sábado, janeiro 23, 2010

23370

Quem dera dos sonetos, coletâneas
Que há tempos me propus e nunca fiz,
As honras são deveras momentâneas
E deixam tatuada a cicatriz;

Juntando num só livro tais infâmias
Audaz o gozo atroz da meretriz,
Que tanto se desfaz em tais insânias
Mas mostra-se sincera se feliz.

Excêntricos poemas, versos frágeis
Embora os dedos sejam bem mais ágeis,
Tetânicos espasmos; vou sardônico.

Mercado não suporta velharias,
Guardando na gaveta as poesias,
Ao menos solitário sou irônico...

23369

Aprendo a ter a mesma falsidade
E creio ser possível novo engano,
Abaixam; fim de cena, o negro pano
E deixo que te encante a claridade.

Soberba fantasia que te invade
Enquanto deste fato já me ufano,
O verso se mostrando mais profano,
Não deixa que se veja a liberdade.

Escusas; não suporto nem daria,
Aonde se moldara esta escultura,
Desnuda a deusa bebe a alegoria

E morre em tão solene madrugada,
A faca que nas mãos dita a loucura,
Apenas pelo amor será domada...

23368

Escassas emoções, versos tão fúteis
Ardentes ilusões, promessas falsas,
Enquanto as esperanças tu descalças
Os dias são deveras quase inúteis.

Aonde se fizera poesia
Não piso, pois cascalhos espalhaste.
E quando se percebe este desgaste
A sorte me abandona e não me guia.

Vestindo o que restara em algum canto,
Um espantalho apenas, nada mais,
E entrego-me aos desejos infernais

Matando o que pudera ser encanto.
Exprimo nos meus versos este adeus,
Aonde se fizeram todos teus...

23367

Perpetuamente imerso no vazio
Aonde tantas vezes cri possível
Um dia mais alegre ou aprazível
Fantástica ilusão que ora desfio,

Usando do meu verso, qual pavio
Um tempo que virá tão desprezível
Ascendo sem saber ao tosco nível
Por onde caminhaste; horas a fio.

Não ter outra saída? Simples farsa,
Minha alma de tua alma, uma comparsa
Que teima em ter nos olhos esperança.

Assim ao ver a luz, peito disfarça
Fingindo ter na frente uma alva garça
Enquanto aos grises céus, ela se lança...

23366

No quanto tu mostraste esta peçonha
Eu pude descobrir quem não sabia
Ainda se mostrando em euforia,
Imagem que ora trago; tão medonha.

Minha alma muitas vezes inda sonha,
Mesmo sabendo tosca a fantasia
Já não suportarei mesquinharia
Por mais que um Eldorado se componha.

Negar a minha história? Não; prefiro
Que invés de um beijo venha bala e tiro
Nos dedos preparados o gatilho.

E quanto mais mergulho neste enredo
Menos desejos trago ou te concedo,
Erguendo a minha fronte, não me humilho...

23365

Perdoe quem se fez quase inocente,
Mas sabe os descaminhos desta vida,
A sorte muitas vezes esquecida,
Enquanto a poesia nada sente.

Pudesse neste instante estar presente
A morte não seria dolorida,
Ocaso começando e a despedida
Envolve minha fronte já doente.

Herético; se eu fui não me console
Bebendo esta aguardente, em cada gole
Eu sei dos desafetos que plantei.

Não quero ter o choro falso e o riso,
Apenas o silêncio mais conciso,
O resto; com certeza, deixarei...

23364

Mereço de quem sabe; certo crédito
Portanto não me esquivo de tentar
Usando com palavras transformar
Gerando a cada frase um verso inédito.

Percebo quantas vezes fui tão tolo
Seguindo falsas luzes entre tantas,
E agora que em verdades acalantas
A vida não merece mais consolo.

Esparsas letras volvem numa dança
E deixam as retinas tão confusas,
Mas quando de emoções, diversas usas,
O olhar de quem te quer ao longe lança

Por mais que seja sempre movediça
O sol por sobre areia cedo viça...

23363

Meu verso a cada dia se aprimora
Diverso do começo tartamudo,
E quando as emoções; deveras mudo
Expresso a luz que sinto a qualquer hora.

Não posso suportar esta demora
E quanto mais audaz, menos iludo
Usando a poesia como escudo,
Não temo mais sequer a voz que implora.

Não pude confessar os meus defeitos,
Nem mesmo a garantia que me deste
Quisera ter nos versos mais perfeitos

A faina de um sublime lavrador,
Que mesmo arando um solo tão agreste
Transforma em alegria o seu labor...

23362

Enquanto a fantasia me mentia
Trazendo um gosto ameno onde era fel,
A sorte se moldando em vão papel
Tramando invés de sorte, esta agonia,

Não posso me entregar, melancolia
Deixando um coração vazio ao léu,
A noite se envolvendo em negro véu,
As nuvens que virão já denuncia.

Perfaço cada verso em águas turvas,
Nas horas mais difíceis, rotas curvas
E o pêndulo volvendo ao seu início,

Atípica loucura me tomando,
E mesmo quando o tempo se faz brando
À beira dos meus pés, o precipício...

23361

Buscando nas palavras; lenitivo
Que possa aliviar tal sofrimento,
Não vivo mais em paz um só momento,
Deveras quase inerte, sobrevivo.

E tendo em minhas mãos o sonho altivo,
Por vezes de tristezas me alimento,
E quando em fantasias busco o ungüento
Das falsas ilusões eu não me privo.

Vencer os dissabores, quem me dera.
Pudesse reviver a primavera
Que austera se fazendo agora ausente,

Mesquinharias tantas adivinho
E faço da esperança um vão caminho,
Enquanto a morte atroz já se pressente...

23360

Palavras se perdendo em ventos fortes,
Descuidos da ilusão dizem promessas
E quando em meus caminhos recomeças
Apago do passado estes aportes,

Por mais que na verdade não suportes
O mundo desta forma, mas são essas
As cores que se pintam, quando estressas
Espero por profundos talhos, cortes.

E sei que na verdade; o mal não queres,
Argêntea maravilha em teus talheres
Numa áurea fantasia banqueteias

Enquanto um pária dorme na sarjeta;
Porém sua alma livre qual cometa
Jamais suportaria tuas teias...

23359

Mentiras, farsas, toscas emboscadas
Durante as minhas noites solitárias,
Aonde imaginara solidárias
As horas entre fogos, destroçadas.

Almejo alguma paz, mas nas calçadas
As balas se perdendo, torpes, várias
Apagam dos meus sonhos, luminárias
E moldam no futuro; barricadas.

Ouviram margens sórdidas, o pranto
De um povo aonde grassa o desencanto
Mudando este cenário glorioso,

E acendem-se os pavios, explosões,
A fome se acercando de milhões
Pacífico caminho? Furioso...

23358

Celebro a vida em versos e desejos
Mergulho os meus sonetos em anseios,
Os dias entre trevas e receios,
Apenas, do passado, vis lampejos.

E quanto aos teus encantos tão sobejos,
Beleza e maciez em firmes seios,
Percorro; enamorado, raros veios
Um andarilho em paz, passos andejos.

Ascendo num segundo ao próprio Olimpo,
O céu se anunciando claro e limpo,
Solares maravilhas, a alma pressente,

E tendo o teu olhar como meu guia,
A vida se transborda em poesia,
E o dia se mostrando iridescente...

23357

Perduram nos meus olhos as estrelas
Que tantas vezes guiam navegantes,
Por tanto que me deram em instantes
Concebo a maravilha de revê-las

Celebro a fantasia de contê-las
Diversas emoções inebriantes,
Percorro estes caminhos mais distantes,
Apenas na certeza de colhê-las.

Quais fossem pirilampos siderais,
No etéreo a eternidade sendo o cais
Abrindo o coração, alçando os céus.

Esgueiro-me entre dores, desventuras
E sinto nas estrelas as branduras
Debaixo de seus brilhos, raros véus...

23356

Ainda é possível ser Felizabraçar o mundo com carinhoe muito além do além, ao ninho,posso colher o bem que fiz!

Efigênia Coutinho

Celebro com meu verso o ser feliz
Que tantas vezes quis e não sabia
Aonde em que detalhe poderia
Viver a fantasia e me desfiz,

Se trago tatuada em cicatriz
A marca insofismável da agonia,
Talvez ainda reste uma alegria
Num céu eternamente escuro e gris.

Ouvindo um canto amigo em voz suave
Do fado em desventura uma esperança,
Uma alma turbulenta então se amansa

Por mais que a solidão ainda agrave;
O resto dos meus dias; sigo altivo
Teu canto se mostrando um lenitivo...

23355

As velas sendo abertas; vou liberto
Por mares que jamais navegaria
Não fora tão enorme a fantasia
E o meu futuro agora, vago e incerto.

Os medos e os pudores eu deserto
Minha alma a tal delírio já se alia,
E vence qualquer dor, frio e agonia
Num mar de ondas bravias, peito aberto.

Há sangue em minhas mãos, fogo nos olhos,
Por mais que ainda veja tais abrolhos
Deveras meu canteiro floreado,

Arcando com meus próprios caminhares,
Expondo sem temor os calcanhares
Adentro este oceano, sina e Fado...

23354

A deusa já desnuda em águas claras
Qual Ninfa se deleita à luz do sol,
Não tendo mais ninguém neste arrebol,
No encanto magistral; sonhos declaras.

Sirena em formas belas, nuas, raras,
Fazendo dos meus olhos, girassol,
Encontro em tal pureza este farol
E a vida sem saberes, logo amparas.

Correndo imenso risco já me atrevo,
Não quero ser eterno nem longevo,
Mas tendo emoldurada em meu olhar

A tela que desfilas, na nudez,
Perdendo toda a minha sensatez,
Nas águas, em loucura, mergulhar...

23353

Não faço destes sonhos; ideais
Apenas não consigo me calar
Querendo da verdade sempre o mais,
Negando o sortilégio de um altar

Expresso a solidão de um mero cais
E nele esta vontade de voltar
Os ventos transformados, temporais,
Quem sabe novamente navegar,

E ter esta certeza que me move,
Por mais que a parceria seja nobre
Não tendo quem comigo me desdobre

Estrofe pós estrofe me comove,
Mas nada se compara ao meu retrato
Desnudo em cada verso, o nó desato...

23352

Bem sei que nesta vida não há ilhas
Nefastos os profundos, grandes pélagos
Nós somos e seremos arquipélagos
E nisto se consistem maravilhas.

Por quem os sinos dobram? Por nós todos,
Mas quando lobos somos de outros lobos
Fingindo muitas vezes sermos probos
Expomos na verdade nossos lodos,

Nos charcos que profanos, chafurdamos
Vestidas igualmente toscas tribos,
Nas costas tatuados os estribos
Da violência estúpida, os ramos,

Pois, macabros, ignaros e imbecis
Escravos de valores torpes, vis...

23351

Eu quero a liberdade do meu canto
Por isso não desejo as edições
Se nelas existindo o desencanto,
Profanas e diversas emoções.

Tampouco quero crer que distorções
Transformem o sorriso em mero pranto,
Não faço dentre os versos, distinções,
Se o próprio cerceamento traz espanto.

Escrevo o que desejo e não me importa
Se abrindo ou se fechando alguma porta
Poemas; são meus gritos libertários.

Por isso é que em verdade não publico,
Se eu sou tosco, sacrílego ou pudico
O rio não se vende aos estuários...

23350

Chegando à divisória entre alma e luz
A estrada mesmo antiga, fronteiriça
Dizendo deste encanto que cobiça
Quem faz a festa enquanto reconduz

Espreito mansamente cada obus
E a sorte feito areia movediça
Ao mesmo tempo aquieta enquanto atiça
Escrúpulos diversos, falsa cruz.

Enquanto anoitecendo na cidade,
Neons vão se espalhando em tosco brilho,
O amor sendo demais, já nem mais trilho

Buscando a paz intensa e a liberdade,
Ao ver a luz dispersa; penso na alma,
E um breve sentimento/paz me acalma...

23350

Minha alma dividida entre dois rumos,
Acenos do futuro; não percebo,
Enquanto dos incensos, eu concebo
Perfumes exalados, doces fumos.

Bebendo da esperança; raros sumos
Reinando sobre tantos, belo Phebo
Apenas um fantasma, este mancebo
Que teima em devorar os toscos grumos.

Obesa fantasia não se cansa,
Quem dera a vida fosse bem mais mansa
Pudesse pelo menos rir em paz.

Porém ao ver andrógina figura
Ditando sem pensar a alma procura
Além deste vazio que ele traz...

EM HOMENAGEM A UM GRANDE COMPOSITOR DA MPB

23349

Cidade entre diversas fortalezas
Um templo feito em luz, sangue e vergonha,
Imagem tresloucada e tão medonha,
Expressa a cada canto tais tristezas,

Martírio usado em nome das defesas,
A sorte se moldando mais bisonha,
Enquanto o populacho pede e sonha
Com tempos prazerosos e riquezas.

Vendidos em barganhas sem pudores,
Lacaios deste rei feito em demência
No olhar de cada ser tola inocência

A pútrida mensagem dos horrores.
Pastores, toscos reis destas Igrejas,
Cordeiro; abençoado sempre Sejas...

23348

Erguendo calmamente a minha fronte
Encontro Tua Luz a cada dia,
Mergulho neste mar em calmaria,
Vislumbro um novo tempo no horizonte,

Por mais que a minha vida desaponte
Um claro amanhecer, no amor se cria,
Ouvindo a mais suave melodia,
Contigo, Meu Senhor, divina ponte

Erguida com as bases de um afeto,
Nas sendas dos Teus passos me completo
Prossigo e quero ser simples cordeiro.

Pois sei que tens no olhar rara pureza,
Minha alma se envolvendo em tal beleza
Conhece-Te do amor, o mensageiro...

23347

Descubro neste Pai a clara imagem
Do amor que sendo terno se eterniza,
Transforma o vendaval em simples brisa
Tornando mais tranqüila esta paisagem.

Não quero nem preciso de algum pajem,
A vida por si só da glória avisa
Quem farsas, ilusões, em Ti já visa
Não merecendo em Deus tal hospedagem.

Amar sem ser amado e sem medida,
Resumo do que busco nesta vida,
E nisto imprescindível, o perdão.

Não quero e nem mereço algum milagre,
Que o vinho feito amor não se avinagre,
Já basta para alçar a salvação...

23346

Regido pelos sonhos de um rei tosco
Vestido de imperial, tolo imbecil,
Num mundo que se faz amargo e vi,
O olhar do soberano segue fosco,

Assim se encaminhando a humanidade
Diversa do que outrora quis um Rei
Fazendo do perdão e amor a lei,
Trazendo; soberano uma humildade

De quem se sabe eterno mensageiro,
Agora qualquer tolo se faz deus,
Nas mãos guarda o punhal, e o mero adeus
Aos sonhos mais felizes. Sou cordeiro

Daquele que se fez simples, com nexo,
Agora no poder, dinheiro e sexo...

23345

Quem dera dos teus sonhos, capitão
Apenas tão somente um timoneiro
Navego pelos mares, vou inteiro
Fazendo como barco, o coração

Amor que imaginara derradeiro
Desliza em pleno mar, a sedução
Sabendo deste sonho, a solução
Moldando um dia claro, mensageiro

Dos deuses transformando em Céu e glória,
Tramando desde sempre esta vitória
Aonde se pudesse ter em paz

A sorte de ser teu a vida toda,
Minha alma se emoldura e não se poda,
Bebendo esta alegria que amor traz...

23344

Por mais que se mostrasse ausente ou ledo,
Amor com suas formas e matizes
Eróticos desejos em deslizes
Guardando ou demonstrando este segredo,

E em cada verso penso e a ti concedo
O quanto de prazeres tu me dizes,
Só peço que deveras sempre avises
E não permita à vida algum degredo.

Tu trazes em teus braços, firmes hastes
E quanto deste sonho arrebataste
Trazendo nos teus olhos o contraste,

Mas peço, deste enredo não te afastes
Tampouco se permita a um vão desgaste
A vida não permite tais desbastes...

23343

Talvez não mais quisesse batizado
Aquém do paganismo que propagas
Moldando esta mentira noutras plagas
O quadro original tece o pecado?

Não posso me furtar a tal enfado
Tampouco em cores cinzas, tais adagas
Que em fátuas ilusões; o povo, esmagas
Além de algum poder que fosse dado.

Não creio em falsos mártires, só Cristo
Ovelha em sacrifício, mas insisto
Apenas neste Amor que Me ensinara.

Já não comportam mais toscos alcoólatras
Nem mesmo insofismáveis; vis idólatras
Que a própria história nega e desmascara...

23342

Talvez ainda escute o que dissera
O velho timoneiro da esperança
E enquanto em mar profundo o barco avança
Ao largo se perdendo a primavera.

No olhar da poesia, a louca fera
Marcando com as garras, a lembrança
De um tempo aonde ainda uma criança
A sorte desejada em vão espera.

O quadro se tornando inverossímil
Apátridas veredas, diz o mar
Sem nada em que pudesse ao fim. Imprime-o

Na pele em tatuagem, riscos vários.
Aonde em que planeta os temerários
Caminhos onde encontro o bem de amar...

23341

Vivera tão somente em risos falsos
Imensas cicatrizes dentro da alma,
Apenas a lembrança ainda acalma
Quem sabe do futuro em cadafalsos.

Os pés sobre espinheiros vão descalços
O amor quando se fora, imenso trauma,
Dourando este horizonte, a rara calma
Mesmo enfrentando em vão tantos percalços.

A morte é solução para quem tenta
A sorte e não percebe outra saída
Ao Norte a ventania violenta

Ao corte tatuado a despedida
Aportes tão diversos; já não sonho,
E o fim se aproximando, assim medonho...

23340

Vivesse entre mil reis e não teria
Sequer a sensação deste poder
Que sinto Meu Senhor no quanto crer
Já traz a quem fiel, farta alegria.

O mundo se desfaz em agonia
Mergulhos que imagino no meu ser,
Em Ti eu aprendi a conhecer
Verdade que deveras já me guia.

Negando as trevas tantas que me impingem
Nas grises cores toscas em que tingem
Sacrários onde estão raros pendores.

Alvissareiros dias? Já não creio,
Soberbos descaminhos, meu receio,
Porém a Ti Meu Pai, os meus louvores...

23339

Bacantes e terríveis gargalhares
Expondo estas orgásticas loucuras
Milagre em profusão, soberbas curas
Igrejas se fizeram lupanares.

Senhor, Tu não repares se ao voltares
As luzes que espalhaste em vão, escuras,
Em Tua casa, apenas esculturas
Diversas excursões, ricos bazares.

Mulheres e crianças exploradas,
As velhas entre as hóstias profanadas
Demônios em batinas, ternos, ritos.

Aonde houvera paz, o pandemônio,
Na casa do Senhor, claro demônio
Bebendo do Teu vinho, entre os aflitos...

23338

Não sendo aos olhos teus; um velho anseio
Vibrando de alegria; um templo eu crio,
E deixo para trás qualquer receio,
O mundo mais feliz; já fantasio.

E quando percebendo aberto o veio,
O coração distante, em vão, vazio
Nas cordas da viola que ponteio,
A sensação divina; eterno estio.

Ascendo aos Teus caminhos e veredas,
E Te agradeço sempre o que concedas
A quem se fez ovelha, manso e probo.

Não quero ter nas mãos a faca e a foice
No olhar tão vingativo, a sorte foi-se
Deixando no lugar, pastor e lobo...

23337

Deformam-se decerto em descaminhos
os ritos que pensara salvadores
aonde preservara meus amores,
agora a solidão tomando os ninhos.

E teimo contra os vermes tão daninhos,
prometo mais felizes os albores
sem amos, nem escravos, pois senhores
morrendo em frios chãos, sempre sozinhos.

Assim num amanhã mais prazeroso,
dos Céus as alegrias e pendores,
andores espalhados pela Terra.

No Amor e tão somente nele próprio
um mundo mais audaz, por isto sóbrio
aonde a paz suprema já se encerra...

23336

Recebo dos amigos o recado
Falando sobre um tempo em que talvez
Pudesse ser feliz, mas sensatez
Há tanto tempo tenho abandonado.

O quadro se pintando desolado,
Aonde poderia a lucidez
Moldar esta alegria em que se fez
O mundo entre desmandos disfarçado.

Apenas imagino a sorte imensa
De quem se deu inteiro e recebeu
A glória como justa recompensa

Vivendo esta alegria que sonhara,
Assim vou desenhando teu e meu
A vida sem as mágoas, crua escara...

23335

Espalham-se por ruas e cidades
Venenos embutidos em discursos,
Vagando por diversos vãos, percursos
Que possam nos tirar tranqüilidades.

Distante das razões e das verdades
Aos mesmos não cabendo mais recursos,
Mantendo destes rios, velhos cursos,
Concursos nos levando às falsidades.

Negar a própria luz sendo holofote
Poeta é um mensageiro da ilusão.
Perfilo no horizonte as minhas cruzes.

E tendo a fantasia que me adote,
Eu vejo muito além desta amplidão,
E bebo do Senhor divinas luzes...

23334

Quem dera um pensamento mais arguto
Deixando os dissabores sempre ao léu,
O mundo sendo torpe e tão cruel,
Nas sendas, nas entranhas eu reluto.

E quando estas mentiras eu refuto
Ascendo num segundo elevo ao céu
O pranto necessário de um fiel,
Que vive eternamente em negro luto.

Ao ver a hipocrisia dos altares
Insânia e tão atroz voracidade
Prostituindo a cruz e a majestade,

Não posso me calar se entre meus pares
Percebo a mansa ovelha encurralada,
Por lobos disfarçados, explorada...

23333

Descubro-me desnudo em simples versos
Usando da palavra, uma arma audaz
O quanto este vazio satisfaz
Depois de perceber mil universos.

E sei que mesmo sendo tão dispersos,
No quanto a minha voz se faz voraz,
Ao mesmo tempo lúdica e mordaz,
Sentidos que procuro são diversos.

Agora ensimesmado e circunspecto
Transmudo no silêncio meu aspecto,
Desato velhos nós já esgarçados.

Não posso me entregar à prepotência
Seria tão somente incoerência
Jamais eu suportei cães disfarçados...

23332

Enfrento as mais diversas emoções
E nisso pressentindo este perigo
É necessário crer que exista abrigo
Embora tão distantes ilusões.

Escrevo meus sonetos, negações
Daquilo que não tendo, nem persigo,
Alvejo um só momento, mas desligo
Não quero mais a fúria dos leões.

Poeta sendo assim, um ser excêntrico,
Ególatra, em meu mundo; eu vou concêntrico
Etéreo; teimo insânias, meus delírios.

E sei que prosseguindo em senda tétrica
Meu verso se moldando em pura métrica
Propõe-se aos mais terríveis, vãos martírios...

23331

Enfrentando gravíssimos desvios
Com tanta galhardia, não consigo
Saber de cada curva o seu perigo,
Enquanto enveredando os desafios

Os olhos no horizonte estão vazios,
Prevendo o meu futuro em desabrigo,
O quanto do desejo inda persigo
Decifra os mais diversos, loucos cios.

Avança sobre os sonhos, centopéias
Abelhas entre vespas, nas colméias
Apenas o ferrão, esqueço o mel.

Apego-me ao porvir, mesmo que apático,
E vejo o que não vindo, deixa estático
O que era libertário carrossel...

23330

Caminho tão incertos desta vida
Expressam o vazio que virá,
Aonde eu esperara desde já
A sorte abandonada e envilecida

Mergulho neste mar sem a guarida
Do sonho que decerto domará
Bravia tempestade que virá,
A volta desta Ilíada é servida

Em raros pratos, nobre porcelana,
Porém uma alma torpe, vã, profana
Vergada à força insana das paixões,

Não pode desvendar tais profecias,
E quanto deste amor me propicias
Traduz das esperanças, expressões...

23329

Pusesse uma esperança neste barco
Talvez atracação em cais seguro,
Mas quando vejo o tempo, te asseguro
No medo do futuro, enfim embarco.

O vento que pensara forte; é parco,
O quadro; não percebo sendo escuro,
Além de cada curva um novo muro,
Porém com desenganos torpes, arco.

E quando te encontrara nos presságios,
Nas ondas dos teus mares meus naufrágios
São frágeis os caminhos de quem ama.

E agora nos teus braços, vou letárgico
Jamais queria um fim que fosse trágico,
Mantendo acesa sempre a imensa chama...

23328

A vida em que se vê insegurança
Jamais permitiria ser possível
Que a luz distante ainda fosse crível,
Porém em nossas mãos toda a mudança.

Ao longe, no horizonte o olhar descansa,
O mundo imaginário ou invisível
A sorte se moldando noutro nível
Traindo que restara de esperança.

Nas lúdicas mentiras; ilusões,
Infância se eterniza nos olhares
Dos tolos que vagando nos altares

Expostos aos diversos vendilhões
Expressam um temor desnecessário;
Se é Deus amor, perdão. Não temerário...

23327

Danosa serpe entranha-se entre nós
envergonhando a um Deus bom e perfeito,
nas sedas e cetins, soberbo leito
no olhar tão escabroso, o gozo atroz.

Tu não merecerias outro algoz,
no amor em que deveras foi Teu pleito,
Satã expressa o que pensa direito
mudando ou disfarçando a Tua voz.

Nas grandes confrarias, espetáculos
aonde demoníacos tentáculos
oráculos diversos se espalhando.

E quieto, aprisionado em fria cruz,
exposto nesta feira está Jesus,
cadáver vê os abutres o explorando...

23326

Enfrento esta tormenta a cada dia
Mesquinhos os demônios disfarçados,
Os sonhos entre estrelas preservados,
Uma alma se permite à fantasia.

Mas quando vejo imunda confraria
Dos vermes entre vermes bem cuidados,
Os ímpios e satânicos soldados
Que à margem de Jesus, mal se procria.

A fome insaciável eclesiástica
Deforma de maneira atroz, fantástica
Aquilo que o Cordeiro proclamou.

A fúria desta súcia peçonhenta
Espalha-se voraz e me atormenta
Matando o que este Cristo nos deixou...

23325 com estrambote

A morte se percebe nos olhares
Dos vermes instalados nas Igrejas
Canalhas e pedófilos, altares
Não são conforme a corja que desejas.

Jesus jamais se deu aos lupanares
E neles com soberba tu lampejas
As hóstias profanadas, quando almejas
Riquezas entre vinhos e manjares.

(A pútrida expressão de um falso Deus)

Vendido aos borbotões em cada esquina,
A fonte inesgotável já fascina
A súcia que em verdade é tão imunda.

Não posso me calar frente aos farsantes
São padres e pastores elegantes
Nos quais Satã em fúria se aprofunda...

23324

Perplexo ao ver enganos repetidos
Mesquinharias várias, mundo cão
Não posso me furtar à sedução
De ter na minha voz cantos urdidos

Nas sendas mais atrozes, não ouvidos,
Mas teimam em buscar a solução
Aonde atracaria a embarcação
Se os portos da esperança são olvidos.

Negar a própria sorte é ser caótico
O verso que ora faço em mundo exótico
Aguarda algum momento mais pacífico.

Queria um tempo aonde o ser bucólico
Não fosse tão utópico se estóico
E o católico diverso do ser tífico...

23323

Espalham-se na Terra dores, ódios,
Aonde poderia ter a paz?
Se tudo o que em verdade a vida traz
Somente faz pensar troféus e pódios.

Delírios entre máscaras. Açode-os,
Verás fartas vitórias se isso apraz;
E quanto mais valente e mais audaz
Forjando brilhos vãos, mordazes. Molde-os.

Assim talvez expressem novos cânticos.
Quem sabe noutros mundos mais românticos
E o fardo de viver será mais leve.

Não sendo tão cruel; menos colérico
Não necessita nem sequer homérico
A dor a te atingir jamais se atreve...

23322

Necessidades várias, luz opaca
Acórdãos sonegados, mentirosos
Nos olhos destes seres vaporosos
A sorte se desfaz, nem dor aplaca

E quando se percebe a fria estaca
Nas mãos destes ferinos belicosos
Os risos de sarcasmo prazerosos
A sede sanguinária se destaca.

Pudesse Deus voltar ao velho Gênesis
Talvez modificasse a nossa história
Hemoptises sutis, nas hematêmeses

A saga desta raça vã, sanguínea
E ainda se valendo da vanglória
Gerando e eternizando tal ignomínia...

23321

O ser humano, tétrica figura
Herméticos caminhos do amanhã,
Nos olhos desta fera inútil, vã
Apenas a loucura se afigura.

A mão que sem motivos já tortura
E faz da morte um frio e duro afã
Mantendo a sangue e morte um podre clã
Espalha sobre a Terra esta amargura.

É quando se demonstra demoníaca
Herética e nefasta esta maníaca
Escolta a própria espécie em torpe engano.

Um Deus deveras bom e solidário
Jamais por semelhança, sanguinário
Ao Seu irmão pudesse causar dano...

23320

Acolhem-se mentiras entre tantas
Aonde houvera luz, a escuridão
Na temerária voz do anfitrião
As festas entre versos; desencantas,

Saraus dos idos tempos, velhas mantas
Apenas demonstrando a negação
Do que hoje se moldando em turbilhão
Ainda em vãs promessas agigantas.

Ao ver no meu jardim um rubro antúrio
Percebo o que meu canto sendo espúrio
Não tem mais cabimento, exausto e fútil.

E sei que a poesia também morta
Adentra envergonhada a velha porta
Sabendo-se deveras tão inútil...

23319

Enquanto a fantasia me assegura
Além desta razão que me domina
A noite bem suave mesmo escura,
Encontro na ilusão, devassa mina.

Por onde se prepara esta amargura
Que há poucos, mas constantes, já tortura
Inebriantes sonhos, luz divina
Ao fim de certo tempo, não perdura.

Do caos em que surgi ao caos retorno,
E quanto mais de trevas eu me adorno
Mais facilmente enfrento a dor eterna.

Porém deste vazio em que surgi,
Num último tormento estou aqui,
Nas mãos de um bardo vejo esta lanterna...

23318

A vida que se encurta a cada dia
Negando uma esperança ao andarilho,
Fazendo desta algia um estribilho
Nefastas ilusões; deveras cria.

E quando mais distante a fantasia,
Menor este caminho que ora trilho,
Aos poucos vai puxando o seu gatilho
Até que este pavio extinto, esfria.

No pórtico dos sonhos, sigo cético,
Não vejo outra saída, sendo herético
Quem crê que ainda exista a claridade.

No quanto se perdendo um apoplético
Caminho se moldando na verdade
Jamais perceberá felicidade...

23317

Indignos os delírios que inda trago
Almejando a saída que não vi,
Vivendo a poesia que há em ti
Quem dera pelo menos teu afago.

Alego por defesa, mero lago
Aonde em águas mansas me perdi
Enquanto a correnteza em que vivi
Meu mundo se inundando, enfim me alago.

Heréticas mentiras, nada além,
E quando a realidade me convém
Expondo este vazio que sou eu.

Apreendo com meus olhos raras luzes,
E enquanto tal beleza; reproduzes,
Meu mundo num ocaso se perdeu...

23316

Ao ver o céu sereno em que se expõe
As constelares cores siderais,
O quanto em maravilha se compõe
Belezas que desfilas; magistrais,

E ao mesmo tempo a vida se propõe
A ter como saída um porto, um cais
Minha alma, distraída decompõe
As formas de um delírio, desiguais.

Não quero de mim mesmo tais escusas,
Nefastas e sombrias tolas Musas
Há tanto se afastaram. Já me afeta

O medo de seguir escuras sendas,
Mas logo calmamente tu desvendas
Desejos de um estúpido poeta...

23315

Porquanto fosse; em tese tão pequena
A dor que nos devora e nos enfada,
A sorte há tanto tempo está lançada
Minha alma frente à mesma se apequena.

Pudesse ter somente mais serena
Aquela que me doma e desagrada
A fonte sutilmente demonstrada
Ao mesmo tempo cura e me envenena.

Não posso suportar tamanho escândalo,
Tampouco tenho em mente ser o sândalo
Que ao vândalo se expõe e inda o perfuma.

Escassas as defesas, sigo cúpido,
Jamais permitiria um ato estúpido
Prefiro a ser uma onda, leve espuma...

23314

A sorte em epopéias já lançada
Vencendo os meus temores, sendo prático
E mesmo quando mostro este ar apático
Minha alma em perigeus vã, destroçada...

Preparo por defesas, paliçada
Estando muitas vezes quase espástico
Num cáustico caminho, finjo tático
Mas sei que vivas dores; alcançada

Esgotam-se meus víveres; nefasto
Dos sonhos que inda restam; já me afasto
E deixo como rastro a luz vulcânica

Que um dia após sombrias emoções
Mostrara fragilmente as soluções,
Porém minha alma pasma inda tetânica...

23313

Navego em oceanos mais bravios
Levando dentro da alma esta incerteza
Envolto pelas ondas, a tristeza
Aumenta e multiplica os desafios.

Vencê-los é questão de honra e meus brios
Suportam com orgulho a correnteza
Prevendo no final rara beleza
Após momentos duros, mares frios.

A voz quando se embarga, em dor suprema
A luta sem descanso já se extrema
E teimando incansável sonhador,

Expondo os meus enganos com audácias
As pedras nos caminhos. Expressasse-as,
Moldando um novo tempo a se propor...

23312

Minha alma ocidental e italiana
Latina e eternamente atada ao lírico,
Às vezes com certeza sendo empírico
Desfilo minha origem lusitana

Enquanto a poesia em mim se ufana
O mundo que imagino quase onírico
Num átimo diverso deste etílico
Caminho em que a verdade desengana

Mergulho nas distâncias amazônicas
E quando em fantasias tão hedônicas
Procuro no final ser mais eclético.

Ao fundo este cenário vasto e lúdico
Aplausos; não espero deste público,
Mas mostro o meu caminho atroz, poético...

23311

Assinalando os dias que entre dias
Se tornam mais diversos e felizes
Além dos contumazes já me dizes
Possíveis, os momentos de alegrias.

Mas quando em descaminhos há deslizes
Disperso deste encanto em que vivias
As honras das soberbas poesias
Tornando-se profundas cicatrizes.

Mas hei de amar e nada impedirá
O sol que nascerá mesmo acolá
E sei que a minha vida se completa

Entre armas que inda restam, as palavras
Fecundam o solo árido que lavras
Porquanto simplesmente sou poeta...