acabou
A gargalhada insana me alucina!

A flor que é divindade marcescível

A flor que é divindade marcescível
Em pétalas debulha tantos hinos...
Amor que se pensara intransponível,
Lateja o coração destes meninos...
Carinho constelar tão impassível,
Se mostra guardião, vários destinos...
No caule destas flores mais flexível,
Desejos se demonstram, mansos, finos...
Resistem a qualquer pressentimento,
Vagueiam pelas hordas estelares...
Jamais se dobrarão ao forte vento.
A flor, embora morta, sobrevive
Nos olhos dos amores, dos luares...
Deste mago pendor, não há quem prive...

Nestes olhos incertos e vazios,

Nestes olhos incertos e vazios,
Meus braços embalaram teu veneno...
Tão distantes, absortos, olhos frios,
Agonizantemente morro pleno.
Quem sabe lividezes mostram cios,
Redundam dum adeus que não aceno.
Perfuro teus humores, ledos fios,
Inverno meus desejos, podre feno...
A campa dos segredos agoniza,
Guardada por duendes e fantasmas...
A vida, torpemente já graniza,
Queimando meu delírio sem delito...
No peito enlameado morrem asmas,
Amor não resistiu, tanto conflito...

Velho mar, na mortalha arquitetônica

Velho mar, na mortalha arquitetônica
Que embalsamas meus erros e tristezas....
Murmúrios indolentes, tua tônica,
Nas procelas demonstras realezas...
Voz calada, garganta queda afônica
Nessas tramas obscuras, embelezas,
Na grandeza sem par, viril, atômica,
Destróis espúrias vidas, indefesas...
Entretanto mais calmo e tão gentil,
Nas praias embalando ondas serenas.
O verde se confunde céu anil,
Transita seus carinhos mais remotos...
Na pele delicada das morenas,
Na fúria dos tsunamis, maremotos!

Nesta noite sombria, impertinente,

Nesta noite sombria, impertinente,
As loucas primazias dum mistério...
Nos passos deste errante penitente,
Nostálgicos carinhos sem critério.
Ruflante coração tão inclemente,
Fingindo-se feliz, estende império
Buscando controlar imersa mente...
Flamívomo vulcão, queima sidéreo...
Nos sóis destes amores tão bravios,
Os átomos desfeitos, explosão;
Recendem os contrastes destes rios,
Escalvam as florestas antes densas.
Em meio a tenebrosa comoção,
As noites dos amores, morrem tensas...

Véus, veludos pudores e bacantes...

Véus, veludos pudores e bacantes...
Nesta purificante conjunção,
Nos seios e delírios dos amantes,
Tempestuosamente, uma monção..
Os fulcros destas festas delirantes
Se embasam num delito da paixão.
Nas luzes, os partícipes farsantes,
Escondendo qualquer uma emoção...
As volúpias carnais loucas brindando,
Nas formas mais banais deste rodízio.
Os sonhos mais febris se revelando.
As bocas devorando cada gota,
A roupa que vestia pousa rota.
Numa oração feroz a Dionísio...

Nas noites explosivas de luxúria,

Nas noites explosivas de luxúria,
Nas tramas entrelaces e prazeres.
Na boca que tortura, vã, espúria
Nas contas dos ganhares e perderes,

A soma destes corpos, tanta fúria!
Tramaste meu futuro, minha Ceres,
Mas, ao me aprisionar, fingiste incúria.
Mórbida, devoraste... Meus halteres

Jogados pelos cantos. Na lasciva
Madrugada, terão vil serventia...
Repasto dos orgásticos pagãos.

Os sucos misturados na nociva
E fantasticamente bela orgia,
No rito, fecundar sementes, grãos!

Te busco como ao sol, o helianto.

Te busco como ao sol, o helianto.
Tua mansa dolência e formosura,
Tua voz inebria, no teu canto.
Languescente delírio da ternura...
Emboscadas terríveis, fero pranto,
Impelem minha essência a tal loucura.
Errante, vagarei por teu encanto,
Qual fora mariposa em noite escura,
Buscando pelo lume desse olhar.
Vagando por espaços, harmonia,
Eu procuro, submerso, por teu ar...
A luz que tanto busco, meu farol;
O sol que tantas vezes irradia,
Encontro nos teus olhos, girassol!

A venusta mulher por quem deliro,

A venusta mulher por quem deliro,
Trazendo teus adornos naturais;
Transladando meus versos faz um giro
Remontando a meus sonhos ancestrais...
O teu nome, incrustado num papiro,
Traduzindo, em vigor, fenomenais
Desejos. Rememoro, num suspiro,
Um tempo que não volta, nunca mais...
As púrpuras saudades inflamadas,
Expõem toda a dor que me entranhou.
As chagas no meu corpo tatuadas,
Não negam, pois eternas cicatrizes,
As horas quando um deus presenteou,
As marcas destes dias mais felizes...

Quem dera eternidade neste sol!

Quem dera eternidade neste sol!
Os ermos desolados e tristonhos,
A lua desfraldando seu lençol
Em meio a pesadelos mais medonhos...
Incêndios invadindo meu paiol,
Eu me embriagarei, doces medronhos...
Licores me farão perder farol,
Martírios e torturas, enfadonhos...
Horrenda garatuja me persegue.
Espectros e fantasmas me torturam.
Embalde, tanta vida foi entregue,
Partícipes fiéis desta agonia...
Mas, paradoxalmente, as dores curam,
Vislumbro, no final, um claro dia...

Alvissareiros dias que se foram,

Alvissareiros dias que se foram,
Nas hordas dos amores, castidade...
As flores que plantamos se descoram,
Pois tentam encontrar eternidade...
Espinhos e torturas já se afloram,
Expostos aos riachos da saudade.
No lodo de minha alma rememoram
Um tempo mais feliz, tranqüilidade...
Imaculado gozo do guerreiro,
Nos colibris etéreos, pirilampos...
Sacrário desse amor, desfiladeiro
Por onde se perderam ilusões...
As cores outonais do belo campo,
Finas fragilidades, corações...

Nos desejos carnais total delírio...

Nos desejos carnais total delírio...
Todas bulhas cardíacas anseiam
Pelo gozo fantástico. Colírio...
Com a pureza láctea de permeio,
Pudores sensuais e latejantes
Misturam-se com sonhos e perfumes...
Nos corpos se misturam viajantes.
Na boca explodirão gozos e lumes...
Reencarnação dos deuses, das bacantes.
Palpitam os sentidos sem razão.
Na guerra inebriante dos amantes,
Nas mãos tão furiosas, belos seios...
Orgasmos multiplicam explosão,
Penetram meus desejos nossos veios...

Minhas lágrimas, gritos e tormentas

Minhas lágrimas, gritos e tormentas
Tolos, vago espaços, mais remotos...
Nas irradiações, rotações lentas.
Guardados os teus olhos, velhas fotos...
Amareladas quedam-se esquecidas...
Os anjos, os arcanjos vão passando,
Proclamam tanto amor por pobres vidas.
Nas tormentas celestes, renovando...
Religiões, enigmas, convulsões
Das hiperestesias, dos portões
Abertos nos castelos do meu sonho...
Deliciosamente uma ambrosia
Regada ao néctar; lúbrica folia...
Transmudam meu delírio, enfim risonho...

Estrelas e quasares, companheiros...

Estrelas e quasares, companheiros...
Nas galácticas plagas te perdi...
Os sonhos dos amores são viveiros,
Essencialmente tudo estava aqui.
Olhos, mares, etéreo... Teu perfume...
Até nosso desejo, anfitrião
Desta festa. Mas trágico ciúme,
Me trouxe, no final, a solidão!
As perspectivas loucas, ser feliz,
Desfeitas nesta curva do caminho...
A vida não merece ser atriz,
No palco da saudade destruída...
Amor que se destrói, sem rosmaninho,
Carrega em sua morte, a própria vida!

tênues borboletas

As tênues borboletas, liberdade...
Nas asas delicadas, belas cores...
Voando, carregando veleidade
Trafegam, constelares, meus amores...
Lactescências lunares, qualidade
Ímpar, as borboletas buscam flores...
Nesse encontro sutil fragilidade...
Vital, mágico encontro, sem pudores...
Diluídas fantasias vaporosas,
Lepidópteros mostram o caminho..
Mesmo com os espinhos, belas rosas...
As asas mansas asas siderais,
Todo sereno encanto... Fazem ninho...
Ah! Vento te levou p’ra nunca mais...

As marcas dos amores, altaneiras.

As marcas dos amores, altaneiras.
Esguias criaturas buscam glória..
Quem sabe suas sagas verdadeiras,
Declinará seu asco na memória..
Nos máximos dos montes, as ombreiras,
Resquício polvilhado desta história.
As horas mais venais, horas primeiras,
Encontram criaturas vãs: escória!
Nos estandartes tolos, a dura haste
Estorvo e negação, guerras insanas...
Amores, violência, num contraste,
Trazendo os pavilhões em decadência.
As podres criaturas são baganas,
Dissimuladas, fingem inocência...

Teus lábios neste cálice de vinho,

Teus lábios neste cálice de vinho,
Mostram sensualíssimos desejos...
Tua boca cintila loucos beijos,
Resplandecente flâmula, meu ninho..
Belas cores carnais, rosas, espinho...
Constelarei delírios e traquejos,
Perpetuarei matas e verdejos.
Embora, tantas vezes fui sozinho...
Travam em meus ouvidos, cantos mis,
Harmoniosamente estrelas giram;
Eternos carrosséis, loucos, febris...
Sonhadores formatos da natura...
Meus olhos tresloucados... Sim, deliram...
Eu respiro teu hálito, loucura...

Luar que brilha a me trazer saudade...

Luar que brilha a me trazer saudade...
Sonho divino, que perdi tristonho...
Em serenata cantarei meu sonho,
Perfeito, radiante claridade...
Por tanto que te quis, felicidade,
O mundo me restou pobre e medonho...
Na luz que me irradia, essa verdade
Escondida, temida, exponho...
Alegria foi farsa, imersa em pranto.
O meu olhar vazio, vai nevado,
Espero teu amor, teu mago encanto.
No rumo que já sei carrego um cardo,
Mas bem sei, em plena dor, eu me agiganto.
Meu verso se desnuda, amortalhado...

No meu sonho eternal, aroma da saudade...

No meu sonho eternal, aroma da saudade...
As rosas que plantei, se esquecem no jardim.
Caminho todo branco, alvura e claridade.
Amor que me maltrata, alma deste festim...
A noite cai, serena, a lua por vaidade
Esconde com pavor, as marcas do alastrim.
Pintarei minha tela em cores da falsidade,
Meu paletó de linho, a saia de cetim...
Formamos par perfeito, audácia e solidão!
Sua saia cetim, meu paletó de linho...
Lua, no céu, brilhando... A noite, mansidão...
A triste serenata, as cordas do meu pinho...
Bater acelerado, um vago coração.
Meu sonho tão banal, perdi rumo e caminho...

Candura que me trouxe amada que sonhei,

Candura que me trouxe amada que sonhei,
É casta em sua alvura, abraços da ventura...
Castelo da princesa espera por um rei,
A vida sem temor, retrata esta aventura.

Por quanto tempo quis, é tanto que nem sei,
A noite terminada, um gesto de brandura,
Na pompa desta festa amar se torna lei!
A sina de quem ama envolta em amargura...

O meu sonho de amor, castelos que deliro,
Princesa virginal, mentiras que não vejo.
Na faca que me corta, o gesto que prefiro.

Esqueça tal quimera, esqueça essa ilusão!
Esqueça a madrugada, esqueça o meu desejo!
Esqueça esta princesa, esmague o coração!

Por que me chamas bonzo? Acaso te maltrato?

Por que me chamas bonzo? Acaso te maltrato?
Expresso-me maldoso em busca do pavor...
Por vezes não consigo, é culpa do retrato
Que me deste querida... Omites teu amor.
Muitas vezes, bem sei, escarras no teu prato,
Eu sei que teu carinho esconde muita dor,
Por quantas vezes quis te propor simples trato.
Não me traga teu sonho, em vão fui sonhador...
A flor carrega espinho, eu sei que isso é verdade.
É tanta dor que trago, esqueça o meu passado.
Não quero e não permito esta tal de saudade..
O meu cantar distante estranha esta eloqüência.
Eu não te quero aqui. Pois, saia do meu lado...
Hipócrita? Demente! É tudo coincidência...

Constelação

Constelação perdida em plena imensidão,
Esquecida no céu, carrega tantas luas...
O meu olhar vazio imerso na amplidão,
Buscando por alguém: tolas lembranças tuas...
Noctâmbulo desejo, andante coração,
Mulheres que eu amei, imagens belas, nuas...
A noite se demora, alma, constelação...
Meu pensamento voa... Amada... Já flutuas...
Na seara florida, as pétalas da rosa...
Nos campos, o brilho... A lua, mansa, chama.
Abre seus braços... Louca, a lua vaidosa,
Prateada e tão bonita, esconde o triste breu...
Noturna sinfonia, arde, me queima, inflama.
Pobre constelação esquecida, sou eu...

Quem dera fosse fera: audaz, cruel, fatal...

Quem dera fosse fera: audaz, cruel, fatal...
Nos olhos mago brilho, as garras sempre atentas...
Caçadora mordaz, impura, sensual...
As patas deslizando, avançam, mansas, lentas...
Um gesto qualquer, tenso, a fera perigosa,
Neste segundo a mais, as presas rasgam fundo..
Na beleza venal, força maravilhosa.
Denso turbilhão louco, o bote dá, profundo...
Mas, delirantemente, esta fera tão temida,
Que é, verdadeiramente, um símbolo de guerra.
Ao ver tua beleza... Estranho... Cai ferida.
Não sabe deste amor que é luz e que é quimera;
Arrasta-se gentil, deitada sobre a terra...
É muito bom te ver domando esta pantera!

Fantástico luar, flores da eterna paz.

Fantástico luar, flores da eterna paz.
Na claridade imensa enorme caridade.
Um deus, na fantasia, esboça-se capaz
Na lua; bela, cheia, expressa a vaidade...
Nos seus clarões, amiga, eu sinto ser capaz
De ser muito mais forte. Envolto em claridade,
Na mágica torrente, imenso, sou audaz.
No brilho do luar, esconde-se a verdade!.
Caminho pela rua, a lua é quem me guia,
Inflama-se qual chama amansa minhas dores...
A lua me transporta, em plena fantasia,
Enorme catedral, no pátio dos amores...
Ó lua companheira, amante tão vadia,
Em tua poesia, explodem tantas cores!

Meu Pai onipresente onde estarás agora?

Meu Pai onipresente onde estarás agora?
A solidão consome, expõe o meu cansaço...
Ao nada retornando, a vida não demora,
Meu pranto Te procura. Estás solto no espaço?
Ubiqüitário Deus, vasculho mundo afora
Preciso urgentemente aguardo teu regaço...
Não deixe por favor, minha vida ir-se embora.
Me responda Senhor: me diga o quê que eu faço?
Meu dia já termina em busca deste sonho,
Envolto em densa bruma abraço a noite escura.
Do mar, um pesadelo, um ser forte, medonho
Terrível calabar, se erguendo me devora...
Devolva-me sem medo, a natural ternura...
Meu Pai, onipresente, onde estarás agora?

Jaz tábida minha alma, expressa podridão...

Jaz tábida minha alma, expressa podridão...
Anseio pela vinda amada do festim.
Do nada para o nada: extrema solidão!
Aguardo pelo beijo audaz, feroz, do fim...
Tristeza de viver... Tristeza nesse não
Absoluto, final. O sonho acaba, enfim...
Na boca que sonhei, um riso sem perdão...
A pá da cruel terra expressa-se em carmim...
A larva que me beija, eterna camarada;
Num sonho mau, deliro... Espera pelo véu.
Na festa que termina a luz anunciada
Se esconde, escuridão! Nada mais restará!
Na profundeza espero a salvação do Céu.
Me sobra a solidão! Meu Deus, onde andará?

Hemorrágico amor... Maltrata e me redime...

Hemorrágico amor... Maltrata e me redime...
És altiva esperança, ao mesmo tempo matas.
Me dás a sensação fantástica do crime.
Alucinadamente expõe as densas matas
Da paixão. Me tortura, acalma, cama, vime...
Nas lutas que passei, nas danças, nas regatas,
Momentos que vivi, a dor já não se exprime;
Feliz hemorragia, em mares e cascatas!
Num formidável grito expõe-se, assim, desnudo.
As entranhas à mostra, a beleza da loucura...
É violência no orgasmo, amor forte! Contudo,
Tantas vezes cruel, tantas vezes fatal...
É raio que clareia em plena noite escura.
É lágrima, pierrô, num triste carnaval...

nebulosa noite

A nebulosa noite aproxima-se trágica
No pálido semblante, amada desespera...
Do éter tresloucado a vida sem espera
Deseja tolamente a salvadora mágica...
A morte se redime, audaciosa e fágica,
Num céu avermelhado expõe-se numa esfera.
E num segundo, troa, espírito de fera!
A morte companheira, astral e necrofágica!
As águas na convulsa esperança da luz,
Vão tresloucadamente, as angústias expostas...
A noite cai, pesando, expressa a minha cruz...
Na noite deste amor, que tanto consumiu;
Os raios desta noite invadem minhas costas...
Negridão do oceano... Amor morreu, partiu...

Na vida qual gravela, incrustada neste vinho,

Na vida qual gravela, incrustada neste vinho,
Exposto a podridão, espasmos, convulsões...
Nas flores, no rosal, exposto à dor, espinho;
Busquei a solidão das grandes multidões...
Não sou senão um rastro; um rato busca o ninho,
Viperino veneno, escarro aos borbotões.
Embalde tanta vida, estou melhor sozinho.
Humanidade triste, eunuco das paixões...
Em vão! Se já sonhei, fagulhas impotentes...
Lutando pela vida, esquecido do que sou,
Castelos que criei foram tão imponentes!
Rasguei meu pesadelo imerso em tolo mar...
A noite, imaculada, em sonhos me beijou..
Gravela desgraçada, enfim, a me acordar...

Genesíaco amor, trazendo essas trapaças...

Genesíaco amor, trazendo essas trapaças...
Na fome da loucura a morte vem ligeira...
Protejo o coração, produzo carapaças,
Em vão... Nesta mortalha, a dor é companheira...
A vida se perdeu buscando novas caças.
Amor nunca permite exige verdadeira
Dedicação. Derrota emoldurada em taças...
A lua, em nosso caso, espera ser inteira...
Desprezei teu desejo, aguardo meu castigo...
Mergulho no infinito, embalde te procuro.
Levaste todo sonho embora, foi contigo...
O pouco que restou, triste oceano escuro,
Decerto representa um enorme perigo,
A morte me espreitando ali, detrás do muro...

Embarco um triste sonho, espero pelo cais.

Embarco um triste sonho, espero pelo cais.
Zarpando neste mar, trazendo meu saveiro.
O mar em calmaria é manso companheiro...
A vida me permite um canto mais audaz...
O vento doce, manso, envolto em tanta paz...
A dor ficou guardada, espera no estaleiro,
O mundo se abrirá ao velho marinheiro...
A saudade, a tristeza, o mar deixou p’ra trás...
O céu azulejado a nuvem mais distante...
Navego sem destino, esperanças carrego...
Tanta felicidade expressa neste instante...
Num momento fatal, as ondas anormais,
Os raios na tempesta, o barco não navego.
A morte se aproxima... A vida, nunca mais...

Natura

A natureza amada aguarda a traição...
O século consome a boca desta amada.
Num cataclismo louco espermas da ilusão
A vida adormecida esvai-se, magoada...
A morte da natura eterna e sem perdão,
Renova-se na podre ação desenfreada
Daquele que, por Deus, seria o guardião!
Na flora que se acaba, a vida destroçada.
Já vai, agonizante, empresta a tal cenário
A face da desgraça. Embalde tanta luta
No canto passarinho, a morte do canário,
Um cheiro de queimado abraça a pobre Terra.
Quem pode conquistar não usa a força bruta...
Amor que se conquista, esconde-se da guerra!

Meu verso mais sombrio, as danças neste bar...

Meu verso mais sombrio, as danças neste bar...
Amor que me arrebenta arrebata o que resta.
Um copo de aguardente, o brilho do luar.
Nos umbrais da saudade aberto o peito, fresta.
Nas bocas que beijei, mulher que foi meu par,
Minha alma deslumbrada aguarda pela festa,
Espera teu desejo, ondas do negro mar...
Um tresloucado rito, amor, esgoto empresta...
No gosto desta guerra, amor em forma bruta,
Burilo meu anseio, amanso meu instinto...
Em tua boca o gozo, uma lágrima astuta.
Inebriado sonho, esbanjo-me em delírio...
O vinho que bebi, do meu sangue, retinto,
Na dança sepulcral, meu gozo é meu martírio...

Se esvaecendo o fumo altivo de minha alma,

Se esvaecendo o fumo altivo de minha alma,
Nesta alquimia louca, ardência me consome...
Sozinho procurando a seletiva calma
A noite que sonhava, espreita mata e some...
Convulsa tempestade espectro de meu trauma,
A morte, cavernosa, a carne podre come...
Não resta nem a face, a mão estreita, a palma...
A luta pela vida: a dor, angústia e fome...
Na substância fatal, rasgando horrendo cerne,
Aterradora noite: amantes demoníacos...
O pouco que me resta, enfim não me concerne.
Orgástico fantasma explode de prazer,
O cheiro de tal morte, os ossos meus, ilíacos,
Na dança derradeira, angústia de viver...

Quando chegar a morte, enfim, serei feliz.

Quando chegar a morte, enfim, serei feliz.
Neste cadáver vivo a paz renascerá...
Quem na vida escapou, vivendo por um triz,
Com certeza, por sorte, um dia brilhará...
Procuro pela lua,a velha meretriz.
Sempre que rastejo, o trilho estava lá,
Sanguíneo tal letreiro indica-me, infeliz,
O rumo do meu sonho, onde a morte estará!
Se encontro podridão, Plutão, meu companheiro,
A boca que me beija, inválida se ri...
Abismo que mergulho, é meu, decerto, inteiro...
As noites que sonhei, são tolas, sepulcrais...
A morte, viva em vida, esteve por aqui...
Esperanças gentis, palavras tão banais!

Na treva figurante, abissal, imbecil,

Na treva figurante, abissal, imbecil,
Transponho meu desejo, envolto em tempestade.
Procedo qual artista, inválido buril;
Que em sonho sem futuro, esboço da maldade,
Destrói o que foi lume, esquece a claridade...
Matando sua sede, escarra no cantil.
Esmaga uma criança, espanca o que é sutil,
Vagueia nesse esgoto, espelha a falsidade...
Na treva caminheiro, escalo esta montanha,
Meu sonho mais feliz, limite da esperança,
Saber desta palavra, aguardo nova sanha.
Na treva procurando, espero teu perfume...
O gosto deste amor, liberta-me em fiança,
Desfazendo a vil treva, ateia um novo lume...

louco

Essencialmente louco esperei o final
Se no meu mundo abstrato, espero pelo abismo,
Sorriso da medusa é belo pois fatal...
Meus dentes latejando explodem neste trismo.
Restituo o perdão, traduzo-me boçal,
Neste universo tenso ansioso exorcismo...
Ausculto cada estrela, esfera crucial,
Vitória não permite um laivo de ufanismo...
Mergulho meu desejo em procelas medonhas...
Um louco, extraviado, aguarda novo rumo...
Na cama que durmo, a tristeza traz fronhas,
Noturna, minha chama, incendeia o pavio,
Por mais que sempre tente, imbecil, não me aprumo,
Morro estupidamente, imerso vago e frio...

OUTONAL

Vou viver sem ter medo, ouvir tranquilamente
O canto da ilusão levando o meu outono.
A cabeça a rodar, voar mais livremente.
A vida me trazendo a calma deste sono.
Teu belo canto, amiga, ouvirei docemente...
No meu olho, fechado, entregue ao abandono,
O tempo vai passando, outro mundo, poente...
No teu colo, querida, asa aberta, ressono...
Amanhã? Outro dia... A luz do sol renasce,
O mundo passageiro, adormece devagar...
A nossa conjunção, brilhante, nosso enlace.
Outonal, vagabundo, espero teu carinho...
Tudo será melhor...Não me custa esperar...
Vagabundo, outonal, não quero ir mais sozinho...