domingo, fevereiro 07, 2010

24362

Silente madrugada e não me escutas,
Deixando para trás sonhos e festa,
Do quanto desejei e nada resta,
Apenas as lembranças destas lutas
Das quais e pelas quais, sei que relutas
E toda a mansidão já não se empresta,
O quanto desejei amor não gesta
Apenas as palavras vãs e astutas.
Resistes ao meu canto e sei por que
Quem tanto tempo ainda nada vê
E sabe, mas prefere nem ouvir
Concebe a cada tempo a negação,
E mesmo estas estrelas saberão
Do quão vazio então, ledo porvir...

24361

A lua se esparrama em luzes fartas
E sobre estas veredas, traz no brilho
O quanto enamorado maravilho
Por mais que dos meus sonhos já te apartas
E quando as horas passam e descartas
Ao longe ainda escuto em estribilho
O som da tua voz e cego eu trilho
Jogando neste instante últimas cartas.
E sei que na verdade não terei
Distante do caminho que entranhei
Estás e até por isso nada escutas.
E quando me aproximo e chego a ti
Percebo então, que tudo enfim perdi,
E até para me ouvir, sinto, relutas.
.

24360

Azulejando o céu, o sol se encanta
E bebe a mansidão deste riacho,
O quanto procurara e enfim eu acho
O amor que me entranhando em força tanta
No quase ser feliz, um mero facho
Transtorna o coração e se levanta
Ardência entre fulgores já me espanta
Realça da esperança cada cacho
E toda a maravilha feita em brilhos
Tomando os corações vãos andarilhos
Entornando entre nós a melodia
Que inebriadamente nos domina,
E vendo a placidez da fonte e mina,
O sol enamorado se sacia.

24359

Ao vê-la desfilando em noite clara
A lua se enamora e já se entrega
Aos teus delírios, sinto nesta entrega
O quanto em poesia amor se aclara,
Deitando em fantasia nobre e rara
Assoma-se o calor e em ti navega
O brilho estonteante que me cega
E todo amor a ti, lua declara.
Amante dos luares, deusa nua,
Uma alma tão sutil, leve flutua
E enquanto me atormento, enciumado
Não posso contra a força do luar
E mesmo se quisesse ao te encontrar
Também, quem sabe, enfim, enluarado.

24358

Aonde se plantara esta ilusão
Colheita se abortando em dissabores
Se quando prosseguir por onde fores
Verás as fantasias que estarão
Deitadas sobre a terra, podre grão
Encharcado de sonhos sedutores
E morto, no correr dos meus amores
Eterno inverno aborta este verão.
Auspiciosamente a vida engana
E quando se imagina soberana
Desdita toma todo este caminho,
E sendo um velho e tolo sonhador
Do nada que surgi, ao nada for
Nas tramas do vazio eu já alinho.

24357

A morte do poeta e o nada são
Figuras que se tocam, na verdade
Enquanto a solidão ainda invade
O tempo se tornando negação
Do quanto quis tomar a direção
E tendo a ventania que degrade,
Apenas encontrando frio e grade
Estrelas espalhadas pelo chão

Medonhas esperanças, tosco fim
Dizendo do que outrora fora assim
E ainda permanece inalterado,
Nascido nas divinas alterosas,
Plantando e recolhendo espinho e rosas
O trovador se perde no passado.

24356

O que se fez loucura após, tornou-se
Apenas referência para os dias
Alheios aos vazios que trazias
Talvez inda trouxessem manso e doce

O quanto que se quer e nos remoce
Tramando estas loucuras, fantasias
Dourando no final as utopias
E tanto que te quis finda, acabou-se.

Agora não pergunto mais ao tempo
Se tudo não passou de passatempo
Passado impasses traz a quem delira,

Poeta se fazendo um penitente
A cada vão instante se pressente
A morte do que fora sonho e lira...

24355

Ouvindo tão distante qual alarme
O brado de quem tanto quis um dia,
Agora transformado em agonia,
Sentindo a cada instante maltratar-me,
E tendo da esperança este desarme
Apenas o vazio é que se cria
Lamento torna a noite bem mais fria,
É como se viesse desnudar-me.

E tudo o que pensara se perdendo
A sorte simplesmente assim te vendo
Derrama-se por sobre o casarão,
Tragando alguma luz que inda restara,
É como se o viver parasse para
Poder sentir as neves que virão.

24354

Erguendo sobre o cimo deste monte
A lua se desnuda por completo,
Cenário que percebo o predileto
Tomando num momento este horizonte
E enquanto este luar além desponte
Qual fora uma falena, um mero inseto
Inebriado encontro e me completo
Nos raios, do prazer e morte, fonte.
A angústia de se ver tão solitário
Tramando este tormento amado e vário
Moldando ao mesmo tempo dor e gozo.
Nas sendas mais distantes irradia
A tempestade em forma de alegria
E o vento se lançando caprichoso.

24353

Estrelas a brilhar em noite estranha
Aonde se percebe a dor e o vento
Tramando muito além do sentimento
A cada vez que a vejo mais entranha.
Seria como ter desta montanha
Imensidade plena, e me atormento
Vivendo sem sequer saber se inda freqüento
O pensamento teu, teu rumo e sanha.
Aos poucos se nublando relampeja
A fúria da Natura, ora sobeja
Demonstra-se nos raios e trovões
Volúpia em temporais e fogaréus
A lua se escondendo sobre os véus
Espalha-se acolá, nos meus sertões.

24352

Venturas que teu corpo me convida
Adentro paraísos e percebo
Que tudo de melhora em ti; recebo
Prazer que dá razão à própria vida,
Viaja por estrelas, distraída
E sabes tanto quanto aqui eu bebo
Além da fantasia que concebo
A sorte que eu buscara, merecida.
Assim ao navegarmos noite afora
O quando do desejo já se aflora
E deixemos seguir tal correnteza,
O amor se faz completa refeição
E nele, com certeza sou glutão,
Só falta meu amor, a sobremesa...

24351

A cada tempo vejo a mesma face
Da fera que na fera reproduz
Tomando do futuro qualquer luz
Causando desde sempre o velho impasse.
Por mais que o tempo avance e o mundo passe
As novas gerações comem da cruz
E matam, sem saber, Cristo Jesus
Num gozo insuperável que o desgrace.
Mortalha acompanhando este primata
Endeusa-se e decerto come e mata
O que puder em nome do dinheiro,
Assim este sacrário feito em Terra
A porta do amanhã, deveras cerra
Numa assombrosa imagem: um puteiro.

24350

Escondem-se cadáveres nas ruas
Prostituídos tempos insepultos
E quando mal vislumbro os mesmos vultos
Encontro as tais verdades sempre nuas.
Porém tu nada vês e até flutuas
Pensando que meus versos são insultos
Os povos mais atrozes? Os mais cultos,
Enquanto tu te omites, nisto atuas.
Os dedos apontando esta carcaça
Ao lado do tropel que esnobe passa
Nos caros magazines, capital
Tornando a realidade mais atroz
Se homem tal qual um lobo é dele algoz
O que falar então de um animal?

24349

Vergonha se expressando em guerra e fome
Ainda verdadeira a profecia
Que aos poucos nas esquinas se traria
O fogo sem igual que nos consome.
Portanto se percebe quem não come
Na dura realidade tal orgia
Sarcasmo se transforma em zombaria
E a fera não encontra quem a dome.
Ilíadas diversas do presente,
Assim caminha ao fim, quem se fez nobre,
E pelo desatino, se descobre
O quanto do vazio violente
Os sonhos de justiça e liberdade
Que tomam desde sempre a humanidade.

24348

A massa se desfaz e não consegue
Sentir o quanto vale a força unida,
Assim a sorte sendo decidida
Nas mãos de quem deveras a carregue
Por mais que a realidade não sonegue
A cada novo tempo mais se agrida
A luta que se mostra tão renhida
Por terras tão distantes vã, trafegue.

Em nome de qualquer deus ou mentira
Humanidade ao torpe afã se atira
E come dos destroços, canibal,
Abutre que se mostra eternamente
O mundo sem descanso sempre sente
O gozo deste insano vendaval.

24347

A luz da qual se emana o ser real
É fosca e muitas vezes mais sombria
Porquanto é que a verdade só se guia
No gozo de um momento triunfal,
Assim se fez o mundo em desigual
Caminho baseado na sangria
E quanto mais o escravo se vendia
Vergasta se tornava um ritual,

Até quando não sei, mas se repete
A mesma ladainha do passado,
E o mundo por dinheiro governado
- O sexo, neste caso, uma vedete-
Expondo a podridão de cada ser
Que vive tão somente pro prazer.

24346

O mundo traz o sangue e a liberdade
E neles adivinho morte e glória
Assim ao decorrer da nossa história
Embora uma verdade desagrade,
Herói de vez em quando o mundo invade
E traz dentro de si, farta vanglória
Depois ao conseguir qualquer vitória
Um passo pra colher a eternidade.
E assim em podridão seguimos todos,
Envoltos pelas lamas, torpes lodos,
Na busca de viver tranquilamente,
Mas saiba quantas vezes é enganosa
E mesmo noutras tantas, caprichosa
Verdade de quem vence, sempre mente.

24345

Escondes dentre em ti tais maravilhas
Envolta em pedrarias, rica fonte
Por mais que a fantasia desaponte
Em ti encontro sempre mansas trilhas,
A vida se prepara em armadilhas
E a luz que se irradia no horizonte
Podendo ou não quem sabe ser a ponte
Que ligando dois corpos quando brilhas.

Exímios caminheiros do passado
Aonde se pensara destroçado
Soergue-se este amor e nele vejo
Além de simplesmente céu e lua,
Amante delicada, alma flutua
Tocada pelas mãos deste desejo.

24344

Atalho que procuro ainda leva
O sonho para quem tanto queria
Assim ao ser exposta a fantasia
A sorte se transforma e já te eleva
A vida sendo ou não parca ou longeva
Não pode suportar mesquinharia
E tudo o que deveras te traria
Distante do que agora sinto em treva
Espalha belos cantos pelos ares
E sabe muito bem quando cantares
Que toda a natureza encontra a festa.
E toda esta alegria; compartilhas
Trazendo para mim tais maravilhas
Às quais o amor intenso já se empresta.

24343

Olhando para o espelho tu te vês
E quando te percebes; sendo bela
O amor que pelo belo se revela
E nele encontrarás os teus porquês
E nisto tão somente ainda crês
E o mundo do outro lado se congela,
Imaginando agora a própria tela
Na qual te emolduraste: insensatez?
Só sei que não me queres e também
Não sei se quando alguém ainda vem
Desejas os carinhos que te fazes.
Assim vivendo linda e solitária
Imagem refletida sendo vária
Não sabes quanto vida dita em fases.

24342

Mulher que tanto quero e nada quer
Vestindo esta ilusão, seguindo os passos
Percebo que talvez encontre lassos
Os dias em que a fonte se vier
Trará eternidade e se puder
Rendido ao ocupar tantos espaços
Vagando pelas ruas, poços, paços
Encontro o que buscava: esta mulher.
E sei o quanto é bom saber que existe
Quem mesmo me deixando ausente e triste
Desfila tal beleza que inebria
Julgara se deveras impossível,
E agora que te vejo sendo crível
Além de simplesmente fantasia.

24341

A Diva que com Diva já se entende
Deixando a própria Safo envergonhada
Adentra sem pudores madrugada
E nela noutra senda já se estende,
No quanto do prazer Musa depende
Se expressando na força derramada
Enquanto no prazer, pré-destinada
A chama poderosa ali se acende.
A lua em plena lua se sacia
E deita amor profano em alegria,
Belezas se esparramam pela praia,
E quando o navegante quis sereia
Incêndio em fogaréu o fogo ateia
E levanta suave sua saia...

24340

Não quero qualquer súplica nem prece,
Apenas esta paz que tanto busco,
O dia sendo amargo; tenso e fusco
Traduz além do sonho que oferece
E quando em falsas cores inda tece
O quão pensara ameno sendo brusco
Nas sombras deste vão insano ofusco
E teimo em caminhar quando escurece.
Não posso sonegar que uma lanterna
Traria uma esperança em noite terna,
Mas quando me recordo dos teus ais,
Encontro sufocado o meu passado,
E sigo sem destino já traçado,
Apenas não te quero, nunca mais.

24339

Pesando sobre mim tais cordilheiras
Aonde quis a sorte que se fosse
Quem tanto procurei, e só me trouxe
Mentiras, falsas pedras lisonjeiras.

E tendo nos meus olhos, verdadeiras
Mensagens de outro tempo bem mais doce
O quanto desejei e assim findou-se
Sombrias madrugadas; não me queiras

E sigas teu caminho não me tragas
Palavras que se fazem quais adagas
E marcam com total profundidade,

Por mais que isto talvez seja mesquinho
Prefiro a solidão neste caminho,
Pois nela reconheço a liberdade.

24338

Olhando este passado, sigo assombrado
Vivendo o que talvez não mais pudesse
E tendo em minhas mãos, o medo e a prece,
O gozo em sofrimento, malfadado,

O quanto fui feliz tendo ao meu lado
O amor que tanto quer quanto oferece
E sei que quem deseja enfim padece
O tempo de sonhar; sinto esgotado,

As minhas mãos agora estão vazias
E quanto mais queria, tu fugias
Urdindo no final, este abandono.

E quando da esperança o sonho clono
Vislumbro ao fim de tudo, o que sou eu
Andante cavaleiro se perdeu...

24337

Passando por teus olhos os romeiros
Que seguem passeatas e cortejos
Trazendo em suas mãos, velhos desejos
Momentos tão comuns e corriqueiros

Por onde se encontraram verdadeiros
Os dias que transformam relampejos
Em fonte de prazer, nos azulejos
Os céus se transbordando, mensageiros

Do tempo em que saber tranqüilidade
Será bem mais comum, e tanto agrade
A quem se dando assim; recebe em troca

O amor que na verdade se provoca
Durante a caminhada pela vida,
Nas bênçãos de um amor, se fez urdida...

24336

Suave melodia se espalhando
Desvios entre mares, ruas, rotas
E quando destes sonhos, bela, brotas
As dores escapando em tosco bando
O tempo se divide desde quando
Notando esta alegria, estas compotas
Abertas alagando além das cotas
Mudando a direção e me levando
Além do que pudera imaginar,
Raiando nos teus olhos, o luar
Bebendo desta intensa claridade
Viver a poesia de saber
Que em ti, querida encontro este prazer
Por mais que uma tristeza ao largo, brade.

24335

A bela e nobre dama demonstrando
Sorrisos tão gentis; plastificados,
Olhares de soslaio perfilados,
Mostrando um ar audaz, porém tão brando
E quando desta dama se notando
Momentos com certeza delicados,
Falando de banquete e convidados
E sobre toda a plebe assim reinando
Beleza eternizada; igual, não vi
Nas tramas e magias, bisturi
Jamais conhecerá tal derrocada,
Porém um rosto assim feito escultura
Trazendo a bela imagem que perdura
Não muda nem sequer numa cagada...

24334

Escondem-se nas sombras rapineiros
Que tanto destruindo deixam caos
Aonde se pudesse por as naus
De dias mais felizes, corriqueiros,

Esgueiram-se deveras nos banheiros
Brincando com miúdos, brochas paus
Sonhando com diversos bacalhaus,
Escusos estes pobres punheteiros.

Pudessem ter a sorte de um orgasmo
Que possa com outrem compartilhar
Teriam outra forma de brincar

A dor que se expressando em face alheia
Enquanto à velha corja ora incendeia
Sozinhos, contraídos num espasmo...

24333

Chagásica presença do passado,
Mostrando quanto a dor se faz imensa
A vida não promete e recompensa
Quem teve esta má sorte, desolado,
O pútrido fantoche descarnado
Matéria sendo outrora firme e densa
Imagem macilenta que convença
Do tempo pelo tempo abandonado;
E penso quão difícil caminhar
Esgoto minhas forças, agonizo
E vejo que se fez neve e granizo
O que pensara outrora ser luar
Caíste; embora eu creia que sem dolo
Com todo o seu bundão sobre o meu colo.

24332

Que faço desta sina aventureira
Destroços acumulo e nada mais,
Aonde imaginara magistrais
Momentos, sorte tola e lisonjeira
De todas na verdade és a primeira
Dos sonhos que proponho um manso cais,
Perder-te, meu amor, não quis jamais
Tu foste do viver rara bandeira
Agora te percebo e sinto ausente
O quanto em desamor tudo desmente,
A sorte se mostrando frágil nau,
Enquanto noutra senda desferias
Sorrisos traiçoeiros, mãos vazias
Preferes perereca ao meu bilau.

24331

Enquanto tu mijavas não sabia
Que a vida continua e mesmo assim,
Quiseste dominar e tudo enfim
Transforma-se em diversa alegoria,

Urina sobre as sortes desafia
Matando em aridez o meu jardim,
Se todo o caminhar diz de onde vim
Penico transbordando em noite fria.

Seduzes com teus lábios, porém cagas
Fazendo uma arruaça no banheiro,
E tendo minhas dívidas já pagas

Não posso mais sentir quão é profunda
A dor e quando dela enfim me inteiro
Entalas na privada a imensa bunda.

24330

Enquanto a solidão, amor engana,
Somente uma expressão da nostalgia
Que a cada anoitecer já se recria
E traz a desventura, tão profana.

Queria ter nas mãos a soberana
Vontade de viver, mas fantasia
Matando o que teimara em alegria
Deixando leve rastro em voz mundana.

As dívidas que trago do passado,
O amor há tanto sinto abandonado
Restando este retrato onde recrio

Imensas galerias onde exponho
O quadro deste encanto que, medonho
Transborda num verão, intenso frio...

24329

Ternura que buscara inutilmente
Durante alguns momentos o holofote
E mesmo de um poeta tolo, o mote
Caminho que a verdade já desmente

Por mais que uma ilusão inda freqüente
Não posso ter o doce, pois o pode
Encontro lacerado; mas anote
A vida muda o rumo de repente.

Quem sabe uma bonança ou mesmo o riso
Após a chuva intensa, este granizo
Tomando o meu quintal, matando o que

Durante muitos anos temperava
A sorte que desfeita em fúria e lava
Procura uma alegria, mas cadê?

24328

Hiberna o coração de quem outrora
Durante muito tempo se iludiu
E quando esta verdade enfim surgiu
Prazer já se esquivando não demora,
Apenas solidão inda decora
Depois que esta esperança assim ruiu
E todo grande amor se dividiu
Sobrando este vazio que ora aflora;
Servir sem ter sequer a recompensa
Do amor que pelo menos já convença
Mostrando ao fim do túnel tênue luz,
Se um dia fui dos sonhos serviçal
Amordaçado vejo o meu final
Ao qual inutilmente tanto opus.

24327

Uma alma soberana, apenas isso
O que desejo agora, paz e luz,
E quando à realidade me conduz
O tempo pelo qual jamais me viço
O mundo se mostrando alagadiço
Nos olhos da esperança vejo o pus
E trago em cada verso que compus
O medo de viver. Vão compromisso.
Esqueço dos meus dias mais felizes
Que embora não deixassem cicatrizes
Ao menos trairiam lenitivo
E quando vejo a sombra do que eu era
Realidade atroz, temível fera
Pregos e espinhos; traz, deles me crivo.

24326

Quem toma os meus sentidos e naufraga
Os sonhos de um estúpido poeta,
Enquanto uma esperança esta alma veta
Apenas solidão ainda afaga

Na boca do vazio, imensa draga
Que trama a morte em vida, fria meta
De quem ao se entregar não se completa
Na mão de quem amara vê a adaga.

E sabe muito bem que nada após
Terá e ao mesmo instante seduzido
Tomada pela insânia da libido

Já não consegue mais soltar a voz,
O quanto na verdade sobrevivo,
Um verme quase morto, inexpressivo.

24325

Não mais tentar a sorte que se opõe
Ao rito feito em luz e liberdade,
Aonde se tentou felicidade
A vida rotineira decompõe

Esboço a reação, nada repõe
Os dias que perdi, o medo invade
E traz dentro de si a tempestade
À qual um caminheiro assim se expõe.

Amar sem ser amado? Nunca mais,
Além do que deveras desejais
Eu vos imploro apenas mansidão,

Mas mesmo que relute chego a vós
Rainha, deusa e diva meu algoz
Traduzes as borrascas que virão...

24324

Percebo ser inútil tal tesouro
Que há tanto se escondera em outras terras
Mostrando a realidade aonde encerras
O que pensara ser mais duradouro,

E quando no vazio assim me douro
Deitando uma esperança, logo cerras
As portas que deveras tu emperras
Matando o meu amor no nascedouro.

Perceba quão vazio teu futuro
E nele o tanto quanto inda procuro
Perdura-se no nada que tu és,

Medonha caricata inda se ri
E vejo retratada assim em ti
A marca dolorida das galés.

24323

Destroços de um amor, meras ruínas
O que pensara feito em firmes bases
Do quanto da verdade tu defases
Decreta o variável de vãs sinas.
Porquanto tanto domas e fascinas
E mostras no caminho várias fases
Momentos que julgara mais audazes
Mordazes, em mentiras cristalinas.
O quanto me entreguei e não sabia
Da falsa e tormentosa alegoria
Trazendo ao sonhador, diversas minas
Das quais ao me fartar, tanto inebrio,
E quando me percebo, estou vazio
Da noite constelar, moldas neblinas
E serpe desvairada, insana e má,
Sentir tua presença enquanto já
Em vários rumos desatinas.

24322

Mesmo que a tanta dor eu já me oponha
Por mais que inda relute nada faço
E quanto mais reajo,um ímã e aço
Fulguras carismática e medonha.
E quando no passado vi risonha
A bela que se dando num abraço
Destino traiçoeiro dita o traço
Do canto original, alma envergonha.
Audazes madrugadas, noites quentes,
Agora ao perceber que nada sentes
A alma se transtorna e vai tristonha,
Mas quando em solidão, tola esperança
Quem tanto se feriu, à luz se lança,
E incauto navegante, ainda sonha

24321

Enquanto me conquistas, assassinas
A quem te desejara tanto e traz
Além do que em prazer te satisfaz
E extrai de cada ser, anseios, sinas.
As horas que eu tivera, cristalinas
Bebendo mansamente o riso e a paz
Agora esta presença tão mordaz
Transforma em dores fartas e ladinas.
Mesquinhos os delírios de quem ama
E quando se apagando a pira, a chama
Deixando imagem pálida e tristonha,
E tens no teu olhar tanto poder
Por mais que uma alma lute, eu posso ver
Apenas esta face má, bisonha.

24320

Antigos versos, velhos romanceiros
Falando de um desejo que acalento
O quanto o mundo torna violento
Os dias; medos vivos, corriqueiros,
Os verbos no passado verdadeiros
Mostrando o que deveras inda tento,
E quando me percebo desatento
Das serpes adentrando os seus viveiros.
Argutas ilusões inda carrego,
Mas quando me percebo tolo e cego
Dos pregos e das travas, trevas dito,
E sendo assim o tempo em que vivemos,
Além do que pensara já perdemos,
Perdendo-se no nada, inútil grito.

24319

Sentindo-me perdido em vã procura
Deixando o coração à revelia
E quando esta emoção já fantasia
A noite se aproxima sempre escura,

O tanto que desejo e não se cura
Apenas o vazio se recria
E nele se desnuda esta agonia
Que leva, paulatina a tal loucura.

Não posso me calar perante o nada
Que ronda a minha vida e não me deixa
Soltando aos Céus, a voz que é feita em queixa

Navego em turbilhões procela tanta
E quando ao fim da tarde anunciada
Sentindo que virás minha alma canta..,

24318

Lampejos de uma vida, riso e dor
Descreves com total clarividência
O quanto não se faz em coincidência
O tempo que deveras muda a cor
E sendo uma intempérie, este louvor
Tomando já de assalto a consciência
Desvenda-se com toda paciência
Bendito e assustador, divino amor.
Aos seus caminhos luzes, trevas, medo,
Se o todo que deseja enfim concedo
Aprofundando então este contraste
Da sombra com a fonte que irradia
Nas mãos trazendo o dom da poesia,
No quanto mais se dá, mais se desgaste.

24317

Tu lanças dos teus olhos brilhos fartos
E beijo cada raio desta luz
Que enquanto me tocando reproduz
Momentos divinais, dosséis e quartos,
A vida se refaz em vários partos
E a cada novo tempo nos conduz
Mudando vez em quando o foco, e nus
Percebemos decerto nossos pratos.
Assim não poderia ter deserto
O quanto se pretende ver por perto
Desejos entre formas e maçãs.
Assídua maravilha dor e riso,
O lucro predispõe ao prejuízo
Assim em sol e nuvens,as manhãs.

24316

Dantescas emoções, dores constantes
À sombra dos ciprestes do passado
Adentro o meu caminho, e vejo o prado
Por onde desvendara por instantes

Os dias que pensara radiantes
Morrendo em turbulência, derrotado
O barco na tempesta derrocado,
Sorrisos de ironia, provocantes

Desprendes com total sarcasmo e vês
O todo se mostrando em altivez
Deixando no passado a luz que outrora

Já fora a companheira preferida
E agora a cada dia mais se acida
Enquanto a dor renasce e revigora.

24315

Na vida como um Sátiro somente
Que há tanto se perdeu, tosco bufão
Encontra no final a solidão,
Colhendo o que plantara vil semente

O quanto a fantasia já nos mente
Negando as desventuras que virão
Permitem ao poeta a decisão
Que julgo necessária e tão premente

De ter em suas mãos além do vago
A plena realidade em que se insere,
E quando a vida aos poços degenere

Que tenha pelo menos este afago
Da glória do sorriso frente espelho,
Narcísico caminho, o que aconselho.

24314

Há tanto que não sei o teu carinho
Distante de teus olhos, sigo só
E quando retornar ao velho pó
Decerto saberei bem o caminho,
E quando da saudade me avizinho,
De mim mesmo, querida, sinto dó,
O quanto desejei, a vida, um mó
Destroça e nada deixa, sequer ninho.
Adeus ou até mais, o quanto fomos
Apenas as lembranças destes gomos
Permitem que se veja apodrecida
A fruta pela qual fui tão feliz
E agora a realidade já desdiz
Resumindo afinal a própria vida.

24313

A vida num enorme picadeiro
Transcorre cada dia sem que pense
Espetacular jogo circense
Que muda a cada instante, o derradeiro?

Além do trivial e corriqueiro
Não tendo quem deveras convence
Do quanto poderia se o non sense
Trouxesse um ar ao menos verdadeiro.

Bailando sobre os astros, trapezista
Funâmbulo traduz a própria vida
Jogada pelos cantos e esquecida

Equilibrando e tendo quem assista
A sorte jamais muda rumo e idéia
Agradecendo em morte à vã platéia.

24312

Um coração audaz, ora senil
Mesquinharias dita enquanto vê
O mundo que procura, mas cadê?
Se tudo o que sonhara já partiu,

Deixando tão somente a marca vil
Do quase ser feliz e sem por que
Deveras do passado em nada crê
Semente em solo seco, não se abriu.

Arcando com meus erros, nada mais
Do que pagar as contas que inda devo,
Não quero e não seria enfim longevo

Ao menos tive dias magistrais,
E agora ao ver que vida já se esgota
Decerto eu agradeço a minha cota...

24311

Floresce a mocidade em teu sorriso,
Mas sei que depois disso uma aridez
Tomando este caminho em que se fez
Um dia mais alegre e mais conciso.
Se na verdade tenho o preciso
Não posso me perder, insensatez,
Mas sei que a qualquer dia é minha vez
De ver se existe ou não tal Paraíso.
Amortalhando esta alma que se engelha
A porta se fechando à pele velha
Uma alma se perdendo; atrocidade
Mergulho neste espelho e vejo bem
Que a morte inebriante cedo vem
Aonde florescera a mocidade.

24310

A morte se propondo num noivado
Deitando seus prazeres, riso e pranto,
E quanto mais me entrego ao seu encanto
O rio em seu trajeto, desviado,
Permite que se veja retratado
O manso desafio onde levanto
O que pensara outrora noutro tanto
Deixado como um barco, abandonado.
Existe ou não suporte após tal ida?
A que se resumira a minha vida
Se tudo mais se foi, somente aqui
Restando este cadáver quase inerte,
Se o todo num vazio se converte
Uma esperança aquém, eu já perdi.

24309

Aos poucos me entregando à podridão
Da qual não poderia vir a paz
Apenas esperança como antraz
Destrói o que restara da ilusão.
E sendo sempre assim somente o não
O quanto se buscara o nada traz
E vejo este retrato ora mordaz
E nele a minha vida ao rés do chão;

Ensimesmado tanto decifrar
Sinais que percebera no passado
Pensando ser imagem mais vulgar
E agora percebendo decomposto
O tanto que julgara encarcerado
Pagando a cada dia um alto imposto.

24308

Envolto na neblina à madrugada
Encontro entre estas sombras o passado
Deitando mansamente do meu lado,
Imagem pelo tempo degradada
E nela vejo uma alma descarnada
E o gozo de um prazer abandonado
Aonde quis o amor bem albergado
A rota veste assim esfarrapada.
E quando poderia ter um gozo
Cadáver do que fui tão andrajoso
Exposto em esquelética visão
Demonstrando afinal a verdadeira
Face de uma vida corriqueira
Que aos poucos se entregando à podridão.

24307

Estéreis os caminhos que buscais
A voz que em vós se torna mais potente
Por mais que uma ilusão ainda alente
Encontro por resposta o nunca mais.
Volvendo ao quanto fui e sei jamais
Seria enquanto a sorte prepotente
Mudando a minha estrada de repente
Impede o vislumbrar; longínquo cais.

O sonho que pensara; alvenaria,
Mas quando sem reboco ele se cria
Uma estrutura frágil se percebe
Ao vento do viver, fúria constante
E tudo desabando neste instante
Deixando a solidão tomando a sebe...

24306

Numa expressão divina em paz e glória,
Pudesse ter além deste vazio
A noite se aproxima merencória
E toda esta esperança desafio
Cortante qual navalha, gume e fio
O medo; ainda vivo na memória
Minha alma jogo aos pés, então; devore-a
Matando o que pudera haver de estio.
Os sonhos mergulhando dos umbrais,
Percebo mais distante todo cais
Sentindo que virá ao fim naufrágio,
E a vida que julgara bem mais mansa
Enquanto houvesse luz ou esperança
Cobrando com terrível, imenso ágio.

24305

Imaginar um tempo aonde a vida
Seja mais suave e nos permita
Acreditar na sorte que em desdita
Escreve-se na luta ora perdida,
E quando a realidade nos acida,
E nossa iniqüidade assim limita
A caminhada tenra; uma alma fita
Horizonte sanguíneo e enfim duvida

Do quão se poderia ser melhor,
Um mundo onde esperança sendo mor
Traria ao menos brilho neste céu
Grisalhos os olhares que já lanço
Tempesta onde pensara algum remanso
A consciência humana segue ao léu.

24304

Esperas e tocaias da existência
E nada valerá nem mesmo o fim,
E quando não houver mais nem jardim
Terei as complacências da clemência?
Por tanto que me fiz em prepotência
Ao esgotar o todo, nada enfim.
Voltando pro vazio de onde vim,
Restando do que fui fluorescência.
Um fatual momento em gases feito,
Deveras a ascensão que ainda aceito
A de um já decomposto corpo e nada
Além do vão instante em desengano
Aonde a vida fora desfrutada
O fruto que inda resta, este metano...

24303

Às quantas existindo em bioquímica
Verdades em carbono e nitrogênio
A vida na esperança, um vão convênio
A sorte não se trama assim, alquímica.
Apenas continuo em torpe mímica
Até chegar meu fim, doença, arsênio?
A poesia sendo um oxigênio
Traduz a realidade quase símica.
E neste traduzir já se percebe
A pedregosa e turva, amarga sebe
Vencida muitas vezes com vanglória,
Adentrando o vazio, tua herança
A vida neste espaço que se lança
Deturpa ou mesmo nega a tua história.

24302

Espalho meus gametas e refaço
A velha ladainha, vida e morte
Tendo a teosofia que conforte,
Estendo à existência então meu braço
Enquanto a frialdade morta do aço
Deveras se demonstra noutra sorte,
A eternidade dele é o meu norte,
Da minha história aqui, só deixo um traço
Soubesse quão diversa a natureza
Dos seres e matérias, por defesa
Talvez inda pudesse crer tão meus
Aquilo que em verdade não pertence
Restando a tal fantoche muriaense
A inevitável crença que há um Deus.